Rodrigo
Maia (DEM-RJ), eleito hoje (2) presidente da Câmara para o biênio 2017-2018,
assumiu pregando a harmonia dentro e fora da Casa, mas a sessão que o elegeu
não teve nada de tranquilidade. A sessão durou quase cinco horas e foi marcada
por recursos, denúncias de quebra de regimento e de acordos feitos na última
hora em troca de cargos para a mesa diretora, que foi disputada amplamente
entre os partidos. Também se destacou por atos de solidariedade e condolências
à família do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pela morte de sua mulher,
Marisa Letícia.
Os
293 votos de Maia o fortaleceram, sobretudo diante da expectativa de que fosse
para um segundo turno, por conta da pulverização de candidaturas. Até o início
da semana, ele tinha como garantidos cerca de 200 votos – recebeu quase 100 a
mais, com o apoio da equipe de Michel Temer – que, a princípio sigiloso,
tornou-se explícito desde ontem.
Em
troca, ele demonstrou sua gratidão logo após o resultado da eleição. Afirmou
que vai instalar dentro de poucos dias a comissão para apreciar a minirreforma
trabalhista enviada pelo Executivo no final de 2016 e atuar para que a
tramitação da reforma da Previdência aconteça de forma célere, por considerar
as duas matérias importantes para o país.
Em
segundo lugar na disputa ficou o candidato do Centrão, deputado Jovair Arantes
(PTB-GO), com 105 votos. Em terceiro ficou André Figueiredo (PDT-CE) com 59
votos – seguido, respectivamente, por Júlio Delgado (PSB-MG), com 29 votos,
Luiza Erundina (Psol-SP), com 10, e Jair Bolsonaro (PSC-RJ), com quatro. Cinco
deputados votaram em branco.
Ao
longo dos trabalhos, houve várias reclamações dos deputados sobre candidaturas
avulsas que terminaram sendo barradas. E, principalmente, queixas por causa da
ausência do vice-presidente, Waldir Maranhão (PP-MA), considerada proposital para
não atrapalhar a eleição de Maia. Como o presidente eleito vinha presidindo a
Casa desde o ano passado, em substituição ao ex-deputado Eduardo Cunha
(PMDB-RJ) num mandato tampão, coube a Maranhão, como vice, comandar a sessão.
Mas
a maior parte dos trabalhos terminou sendo presidida pelo 1º secretário, Beto
Mansur (PRB-SP), porque o vice só chegou ao Congresso faltando aproximadamente
30 minutos para a realização da votação. O PT, que oficialmente se posicionou
favoravelmente à candidatura oposicionista de André Figueiredo, anunciou logo
cedo que ajuizou mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal (STF). O
objetivo foi pedir para ser respeitada a norma regimental que garante espaço
proporcional dos partidos aos cargos na mesa diretora.
Informações
de vários deputados são de que foram negociados mais de 10 cargos da noite de
ontem até a manhã desta quarta-feira em troca do apoio a Maia. O deputado
Sílvio Costa (PTdoB-PE), que apresentou recurso sobre o tema, denunciou do
plenário, aos gritos, que um dos acordos envolveu a entrega de uma diretoria no
Banco do Brasil a nome a ser indicado por Maranhão, de forma a garantir o apoio
dele a Rodrigo Maia na condução dos trabalhos de hoje – ou a sua ausência.
Waldir
Maranhão é conhecido pelo comportamento instável durante as votações. Foi ele
quem suspendeu o processo de impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff dias
depois do anúncio de abertura, aproveitando um vácuo do então presidente,
Eduardo Cunha, na Casa (situação revertida logo depois). Mas o deputado não se
manifestou a respeito da acusação de Sílvio Costa.
Peso
da Lava Jato
“Não
podemos votar outra vez em alguém que tenha por intuito focar sua gestão na
presidência desta Casa com atitudes que representem quebra do regimento”,
afirmou Sílvio Costa, numa crítica direta a Maia.
Também
foi registrado por vários parlamentares, entre eles Glauber Braga (Psol-RJ),
Júlio Delgado, André Figueiredo e Chico Alencar (Psol-RJ), a preocupação
manifestada por muitos políticos sobre possibilidade de nomes eleitos hoje
serem substituídos dos cargos dentro de pouco tempo. Isto, caso venham a ser
indiciados judicialmente, diante da expectativa de divulgação da lista dos
delatores da Odebrecht, na Operação Lava Jato –uma vez que vários deles foram
citados em depoimentos de delatores.
“A
Lava Jato está pesando como uma espada de Dâmocles sobre muitas cabeças, nesta
eleição. Sabemos que a lista dos citados na delação da Odebrecht e do que vier
pela frente poderá causar muito barulho no Congresso e no Executivo”, avaliou
Chico Alencar.
Em
sua fala, Rodrigo Maia destacou a importância de o Legislativo ser independente
e fez uma crítica velada ao Judiciário e à interferência dos tribunais em
assuntos legislativos, por estímulo dos próprios políticos. Em relação ao Executivo,
o deputado disse que é preciso tocar as reformas que o Brasil precisa. Maia se
queixou, em especial, da judicialização feita pelos adversários sobre sua
participação na disputa até o último momento (com ações pedindo para ser
avaliado se ele poderia ser candidato tanto na primeira instância como no STF).
Lembrou que teve ganho de causa em todas as ações e prometeu atuar para que
haja “independência entre os poderes”.
'Manutenção da soberania'
O
deputado também afirmou que os parlamentares não podem viver na porta dos
tribunais para encontrar, lá, uma solução para a política. “Nossos embates
precisam ser resolvidos aqui dentro, para mostrarmos ao Judiciário e ao
Executivo que a Câmara exige respeito e quer ter sua soberania garantida”,
disse.
Jovair
Arantes, considerado principal adversário de Rodrigo Maia, disse ainda que se
fosse eleito trabalharia para que a Câmara “voltasse a conquistar o respeito do
país”. Júlio Delgado afirmou que em todas as eleições para presidência da
Câmara as mesmas promessas são feitas pelos candidatos e, a seu ver, o que está
em jogo é a mudança na forma de atuação dos próprios deputados.
André
Figueiredo afirmou que sua candidatura teve o propósito de impedir que o
presidente para o próximo biênio não fosse “nem um chantagista junto ao governo
nem um mero carimbador dos atos do Executivo”. Foi uma menção explícita ao
ex-deputado Eduardo Cunha e a Maia.
Luiza
Erundina, última a falar, destacou que a eleição de hoje consiste num fato
político cujo significado “extrapola a instituição Câmara dos Deputados em si”.
Tanto que, segundo ela, “o que está por trás das candidaturas e as articulações
sobre as disputas revelam os reais interesses dos que se reuniram em blocos
para garantir os nomes de suas preferências”.
Rogério
Rosso (PSD-DF), que era candidato até ontem, anunciou a retirada do seu nome da
disputa depois que o STF deu aval a Maia para participar do pleito. Com o
gesto, ele cumpriu promessa feita por ele à bancada do PSD de que tomaria tal
atitude, caso a candidatura de Maia fosse mantida – para não constranger
colegas que queriam votar no presidente reconduzido ao cargo.
E
Jair Bolsonaro, que num gesto oposto ao de Rosso apresentou ontem sua
candidatura, disse bem ao seu estilo que tinha se candidatado por um gesto de
“patriotismo” e que o parlamento precisaria se reunir com nomes como o dele no
comando. Seu discurso convenceu apenas três colegas, além dele.
Maia
foi eleito em um bloco que reuniu, além de seu partido, PMDB, PSDB, PP, PR,
PSD, PSB, PRB, PTN, PPS, PHS, PV e PTdoB. Passa a fazer parte da linha
sucessória do país em caso de viagem ou afastamento do presidente Michel Temer,
ao lado do presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), eleito ontem.
A
eleição para escolha dos integrantes da mesa diretora da Câmara, entretanto,
continua sendo realizada.