Há
algo de extremamente doentio na relação da extrema direita com o crime de
estupro, embora isso não seja, exatamente, uma novidade.
Na
horripilante alegoria do fascismo feita pelo cineasta Paolo Pasolini, em 1975,
“Saló ou 120 dias de Sodoma”, um
grupo de jovens, homens e mulheres, é sequestrado por militares fascistas para
ser brutalizado e submetido a todo tipo de sevícia sexual.
No
filme, as cenas de sadismo, escatologia e tortura são o pano de fundo para as
sequências de estupro, um instrumento de dominação presente em todas as
masmorras de governos autoritários, uma arma de guerra de todos os exércitos –
um método de terror que nunca se perdeu no tempo.
No
Brasil, o uso do estupro para aterrorizar e torturar presos políticos,
sobretudo as mulheres, tornou-se um legado patológico da ditadura militar
transformado em um incontrolável desejo sexual pelos psicopatas de direita. Ora
pensado como instrumento de vingança, ora como punição necessária aos que não
rezam pela cartilha fascista.
As
poucas pessoas que conheço adeptas do pensamento fascista, além das muitas que
percebo por meio das redes sociais, veem no estupro de presos (políticos ou
não) uma ação quase que necessária, única forma de tornar exemplar uma punição
baseada somente em sentenças de prisão.
Dessa
forma, para essas pessoas, não basta que Lula seja preso, é preciso que, uma
vez na cadeia, ele (e todos os petistas, comunistas, ateus, abortistas, gays)
também sofra sevícias sexuais severas, exemplares. Uma patologia morbidamente
freudiana imaginada como dor e punição para o outro, mas como óbvia fonte de
prazer doentio para quem a deseja.
Jair
Bolsonaro, processado no Supremo Tribunal Federal por incitação ao estupro da
deputada Maria do Rosário (PT-RS), reúne em si e em torno de seus seguidores
todas as variáveis dessa patologia.
Ao
votar pelo impeachment da presidenta Dilma Rousseff, Bolsonaro fez questão de
homenagear o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, a besta fera que torturava
presos políticos no DOI-CODI de São Paulo, nos anos 1970.
Lá,
Ustra colocava ratos nas vaginas de mulheres e organizava sessões de estupros
para aterrorizá-las. Ato contínuo, colocava as próprias filhas para brincar com
as presas recém-seviciadas, como denunciou, no histórico artigo “Brinquedo
macabro”, o jornalista Moacyr Oliveira Filho, o Moa.
Ustra
era um demente monstruoso.
Por
essa razão, não deixa de ser coerente que os admiradores de Jair Bolsonaro (e,
por extensão, de Brilhante Ustra), hidrófobos alimentados por uma ração
permanente de ódio, ignorância e intolerância, infestem as redes sociais para
comemorar o assalto sofrido por Maria do Rosário. E, mais ainda, demonstrar
imenso descontentamento por ela não ter sido estuprada.
Trata-se
de uma matilha adestrada pela narrativa que relaciona Direitos Humanos à defesa
de bandidos. Uma deformação de pensamento que, infelizmente, revela a
precariedade da educação básica brasileira, principalmente nessa classe média
iletrada e reacionária que, hoje, sustenta a candidatura de um idiota que
comemora um assalto e torce pelo estupro de uma mulher. (Por Leandro Fortes, na Revista Fórum).