Quase 100 anos depois, moradores incluem nome de Maria Felipa entre as heroínas


Não faz muito tempo que moradores de Itaparica recorreram a uma atitude, no mínimo, audaciosa: incluir o nome de Maria Felipa de Oliveira, considerada por muitos deles como a principal heroína da batalha local, numa lápide que já levava o nome de outros heróis. A homenagem foi instalada na parede da Capela da Piedade, em 1923.

Por Clarissa Pacheco, no Correio 24h - “Nós tivemos a ousadia, tomamos a liberdade e contratamos um calígrafo que fez uma letra rigorosamente igual à que está lá e acrescentou o nome de Maria Felipa entre os nossos heróis”, confessa, aos risos, o pesquisador Augusto Albuquerque, morador de Itaparica.


É que a mulher negra, corpulenta e estabanada - descrição do historiador Ubaldo Osório - passou muito tempo esquecida, mas é especial para os itaparicanos. Não se sabe quando ela nasceu, mas seria natural do povoado de Ponta das Baleias e morrido em 1873.

Lápide com nome dos herois na capela da piedade em 1923, mas Maria Felipa só
entrou recentemente. Foto: Mauro Akin Nassor/ Correio.

A professora Eny Kleyde Vasconcelos localizou a figura histórica de Maria Felipa de Oliveira. O que não está documentado são os feitos atribuídos a ela”, afirma o historiador Milton Moura, que defende que a memória seja considerada.
           
São justamente os feitos que fazem de Maria Felipa uma das heroínas do povo. Ela teria comandado um grupo de cerca de 40 mulheres para, primeiro, seduzir os portugueses e, depois, atear fogo às embarcações deles. A ela também é atribuída uma famosa surra de cansanção nos soldados portugueses.

O feito teria ocorrido na Praia do Convento, cuja localização exata não é conhecida, mas acredita-se que seja próximo ao local onde funcionou, até a década de 1940, a casa de veraneio do Instituto Feminino da Bahia. A suposição é de Augusto Albuquerque, levando-se em conta que, de frente para a praia, fica uma propriedade que havia sido adquirida junto a padres jesuítas.

"Há 14 anos, ainda existiam seis palmeiras imperiais aqui na frente, hoje restaram duas. Eu acredito que a praia do Convento seja aqui porque palmeiras imperiais não eram colocadas em centros de poder, propriedades religiosas, e aqui não havia nenhum outro convento. Creio que essa seja a referência", diz, apontando para um verdadeiro paraíso na ilha.
Também não há certeza sobre os traços físicos de Maria Felipa. A imagem pintada em paredes e estampada em livros é da perita técnica Filomena Modesto Orge, do Instituto de Criminalística Afrânio Peixoto, ligado ao Departamento de Polícia Técnica da Bahia (DPT).

O retrato de Maria Felipa de Oliveira foi construído com subsídios históricos, literários e da tradição oral, para dar a esta personagem um rosto, e que assim possa ser identificada e lembrada como a Heroína Negra da Independência da Bahia”, escreveu a perita, em artigo de 2005. Ela aponta, por exemplo, que uma mulher capaz de dar uma surra em um homem deveria ser forte, alta.

Há pelo menos duas associações dedicadas à memória dela: uma em Salvador e outra em Itaparica.


Falando sobre Negros e Indígenas, Arraiá do Ribuliço encanta público no XVII Festival Junino de Altaneira



Quem foi ao último dia do XVII Festival Junino de Altaneira não se arrependeu. Além de testemunharem apresentações de qualidade de vários municípios, assim como se verificou na abertura da etapa regional, jurados (as) e o público se encantaram com o Arraiá do Ribuliço, representante municipal no evento, que dançou e cantou as contribuições de três povos na formação do país, diz matéria veiculada no Site do Município.

Antes de entrarem em cena, o prefeito Dariomar Soares lembrou a curta história da agremiação que reúne estudantes de ensino fundamental, médio e universitários (as) que aceitaram o desafio de inserir Altaneira novamente no cenário da cultura junina. Ele destacou a importância que teve Antonio Rodrigues dos Santos, conhecido popularmente por “Ribuliço” e que leve o nome do arraiá. Segundo o gestor, Ribuliço exerceu com grande zelo a função de motorista e por mais de 10 anos conduziu muitos pacientes para cidades vizinhas como Crato, Juazeiro e Barbalha em uma camionete Ford F-1000, mas que o povo conhecia o veículo como “burra preta” e “foi nela que aprendi a dirigir", disse. “Pedi a eles que só trouxessem resultados no ano que vem, mas não me obedeceram”, completou o prefeito fazendo referência aos dois terceiros lugares conquistados pela agremiação ribuliciana.

Antônio Cláudio Monteiro Chuppil, marcador e coreógrafo, ressaltou o empenho e dedicação de integrantes, o empenho da secretaria e o apoio do governo municipal como fundamentais para a formação do grupo.

Mesmo sem competir, o Arraiá do Ribuliço encantou e arrancou aplausos ao levar para o ginásio símbolos que marcam o (a) nordestino (a) e que foram frutos das contribuições de três grupos – os (as) negros (as) africanos (as), indígenas e os ibéricos (portugueses e holandeses), em referência ao período em que o Brasil esteve sob o domínio português e expondo os dois primeiros grupos aos mais variados castigos físicos e psicológicos- tendo a escravização como o pior deles – mas que mesmo assim deixaram esse grande legado. A proposta foi desenvolvida a partir do tema “Ibérico, Negro e Tapuia, Azul e Encarnado a História do Sertão Encantado”.

Alguns membros da família do homenageado se fizeram presentes durante a participação especial da agremiação.

Arraiá do Ribuliço fala das contribuições de Negros (as) e Indígenas na formação do país no XVII Festival Junino de Altaneira. Foto: João Alves. 

Com Beatificação do Padre Cícero, Nação Nordestina é campeã do XVII Festival Junino de Altaneira



O Governo Municipal de Altaneira, por intermédio da Secretaria de Cultura, Esporte e Turismo, realizou entre os dias 29 de junho e 1º de julho, no Ginásio Poliesportivo Antonio Robério Carneiro, o XVII Festival Junino que teve como tema “Na Roça, na Fazenda e no Sertão – Dançando e Festejando o São João”.

Segundo informações do site do município, o primeiro dia foi marcado por apresentações de sete agremiações juninas das escolas do município, duas da educação infantil, quatro do ensino fundamental e uma do ensino médio. O festival foi composto nos dois dias subsequentes pela etapa regional. Dezoito arraiás de treze municípios se inscreveram. Estava previsto a apresentação da Esperança Nordestina, de Araripe, Fogo na Roça, de Várzea Alegre, Nação Nordestina e Junina Paixão do Cariri, ambas de Juazeiro do Norte, Xamego Bom (Antonina do Norte), Sabor Nordestino (Tarrafas), Tradição Junina (Crato), Arriba Saia e Arraiá da Nascença, de Várzea Alegre e Brejo Santo, respectivamente.

Assim como no primeiro dia, três agremiações - Junina Flor de Xita, Alto Junino e Junina pé no Chão, de Acopiara, Saboeiro e Barbalha, respectivamente – não compareceram no ginásio no último dia de festival. Porém, os grupos Tradição Junina (Milagres), Quadrilha Gonzagão (Juazeiro do Norte), Asa Branca (Campo Sales), Xamego Nordestino (Juazeiro do Norte) e Junino Sol Nascente (Iguatu) além da participação do Arraiá do Ribuliço – grupo local – tiveram 50 (cinquenta) minutos para se expor.

Ainda em conformidade com o referido site, o resultado só foi tornado público por volta das 3h00 da manhã do dia 02 durante a apresentação da Banda Forró do GG. Participaram da divulgação, os Secretários de Governo, Deza Soares e de Cultura, Antonio de Kaci. Ambos agradeceram a todos (as), ao passo que frisaram que o festival foi um dos maiores que o município já realizou. Nação Nordestina e Asa Branca dividiram a atenção do público a cada nota dos quesitos anunciados que levou a primeira agremiação ao título.

A Nação Nordestina trouxe para o público uma luta travada entre setores conservadores e progressistas da igreja católica e a luta de romeiros quanto a figura do Padre Cícero Romão Batista. A cada passo de integrantes do grupo e do marcador, ficava evidente a força e a fé de popular no “padim ciço” na “Beatificação de um Homem Pela Fé do Povo” que não só agradou ao público, mas também aos (as) jurados (as) que lhe deram o título de campeã do XVII Festival Junino, conforme abaixo especificado:

Resultado Oficial do XVII Festival Junino de Altaneira:

A Nação Nordestina levou a melhor nos quesitos "Marcador (a)" e  Rainha", com 119, 6 e 90 pontos, respectivamente.  A Asa Branca teve melhor desempenho em "Casamento", "Repertório", "Casal de Noivos", 29,9, 89,9 e 120 pontos, respectivamente.

1º - Lugar - Nação Nordestina, de Juazeiro do Norte, (209, 1) pontos;

2º - Lugar - Asa Branca, de Campos Sales, (209,0) pontos;

3º - Lugar - Arraiá da Nascença, de Brejo Santos, (206,0) pontos;

O Arraiá do Ribuliço (participação especial) recebeu dos (as) jurados (as) 206,7 pontos;

4º - Lugar - Xamego Nordestino, de Juazeiro do Norte, 204,0 pontos;

5º - Lugar - Tradição Junino, de Milagres, 202,6 pontos;

6º - Lugar - Junina Paixão do Cariri,  de Juazeiro do Norte, 201,6 pontos;

7º Lugar - Sabor Nordestino, de Tarrafas, 200, 2 pontos;

8º - Lugar - Esperança Nordestina, Araripe, 199,7 pontos;

10º - Lugar - Xamego Bom, de Antonina do Norte, 196,0 pontos;

11º - Lugar - Quadrilha Gonzagão, de Juazeiro do Norte, 192,0 pontos;

12º - Lugar - Tradição Junina, de Crato, 188, 0 pontos.


Nação Nordestina, de Juazeiro do Norte, é campeã do XVII Festival Junino de Altaneira. Foto: João Alves.

Emir Sader: Contra a democracia, a exclusão social que o capital exige



O neoliberalismo nasceu para buscar superar a incompatibilidade entre a soberania popular da democracia e os interesses do grande capital. Para destravar os obstáculos à livre circulação do capital, entre os quais os governos que se resistem à sua centralidade .

Da RBA - O neoliberalismo exige governos fracos, sem legitimidade, sem poder de ação e sem disposição de se opor aos ditames do grande capital. Vem daí a franca crise em que se encontra a democracia tradicional, a democracia liberal, conforme o neoliberalismo foi se impondo como modelo global.

Nos EUA, na Europa, na América Latina, em países como a África do Sul e Índia, há uma perda clara de legitimidade desses regimes políticos, afetados pelo poder do capital financeiro de definir as regras da vida econômica, pela fraqueza de governos incapazes de avançar na solução dos problemas criados pelos mecanismos de mercado, que cada vez mais controlam o poder político.

Lutar contra o neoliberalismo é, ao mesmo tempo, lutar pela democracia. E vice-versa.

No Brasil, avançam juntos o golpe contra a democracia e a restauração do modelo neoliberal. A ruptura de uma se deu para reinstaurar o outro. A sobrevivência do governo golpista se dá como forma de preservação de seu verdadeiro núcleo fundamental – a equipe econômica, dirigida sem intermediações por banqueiros.

A associação indissolúvel do golpe com o neoliberalismo se faz pela ruptura dos direitos democráticos do povo de escolher seus governantes. Da expropriação dos direitos sociais da massa da população.

A recessão e o desemprego intensificados pela política econômica do governo Temer representam ataque aos direitos da população e contra a democracia, que deveria proteger os cidadãos das ações do chamado mercado.

O neoliberalismo começou a ser implementado na América Latina mediante uma ditadura – a de Pinochet, no Chile. Mas seu auge foi quando conseguiu se realizar mediante governos eleitos, como os de Menem, FHC, Fujimori, Carlos Andres Peres, Carlos Salinas de Gortari, entre outros.

Porém esses governos, depois de conseguirem, vários deles, se reeleger, fracassaram, sobretudo por conta do caráter antipopular de suas políticas neoliberais. A partir do momento em que as questões sociais passaram a ser consideradas predominantes pela população, em vários países os candidatos neoliberais foram sendo sucessivamente derrotados.

O único país em que o modelo neoliberal foi retomado mediante eleições – após ter passado por governos populares – foi a Argentina, mas isso se deu também porque o candidato que personifica essa restauração – Mauricio Macri – negou enfaticamente nos debates eleitorais que faria tudo o que está fazendo, caso contrário não teria conseguido triunfar.

No Brasil, foi mediante um golpe que o modelo neoliberal está sendo retomado. Derrotado quatro vezes sucessivamente, ficou claro que a maioria da população prefere um modelo de desenvolvimento econômico com distribuição de renda.

O golpe deixou claro que seu objetivo estratégico é a retomada do modelo neoliberal, a promoção da hegemonia inquestionada do capital financeiro, a intensificação da exploração dos trabalhadores, o corte drástico das políticas sociais e a privatização do patrimônio público. Um programa com essas características só se faz pela ruptura da democracia.

Daí o pânico pela convocação de novas eleições que têm as elites, cujos interesses estão representados pelo governo golpista. Seja por eleições diretas já, seja mesmo em 2018 – para o quê necessitam castrar o processo eleitoral, com eliminação da candidatura de Lula, e com modalidades eleitorais que impeçam a expressão democrática da vontade da maioria da população.

Por isso a luta pela democracia no Brasil hoje está indissoluvelmente ligada à luta pela superação do modelo neoliberal, que retomou intensamente a dinâmica de concentração de renda, de exclusão social, de reprodução da pobreza e da miséria.


O resgate da democracia é o resgate do direito do povo de eleger livremente seus governantes, ao mesmo tempo em que é o resgate dos direitos formais dos trabalhadores, os direitos sociais da massa da população, a proteção e o fortalecimento dos bancos públicos, como indutores do crescimento econômico com inclusão social, e do patrimônio público do país.

Corte drástico das políticas sociais, concentração de renda e exclusão social. Um programa com essas características só se faz pela ruptura da democracia. Foto: CC Wikimedia/ O Financista.


As ciências humanas e a guerra cultural no Brasil



Uma das facetas da “guerra cultural” entre a esquerda e a direita que o Brasil vive atualmente é a crítica generalizada às ciências humanas. Dois conjuntos de críticas podem ser lidas e ouvidas nos mais diversos meios de comunicação e espaços sociais: a opinião pública de extrema direita, a direitona tosca, acha que as ciências humanas “são um antro de esquerdistas”, ou “esquerdopatas”, como preferem dizer. A direita liberal, que se quer mais civilizada, afirma que as ciências humanas são simplesmente inúteis e gastam dinheiro precioso das agências de pesquisa e horas preciosas dos alunos que deixam de aprender o que interessa nas escolas do ensino básico e superior.

Por Marcos Napolitano, no Brasileiros - Vamos lá. Em primeiro lugar, sinto dizer que as ciências humanas há muito não são um “antro de esquerdistas ou revolucionários de plantão”, se é que um dia o foram. Hoje, o marxismo é uma entre tantas possibilidades teórico-metodológicas aceitas, como sempre foi, aliás. Foi-se o tempo das “patrulhas metodológicas” tão presentes nos anos 1970 e 1980. Obviamente, essas ponderações pouco valem para a direitona, para a qual todo mundo que defenda direitos humanos, estado laico e não fica histérico diante de um discurso feminista, é um radical de esquerda. É verdade que vaia de bêbado não vale. Entretanto, causa muito ruído.

Quanto à inutilidade, devo dizer que ela não é uma exclusividade das ciências humanas. Basta uma olhada no hilariante site do Prêmio Ignobel que premia pesquisas reais e, à primeira vista, completamente inúteis, em várias áreas nobres das hard sciences. Mas como estou no ramo universitário há algum tempo, sempre acho que pode haver alguma utilidade futura inaudita em pesquisar como os cães e gatos se posicionam para urinar em relação às linhas magnéticas da Terra, qual a personalidade das rochas a partir de uma perspectiva de vendas ou como o Boletim da Sociedade Kardecista de Ximbica da Serra representou a Revolução Russa de 1917 (só essa última eu inventei, desculpem-me os kardecistas e ximbiquenses…). O lema do prêmio, inclusive, é premiar “ pesquisas improváveis que fazem as pessoas rir, para depois pensar”.  Apesar do risco da endogenia, é preciso confiar nos pares para avaliar a relevância de um tema de pesquisa, cabendo à universidade se comunicar melhor com a sociedade leiga para convencê-la da importância.

Também não se pode acusar as humanidades de ser a vilã dos gastos com a ciência e com a pós-graduação no Brasil. Os dados de 2016 indicam que cerca de 10% a 12% das verbas do CNPq e FAPESP são direcionadas para esta área. Pelo preço de quatro microscópios eletrônicos de varredura é possível sustentar um programa de pós-graduação em história ou ciências sociais, gigantes como os da USP, durante um ano.

O fato é que não é raro, no próprio meio acadêmico, até em universidades públicas, ouvirmos à boca pequena (e à boca grande) que as ciências humanas não fazem pesquisa, não geram patentes, e tem “apenas” vocação para formar professores e fazer atividades de extensão, algo visto preconceituosamente como a “sopa para os pobres” do entorno.

Há também o outro lado da moeda. Muitos colegas respeitáveis acham que só as Humanidades tem capacidade de pensar a sociedade, o que é um grande exagero. Pessoalmente, eu não quero que historiadores e poetas pensem pelos engenheiros, mas eu gostaria de engenheiros que também pensassem como historiadores e poetas. O país, a engenharia e a história só ganhariam com isso.

Se quisermos um país com capacidade de formulação de políticas públicas eficazes, consciente dos seus interesses econômicos e posição geopolítica em um mundo complexo, de um aluno e um trabalhador que possam ser algo mais do que repetidores de tarefas mecânicas, precisamos das ciências humanas na pesquisa e na educação. Independente do debate esquerda / direita, que se bem colocado pode até ser muito produtivo (o que não é o caso do Brasil atual, infelizmente), as ciências humanas têm um papel a cumprir na sociedade.

Como desenvolver políticas de saúde, políticas de inclusão social, políticas de segurança, políticas culturais, políticas de transporte e energia sem a ajuda da sociologia e da antropologia? Como fundamentar o debate sobre reformas políticas, constituição e cidadania, sem a ciência política? Como conhecer o legado ou desmontar as armadilhas institucionais colocadas pelo passado sem a história? Como desenvolver políticas agrícolas, agrárias, urbanas, de moradia, de preservação ambiental, sem a geografia?

Sim, é possível que um governo desenvolva todas estas políticas públicas sem as pesquisas inúteis em ciências humanas. Como? Deixando que as corporações e a burocracia produzam estudos e formulações ou importando pesquisas de consultorias milionárias e de agências internacionais nem sempre independentes dos interesses econômicos e financeiros que regem o mundo. Não que a universidade esteja isenta deste risco, mas um ambiente de pesquisa em uma universidade pública, ou mesmo privada mas pautada por uma gestão comunitária, financiada a partir de critérios claros de qualidade e relevância, examinado por pares e controlado pela sociedade civil, ainda é o melhor caminho para se produzir ciência e conhecimento. Aliás, isto já vem sendo feito pelas universidades brasileiras. Se os políticos e gestores públicos não utilizam este conhecimento “público e gratuito” como deveriam, isso é outra história. Diz mais sobre nossos governantes, burocratas e parlamentares do que sobre a nossa universidade.

Para os que acham que a qualidade e relevância do conhecimento acadêmico se mede pela inserção no mercado, deveriam levar em conta que as ciências humanas também tem um potencial muito grande neste campo. Além de consolidar uma comunidade de leitores, consumidores de mídias e impressos, o vigor das humanidades tem impacto direto na indústria do turismo, no jornalismo, na indústria editorial, e indireto na chamada “economia criativa” (publicidade, games, design, moda). Portanto, não se trata de responder a estas demandas matando a pesquisa e transformando os cursos de ciência humanas em escolões genéricos. É verdade que os currículos dos cursos devem ser atualizados, como também é verdade que as pesquisas puras, “inúteis” para alguns, deveriam ser melhor articuladas à pesquisas aplicadas e ao desenvolvimento de C&T. Da minha parte, como profissional pesquisador e docente da área de Humanidades há mais de 30 anos, aceito esta cobrança.

Estas mudanças implicariam em construir um novo patamar da relação entre pesquisa, ensino e extensão, e não em destruir o próprio conceito de pesquisa em humanidades a partir da separação dos professores universitários da área entre um grupo seleto de pesquisadores full time e uma massa de professores horistas em salas lotadas de graduação. A área de humanidades, nas universidades públicas brasileiras, consolidou sua identidade e vocação: pesquisa e ensino articulados e inseparáveis. E apesar das dificuldades, é um modelo bem-sucedido, ainda que possa ser aprimorado e revisado. Por exemplo, na última lista do badalado QS World University Ranking sete cursos de graduação da Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas da USP estão entre os 100 ou 150 melhores do mundo, o que não é pouco para uma Faculdade com 10 mil alunos de graduação, 3 mil de pós-graduação e para um país sem tradição universitária. E todos estes cursos de graduação, diga-se, tem programas de pós-graduação a eles conectados que são considerados “de excelência” pela CAPES e reconhecidos internacionalmente.

Mas sabemos a guerra cultural contra as humanas está longe de ser desinteressada, meramente preocupada com a “doutrinação” dos pobres alunos quase adolescentes por professores mal-intencionados ou com a gastança do precioso dinheiro público que poderia ir para o superávit primário e fazer os investidores mais felizes. Trata-se de uma concepção de país, de ciência e de educação que está em jogo, e que veio à tona de maneira avassaladora nesta aliança tática entre a direitona autoritária e a direitinha liberal que tomou conta do Brasil contemporâneo. 

No ensino, a guerra às humanidades tem produzido outras críticas superficiais. Por exemplo, a de que o currículo do ensino médio está cheio de “penduricalhos” desinteressantes para os alunos, desviando do que realmente interessa aprender no mundo de hoje: português, matemática e inglês. A integração curricular das disciplinas, a interdisciplinaridade, a flexibilização e o protagonismo dos alunos, sobretudo no ensino médio, são propostas importantes, mas não podem ser implementados a partir da virtual exclusão das humanidades no ensino médio.

Mas este assunto fica para um próximo texto.

Manifestação a favor do impeachment  de Dilma na Avenida Paulista. Foto: Rovena Rosa/ Agência Brasil.

Historiador João José Reis vence o Prêmio Machado de Assis


O historiador baiano João José Reis, considerado referência mundial para o estudo da História e da escravidão no século 19 no Brasil, é o vencedor do Prêmio Machado de Assis, concedido anualmente pela Academia Brasileira de Letras a um intelectual pelo conjunto da obra. Reis ganhou R$ 100 mil.

Do Correio - A entrega será feita no Salão Nobre do Petit Trianon, no dia 20 de julho, durante as comemorações pelos 12 anos da fundação da ABL.

Formado em História pela Universidade Católica de Salvador, João José Reis tem mestrado e doutorado pela Universidade de Minnesota e diversos pós-doutorados, que incluem a Universidade de Londres, o Center for Advanced Studies in the Behavioral Sciences, da Universidade de Stanford, e o National Humanities Center. Também foi professor visitante das seguintes universidades: Universidade de Michigan, Universidade Brandeis, Universidade de Princeton, Universidade do Texas e Universidade de Harvard.

Historiador João José Reis. Foto: Reprodução.

Arraiá do 18 de Dezembro homenageia João Zuba, mestre da cultura popular, no XVII Festival Junino de Altaneira



Teve início na noite da última quinta-feira, 29, e segue até hoje , 1º de julho, no Ginásio Poliesportivo Antonio Robério Carneiro, o XVII Festival Junino com o tema “Na roça, na Fazenda e no Sertão – Dançando e Festejando o Sertão”.

Com um bom público e sobre, em alguns momentos, pancadas de chuvas, sete arraiás das escolas do município fizeram a alegria cantando, dançando e contando a história do povo nordestino.

Antes das apresentações, segundo informações do site oficial do Governo Municipal de Altaneira, discursaram Antonio de Kaci, secretário de cultura, Leocádia Rodrigues, secretária de educação e o prefeito Dariomar Soares. O primeiro destacou a potencialidade do município nesse cenário. “Não é novidade que Altaneira sempre se destaca como um dos maiores festivais da região do cariri”. Antonio frisou ainda que este evento conta com o total apoio do governo municipal e que isso “demonstra o compromisso e a dedicação ao povo altaneirense” e teceu agradecimentos as parcerias, principalmente das secretarias de educação, saúde, assistência social, infraestrutura e do poder legislativo municipal. Leocádia, por sua vez, cumprimentou aos pais, alunos (as), professores (as) e a mesa, ao passo que agradeceu a todos (as) pelo empenho na realização do festival. O prefeito elogiou o trabalho da secretaria de cultura. “ A cada ano, a gente não sabe mensurar, mas a cada ano, a secretaria se supera”. Ele agradeceu a presença de todos no festival, ao passo que declarou aberto o evento.

A primeira a usar o cenário do ginásio foi a Creche Ciranda do Saber. Com o tema “Sol e Chuva no Sertão”, a criançada demonstrou desenvoltura ao frisarem problemas como a fome, sede e as poucas chuvas. A Escola de Ensino Infantil Fausta Venâncio, outrora denominada de Disneylândia, veio logo na sequência contando a história de João Batista, personagem bíblico. Na mesma desenvoltura, a Escola Joaquim Soares da Silva trouxe para o ginásio a temática “Festejando e Dançando no Roça do Joaquim” trabalhando os vários fazeres de agricultores e agricultoras. As agremiações do Joaquim Rufino e do 18 de Dezembro não deixaram por menos e arrancaram aplausos. A Joaquim trabalhou “Do Colorido do Sertão ao Brilhos do São João”, enfocando as principais problemáticas do país no contexto político, mas sem esquecer a bravura do povo nordestina para vencer. Já a Escola 18 de Dezembro com o arraia “Quadrilha 18 Tao – Chuvas no Sertão” que, além de falar de um dos principais mecanismos de desenvolvimento econômico, a chuva, homenageou o símbolo da cultura popular de Altaneira, falecido na noite do dia 24 de fevereiro do corrente ano.


Responsável por resgatar e manter viva a Banda Cabaçal ao lado do amigo Luis, João Zuba deixou um legado invejável na cultura local ao abrir espaços para aprendizes do ramo da música, sanfoneiros, violeiros e cantores semiprofissionais – como o cantor Sebastião Amorim (conhecido popularmente por Charles Tocador). Este ao lado dos alunos e integrantes do arraia da escola relembraram na quadra uma das principais marcas do homenageado, o pífano e a zabumba,

A noite de apresentações juninas foi encerrada com a Escola de Ensino Médio Santa Tereza que encenou uma das obras de Machado de Assis - o Dom Casmurro - enfocando a personagem Capitu com o tema “olhos de cigana oblíqua e dissimulada”.

Na noite de ontem, 30, 09 (nove) agremiações de outros municípios se apresentaram na etapa regional e hoje, 1º de julho, mais nove irão encerrar o festival, inclusive o "Arraiá do Ribuliço”, representante da municipalidade. 

Arraiá do 18 Tão homenageia João Zuba no XVII Festival Junino de Altaneira. Fotomontagem: Blog Negro Nicolau.