(FOTO | Reprodução | Instagram). |
Por Nicolau Neto, editor
Na última segunda-feira,12, Ticiane Pereira da Silva relatou a TV News Cariri um caso de racismo ocorrido em um restaurante no município de Crato.
Livia Sant'Anna. (FOTO | Reprodução). |
Por Nicolau Neto, editor
O
Grupo de Valorização Negra do Cariri (GRUNEC) e o Núcleo de
Estudos em Educação, Gênero e Relações Étnico-Raciais (Negrer),
aderiram na tarde desta segunda-feira, 24, à Carta do MIPAD (Most
Influential People of African Descent) em apoio ao nome da jurista
Lívia Sant’Anna Vaz para uma das vagas do Supremo
Tribunal Federal.
Em nota lançada em suas redes,
destacam a biografia da promotora que tem atuado de forma constante e
consistente contra o racismo. Ela autua no Ministério Público da
Bahia (MP-BA) desde 2004, sendo uma jurista referência nacional e
internacional na defesa dos direitos humanos, sobretudo no combate ao
racismo e promoção da igualdade racial, proteção das mulheres em
situação de violência e da população LGBTTQIAP+.
Livia
tem doutorado em Ciências Jurídico-Políticas. Chegou escrever
dois livros: “AJustiça é uma mulher negra” e
“Cotas raciais”. No currículo, Lívia ainda
carrega o título de ser a única brasileira
a ser reconhecida
como uma das 100 Pessoas de Descendência Africana mais Influentes do
Mundo, na edição Lei & Justiça.
Segundo o Grunec,
"além de preencher todos os requisitos constitucionais para
ser nomeada Ministra do STF - em especial notório saber jurídico -,
a promotora de justiça demonstra competência, capacidade de diálogo
com os movimentos sociais e total alinhamento com o projeto político
de redemocratização do país".
Então, se você
defende um sistema de justiça com diversidade de gênero, raça e
regional, assine a carta de apoio
Professor Nicolau Neto ao lado de Valéria e Verônica, duas das fundadoras do GRUNEC. (FOTO | Acervo Pessoal). |
Por Nicolau Neto, editor
Neste
sexta-feira, 21 de abril, o coletivo vanguarda na luta antirracista na região
caririense celebra 22 anos. O Grupo de Valorização Negra do Cariri (GRUNEC)
foi, sem dúvida, um dos pioneiros enquanto força coletiva na luta contra o
racismo nesta região e em nota divulgada na rede social Instagram, conta que
embora a data é formal, mas que a gestação é de meses antes.
“Nessa longa trajetória de mais de duas
décadas temos o orgulho de dizer que resistimos, multiplicamos, transformamos,
lutamos, crescemos”, destaca trecho da nota que traz para o público mais
jovem as mais diversas ações encampadas pelo grupo, como a edição do 1° jornal
de imprensa negra do Cariri, intitulado "Afrocariri" e a “incidência
em questões ligadas à educação, saúde, mulheres negras, convivência com o
semiárido, juventudes negras, acolhimento e integração de imigrantes, cotas,
segurança pública, cultura, entre muitas outras…”.
Foi
frisado ainda as honrarias recebidas, como por exemplo, o “Prêmio Frei Tito de Alencar de Direitos Humanos da Assembleia
Legislativa do Estado do Ceará e Comissão de Direitos Humanos e Cidadania”,
o “ Prêmio Fórum Justiça de Direitos
Humanos Maria Amélia Leite”, além da “Comenda
de mérito defensorial da Defensoria Pública do Ceará, entre outros”.
Foram muitas realizações! E serão quantas mais forem necessárias e nossos braços conseguirem construir para continuar a transformar a realidade em que vivemos. Queremos Bem Viver! Vida longa ao GRUNEC. (Nota do GRUNEC).
Quando
da passagem das duas décadas, o blog trouxe a cena um pequeno histórico da luta
negra por direitos e pelo bem viver ancorado pelo GRUNEC.
Abaixo você confere:
O
ano era 2001. Um grupo constituído por cerca de cinco pessoas se reuniram
depois de uma aula de natação na garagem da casa de uma delas e passaram a
dialogar sobre as mazelas que afligiam a sociedade brasileira e, de forma mais especifica, aqueles grupos que
sempre estiveram e ainda estão a margem – negros e negras.
Destes
diálogos sobre desigualdades surgiu a ideia de transformar discursos
individuais em ação coletiva e em luta organizada visando, sobretudo, promover
a igualdade étnica/racial e a autoestima da população negra do cariri e
difundir a consciência quanto a afrodescendência. O que caminha no sentido de
valorizar a nossa história. Com esse ideal nascia o Grupo de Valorização Negra
do Cariri (GRUNEC) que oficialmente (com registro) está com 19 anos, mas de atuação
já possui duas décadas.
O
GRUNEC se constituiu ao longo desses 20 anos como um coletivo que escolheu o
caminho da luta, da resistência e da persistência ao trabalhar de forma
comunitária e saindo da zona de conforto para visitar as comunidades de base,
as comunidades tradicionais, como o povo indígena e os grupos remanescentes de
quilombolas.
Enquanto
entidade organizativa, de combate a toda forma de discriminação, preconceito e
de racismo, tem atuado na proporção em que essas injustiças ocorrem. Como
exemplo, seja tendo sua organização, colaboração ou idealização, pode-se citar
a Caminhada contra a Intolerância Religiosa realizada anualmente em Juazeiro do
Norte, a Marcha Regional de Mulheres Negras do Cariri que visa denunciar formas
de discriminação, opressão e aniquilamento, além do Congresso Artefatos da
Cultura Negra que em 2019 chegou a sua décima edição e que tem se consagrado
como o maior evento de pesquisa sobre a população negra do país.
Nesta
ambiência de atuação, não se pode esquecer também de um dos trabalhos mais
colaborativos em que pese a educação voltada para as relações étnico-raciais: o
Mapeamento das Comunidades Rurais Negras e Quilombolas do Cariri feito junto a
Cáritas Diocesana de Crato – CE, tendo como resultado o lançamento da “Cartilha Caminhos, Mapeamento
das Comunidades Negras e Quilombolas do Cariri Cearense”. Este trabalho
contou com a participação de cerca de 25 comunidades. Seis delas se
autoreconheceram remanescentes de quilombolas. Note-se ainda que comunidades
como as de Arruda (Araripe), Sousa (Porteiras) e Serra dos Chagas (Salitre) já
contam com certificado de remanescentes de quilombolas adquirido junto da
Fundação Cultural Palmares.
Outras
atuações colocam este coletivo negro como protagonista. Cita-se aqui a 1ª
Audiência Pública Federal no ano de 2007, onde discutiram a implementação da
Lei nº 10.639/03 ao reunirem representantes de 42 municípios da Região do
Cariri, o 1º Seminário no Crato em 2005, para discutir a Igualdade Racial e a
realização anualmente da Semana da Consciência Negra.
O
Grunec reúne sem seus quadros professores e professoras universitários/as, docentes
da educação básica, estudantes, pesquisadores/as, líderes religiosos/as e
ativistas sociais, dentre outros e continua firme e forte, principalmente agora
em tempos de cortes de direitos, legitimação desenfreada do racismo, do
machismo e de ofensas sem barreiras a comunidades LGBTs. Por isso, os lemas
mais apregoados do grupo são “Aquilombar
é Preciso” e “Pelo Bem Viver”.
Da esq. para a dir. (Janayna, Valéria, Lívia e Verônica). FOTO | Reprodução | WhatsApp). |
Por Nicolau Neto, editor
Em
reunião realizada no formato híbrido na noite desta terça-feira, 20, o Grupo de
Valorização Negra do Cariri (GRUNEC) promoveu sua Assembleia Geral visando
dentre outras pautas, eleger e empossar a nova diretoria.
Antes
da eleição, diversos integrantes fizeram um balanço da atuação do grupo nessas
mais de duas décadas, como Verônica Carvalho, Maria Raiane, Valéria Carvalho,
Zuleide Queiroz Adriano Almeida, Carlos, Givaldo, este editor e Lívia
Nascimento.
Todos
fizeram questão de lembrar "os
passos que vêm de longe desse grupo que vem fazendo história não só no Cariri e
Ceará, mas nacionalmente, com reconhecimento até internacional”,
principalmente em que pese "a força
motriz para mover e romper com estrutura racista".
Destacaram
também as dificuldades enfrentadas nesses últimos quatro anos. "Lutamos para viver", disseram.
Nova Diretoria
Apenas
uma chapa foi constituída e foi eleita sem ter questionamentos em contrário. A
advogada, educadora e mestre em Direitos Humanos, Lívia Nascimento foi eleita
presidente para o biênio 2023|2024. Completam a diretoria Janayna Leite
(vice-presidente), Carlos (1° Secretário), Maria Raiane (segunda Secretária),
Givaldo (3° Secretário), Valéria Carvalho (primeira tesoureira) e Lourdes
(segunda tesoureira).
Conselho Fiscal
O Conselho Fiscal será composto por Zuleide Queiroz, Adriano Almeida e Gauberto.
Grunec lança nota de repúdio às violações a lei de cotas no Ceará. (FOTO/ Reprodução). |
Por Valéria Rodrigues, Colunista
O Grupo de Valorização Negra do Cariri (GUNEC)
lançou nesta segunda-feira, 19 de dezembro, nota de repúdio as violações sistemáticas à lei de cotas por parte das instituições
públicas do estado do Ceará. Segundo o grupo, mesmo havendo legislações tanto a
nível nacional, como o Estatuto da Igualdade Racial de 2010 e, no âmbito
estadual, como a que preceitua a reserva de vagas nos cursos de graduação das
universidades estaduais e a que estabelece a reserva de vagas nos concursos
públicos de entidades públicas estaduais, de 2017 e 2021, respectivamente, foi
preciso recorrer de forma coletiva ao sistema de justiça para denunciar a
inobservância dessas normas.
A nota endereçada a governadora do Ceará, Izolda Cela (Sem partido)
e ao governador eleito Elmano de Freitas (PT), foi assinada por vários
movimentos.
Confira abaixo o documento:
À Excelentíssima Senhora Governadora do Estado do Ceará
Professora Isolda Cela
Ao Senhor
Elmano de Freitas
Governador Eleito do Estado do Ceará
Fortaleza/CE
REPÚDIO A VIOLAÇÃO
SISTEMÁTICA DA LEI DE COTAS PELO ESTADO DO CEARÁ
O Grupo de Valorização Negra do Cariri
(GRUNEC) vem a público manifestar repúdio as violações sistemáticas à lei de
cotas por parte das instituições públicas do estado do Ceará.
A efetividade das políticas de ações
afirmativas, que resultou da luta histórica dos movimentos negros pela
igualdade, impõe à Administração Pública a observância da sua concretude,
tratando os iguais de forma igual e os desiguais de forma desigual, na medida
da sua desigualdade.
Apesar da existência da Lei nº 12.288/2010,
que instituiu o Estatuto da Igualdade Racial no âmbito nacional, que preza por
políticas em prol da igualdade, no âmbito estadual, a Lei n.º 16.197, de 17 de
janeiro de 2017 estabelece a reserva de vagas nos cursos de graduação das
universidades estaduais e a Lei n° 17.432/2021, que estabelece a reserva de
vagas nos concursos públicos de entidades públicas estaduais, apenas entre 2021
e 2022, diversos processos coletivos foram instaurados perante o sistema de
justiça para denunciar a inobservância dessas normas.
A título de exemplo, cita-se:
1-
Procedimento nº
01.2022.00000958-4, em trâmite no Ministério Público do Estado do Ceará, em
face do Instituto de Desenvolvimento Educacional, Cultural e Assistência
Nacional (Idecan) e o Estado do Ceará para retificação do resultado dos
candidatos autodeclarados negros do concurso público da Polícia Civil do
Ceará (PCCE);
2-
o Procedimento
n° 09.2022.00027444-7, em trâmite no Ministério Público do Estado do Ceará, em
face da Secretaria de Segurança Pública do Estado do Ceará e Perícia Forense do
Estado do Ceará (PEFOCE) para retificação do resultado dos candidatos
autodeclarados negros do concurso público da PEFOCE;
3-
a Ação Civil
Pública n° 0201613-44.2022.8.06.0071 em face da Universidade Regional do Cariri
(URCA) para retificação do edital do concurso público de magistério superior,
visando aplicação do percentual correto de vagas reservadas ao cotistas sem o
método de fracionamento;
4-
Procedimento nº
01.2022.00000969-5, em trâmite no Ministério Público do Estado do Ceará, também em face da URCA para implantação da
comissão de heteroidentificação nas seleções dos vestibulares;
5-
o acordo
extrajudicial entre Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Ceará
(SSPDS-CE), a Polícia Militar do Ceará (PMCE), a Secretaria de Planejamento e
Gestão do Estado do Ceará (Seplag), a Defensoria Pública do Estado do Ceará
(DPCE) e Fundação Getúlio Vargas (FGV) para convocação de mais candidatos
cotistas aprovados no concurso para soldado da PMCE.
O GRUNEC denuncia à sociedade que há por
parte dos gestores do Governo e dos órgãos do estado do Ceará um descumprimento
sistemático da efetividade da política de cotas por meio de omissões e práticas
administrativas ilegais, que burlam o microssistema legal que rege a política
afirmativa com o fim de criar obstáculos ou relaxar dolosamente os mecanismos
de controle, diminuindo na prática o quantitativo de pessoas negras com acesso
às vagas definidas em editais para os cotistas.
Importa ressaltar que a Política Afirmativa
de Cotas no Brasil tem respaldo na Constituição Federal, nas leis federais,
estaduais e nas diversas convenções internacionais firmadas junto aos sistemas
globais e regionais, como:
A - Convenção Internacional sobre a
Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racial - aprovada pela Resolução
2106 da Assembleia Geral das Nações Unidas, de 21 de dezembro de 1965;
B - Declaração de Durban – adotada em 31 de
agosto de 2001, em Durban (África do Sul), durante a III Conferência Mundial de
Combate ao Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata;
C - Convenção Interamericana Contra o Racismo
e a Discriminação Racial e Formas Conexas de Intolerância, ingressando no
ordenamento pátrio com status de Emenda Constitucional;
Há de se considerar que o período de
2015-2024 foi estabelecido como a Década Internacional dos Afrodescendentes
proposta pela Organização das Nações Unidas (ONU), cuja proposta é reconhecer a
desigualdade e a discriminação étnico-racial; promover a justiça através de
medidas especiais e desenvolver a comunidade afrodescendente assegurando a
adoção de políticas sociais.
As ações afirmativas são bandeiras históricas
dos movimentos negros brasileiros que reivindicam plena democracia nos espaços
de saber e poder. Na academia, é preciso que as universidades se comprometam
com a construção de uma agenda de enfrentamento ao racismo, o que inclui a
implementação das Leis 10.639/03 e 11.645/08 na estrutura curricular dos cursos
que ofertam e da política de cotas, com garantias de acesso e permanência.
No Ceará, as organizações dos movimentos
negros unem-se ao contexto nacional e, com isso, reivindicam a ampliação, o aperfeiçoamento
e o monitoramento das políticas de ações afirmativas nas instituições públicas do
Estado.
No Cariri cearense, o GRUNEC vem debatendo
essa questão desde a sua criação em 2001, com a realização de audiências
públicas e outras atividades onde essa pauta tem sido central, a entrega à URCA
da Carta de Princípios Institucionais para Políticas Afirmativas da Igualdade
Racial elaborada com a participação de outros coletivos negros como o Pretas
Simoa, as discussões geradas anualmente nos últimos 13 (treze) anos por ocasião
da realização do Artefatos da Cultura Negra que tem oferecido suporte formativo,
além dos encaminhamentos via carta aberta pelos Coletivos que formam esse
importante movimento de combate ao racismo e tem sido pauta das ações
protagonizada pelos movimentos estudantis.
Não obstante, os dados divulgados pelos
estudos do Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (IPECE)
demonstram que mesmo sendo um dos estados brasileiros com maior número de
população negra (72%), considerando a soma de pretos e pardos, os marcadores
sociais de desigualdades raciais são significativos no que diz respeito ao grau
de escolaridade, taxas de encarceramento, renda e ocupação formal,
evidencializando a precarização histórica da vida da população negra.
É por isso que as medidas legais adotadas
para a reserva de vagas para pessoas negras pressupõem uma reparação histórica
de desigualdades e desvantagens acumuladas, de modo a aumentar a representação
negra nos espaços de poder, saber e de tomadas de decisões, refletindo no seu
acesso a direitos fundamentais com igualdade de oportunidades.
Nesse ínterim, a reserva de vagas para
pessoas negras se justifica em face dos severos obstáculos enfrentados para a
sua inserção nas mais diversas esferas da vida social, fazendo-se necessária,
portanto, a aplicação da igualdade material, a fim de possibilitar o adequado
combate à discriminação racial.
O GRUNEC informa que ante a ausência de uma
retificação nas condutas dos gestores dos órgãos, autarquias e fundações
estaduais para correção, reparo e restauro da máxima eficiência da Política de
Cotas no Estado do Ceará passará a requerer providências perante as instâncias
federais e órgãos internacionais para que esta unidade federativa seja
compelida a repelir as burlas e omissões que afastam o povo negro do acesso às
vagas que lhe são de direito.
Crato/CE, dezembro de 2022.
ASSINAM ESSA NOTA:
Ponto de Cultura Municipal Terreiro das Pretas
CONSELHO MUNICIPAL DE PROMOÇÃO DA
IGUALDADE RACIAL-COMPIR CRATO
Conselho Estadual de Defesa dos
Direitos Humanos (CEDDH) e Conselho Municipal de Direitos Humanos de Sobral
(CMDH-Sobral)
NEDESA (Núcleo de Estudos de
Descolonização do Saber)
Associação Quilombola do
Cumbe/Aracati - CE
Organização Popular - OPA
Teia dos Povos do Ceará
Núcleo de Estudos em Gênero
e Relações Étnico-Raciais (NEGRER)
Instituição Religiosa de matriz
africana. Candomblé Quilombaxé Kwe Sèjá Omi Yponda
MNU (Movimento Negro Unificado)
Rede de Mulheres negras do Ceará
Confederação dos trabalhadores do
serviço público municipal - Confetam/CUT
Conselho Municipal dos Direitos da
Mulher do Crato
Ouvidoria Geral Externa da
Defensoria Pública
Caritas Diocesana de Crato
Fórum Cearense de Mulheres-AMB
De Preto Plataforma de Criação e
Produção Artística
Espaço Arte Africana Campinas
NEPIR- Núcleo de Educação para
Promoção de Igualdade Racial (Juazeiro do Norte)
Neabi - IFCE Juazeiro do
Norte
Coletivo Camaradas
Ponto de Cultura Carrapato
Cultural
CAIC
CARLKISSDANCE- COMPANHIA DE DANÇA
NEGRA CONTEMPORANEA
Associação Abayomi Juristas
Negras
Associação Mensageiras da Paz
Comitê Quilombola
Fórum Permanente de Educação e
Diversidade Ético Racial do Ceará
Comitê impulsionador em defesa da
liberdade religiosa
NOSSO movimento pelo bem estar no
Brasil
NEEHDREM UFCA (Núcleo de Estudos
em Educação, História, Diversidades, Raça, Etnia e Movimentos Sociais)
Frente de Mulheres do Cariri
Instituto Feminista Casa Lilás
Íamis kariris
Trupe dos Pensantes - Artes
Coletivo Florestar
Justiça Estadual determina Urca a corrigir Edital de Concurso por burla ao sistema de cota para PCD'S e negros. (FOTO | Reprodução |WhatsApp). |
No
último dia 05 de agosto de 2022, a Justiça Estadual do Ceará, por meio de
sentença de mérito proferida pelo Magistrado José Flávio Bezerra Morais, da 2ª
Vara Cível do Crato determinou à Universidade Regional do Cariri a correção, em
72 horas, a correção do Edital do Concurso Público para Professores daquela
Instituição de Ensino Superior para que a Lei de Cotas para Pessoas com
Deficiência (PCD’s) e Negros seja integralmente respeitada.
Conforme
teor da Sentença, o Judiciário verificou a ocorrência de burla ao referido
sistema de distribuição de vagas que prejudicaria frontalmente os direitos
consolidadas em lei das referidas minorias (Lei Estadual n. 17.432/2021).
Ao
lançar o concurso, a URCA no edital do certamente previu uma sistemática em que
somente 06 vagas de professor das 184 previstas seriam destinadas para cotistas
com deficiência e negros.
Agora
com a determinação judicial a URCA terá que garantir sobre o total de vagas
destinadas ao concurso o percentual de 5% para PCD’s (07 vagas) e 20% para
negros (37 vagas).
A
sentença judicial se deu no âmbito de Ação Civil Pública nº:
0201613-44.2022.8.06.0071, ajuizada pelo Grupo de Valorização Negra do Cariri –
GRUNEC e Sindicato dos Docentes da URCA – SINDURCA, cujo teor da sentença,
parecer do Ministério Público Estadual favoráveis ao pleito seguem em anexo. Ainda
cabe recurso da sentença.
Detalhamento
do caso segue em nota da assessoria jurídica do GRUNEC, a seguir.
Crato, 10/08/2022
ASCOM GRUNEC
Email: ggrunec@gmail.com
NOTA DO GRUNEC
TIRA A MÃO DAS NOSSAS COTAS!
Após
mais de três décadas de existência, a Universidade Regional do Cariri lançou
seu primeiro edital para provimento no cargo de magistério superior prevendo a
reserva de vagas para cotistas negros e pessoas com deficiência (PCD’s) pelo
sistema de cotas.
Contudo,
para nossa insatisfação –mas não surpresa- a forma com que o edital fracionava
as vagas por cursos e setores de estudo inviabilizava a correta aplicação da legislação
sobre cotas, já que acabava prevendo apenas 1 vaga na maioria dos setores para
ampla concorrência. Sabemos que não tem como reservar 20% de vagas para negros
e 5% para PCD’s com esse quantitativo. Por isso, das 184 vagas previstas,
apenas 3 eram para cotistas negros e 3 para PCD’s.
A
não surpresa com o ocorrido vem da nossa experiência de resistência de mais de
duas décadas que nos ensinou na luta que as instituições no Brasil ainda
possuem um posicionamento rígido diante das necessidades de mudanças
necessárias para romper com o pacto narcísico da branquitude que fundamenta o
racismo institucional e estrutural.
Segundo
Cida Bento (o pacto da branquitude, 2022, p.12), "(...) as instituições
constroem narrativas sobre si próprias sem considerar a pluralidade da
população com a qual se relacionam, que utiliza seus serviços e consome seus
produtos. Muitas dizem prezar a diversidade e a equidade, inclusive colocando
esses objetivos como parte de seus valores, de sua missão e de seu código de
conduta. Mas como essa diversidade e essa equidade se aplicam se a maioria de
suas lideranças e de seu quadro de funcionários é composta quase que
exclusivamente de pessoas brancas? Assim vem sendo construída a história de
instituições e da sociedade onde a presença e a contribuição negras se tornam
invizibilizadas. (...) Essa transmissão atravessa gerações e altera pouco a
hierarquia das relações de dominação ali incrustada. Esse fenômeno tem um nome,
branquitude, e sua perpetuação no tempo se deve a um pacto de cumplicidade não
verbalizado entre pessoas brancas, que visa manter seus privilégios.
(...)".
Conforme
Silvio Almeida (O que é racismo estrutural?, 2018, p.29) racismo institucional
é “(...) o resultado do funcionamento das instituições, que passam a atuar em
uma dinâmica que confere, ainda que indiretamente, desvantagens e privilégios a
partir da raça”. O autor explica que racimo deve compreendido como exercício de
poder e dominação. “Assim, detêm o poder os grupos que exercem o domínio sobre
a organização política e econômica da sociedade. Entretanto, a manutenção deste
poder adquirido depende da capacidade do grupo dominante de institucionalizar
seus interesses (...)”. “Assim, o domínio de homens brancos em instituições
públicas –por exemplo (...) reitorias de universidades públicas etc.- (...)
depende, em primeiro lugar, da existência de regras e padrões que direta ou
indiretamente dificultem a ascensão de negros e/ou mulheres, e, em segundo
lugar, da inexistência de espaços em que se discuta a desigualdade racial e de
gênero, naturalizando, assim, o domínio do grupo formado por homens brancos”
(ALMEIDA, 2018, p.31).
Do
edital da URCA, assim como da Universidade Estadual do Ceará (UECE) e
Universidade Estadual Vale do Acaraú (UVA) que publicaram seus editais da mesma
forma no que diz respeito as cotas, o que chega para nós dos movimentos negros
é que não se pode confundir a conquista possibilitada pela legislação sobre
cotas com o que vem ocorrendo na prática.
As
instituições de ensino, utilizando-se maliciosamente do discurso de autonomia
universitária conferida pela Constituição Federal, vêm reproduzindo uma lógica
de “cotas para inglês ver”, pois a metodologia usada para aplicar o percentual
das cotas não consegue alcançar o mínimo previsto na lei. Por conseguinte, as
cotas, que são ações afirmativas que buscam efetivar o direito humano e
constitucional à igualdade material, enquanto medida de reparação social
histórica, não estão surtindo os efeitos esperados. Os espaços de poder e saber
continuam sendo ocupados majoritariamente por homens, brancos e ricos.
Os
editais desses concursos, e de tantos outros, são, antes de tudo, a
concretização de um intrincado sistema de manutenção de privilégios. O
branquíssimo novo quadro almejado de professoras/es da educação superior é,
apenas, mais uma evidência da tentativa de manutenção do pacto narrado acima
pela Professora Cida Bento. Porém, especialmente de universidades públicas,
instituições de educação que, em tese, são plurais, diversas e democráticas,
espera-se muito mais.
Nesse
sentido, visando garantir a efetividade da lei de cotas, em 22/05/2022
ajuizamos em coautoria com o SINDURCA a Ação Civil Pública n°
0201613-44.2022.8.06.0071 que tramita na 2ª Vara Cível da Comarca de Crato. O
magistrado, dr. José Flávio Bezerra Morais, deferiu a medida liminar para
obrigar a URCA a corrigir o edital em 72h, visando garantir a aplicação correta
da lei de cotas no certame.
O
fundamento principal da referida ação toma como base o entendimento consolidado
do Supremo Tribunal Federal quando julgou a Ação Declaratória de
Constitucionalidade n.º 41, tendo por objeto a Lei n.º 12.990/2014, a fim de
refirmar a sua constitucionalidade e os procedimentos que são feitos em relação
à autodeclaração, entendimento este que tem eficácia vinculante contra todos.
No voto do ministro relator constam alguns pontos que achamos válidos
enfatizar: i) a importância da ação afirmativa para assegurar a igualdade
material e igualdade como reconhecimento, com vistas à superação do racismo
estrutural presente no país; ii) inviolabilidade dos princípios do concurso
público e da eficiência, considerando que a reserva de vagas para negros não os
isenta da aprovação no concurso público à vista de que eles precisam alcançar
notas e serem avaliados da mesma forma que as pessoas que concorrem em ampla
concorrência; iii) observância do princípio da proporcionalidade e constatação
de que a existência de política de cotas para o acesso de negras/os à educação
superior não torna a reserva de vagas nos quadros da administração pública
desnecessária.
Ainda
no seu voto o ministro Luís Roberto Barroso refirma os temores da nota técnica
do Ipea na medida em que ressalta que a divisão das vagas em áreas de
conhecimento, campus ou editais com uma única vaga, podem contribuir para que a
lei não surta efeito e por isso os pontos que definiram os parâmetros que devem
ser observados pelas instituições públicas para aplicar a lei de cotas merecem
destaque. Quais sejam: (i) os percentuais de reserva de vaga devem valer para
todas as fases dos concursos; (ii) a reserva deve ser aplicada em todas as
vagas oferecidas no concurso público (não apenas no edital de abertura); (iii)
os concursos não podem fracionar as vagas de acordo com a especialização
exigida para burlar a política de ação afirmativa, que só se aplica em
concursos com mais de duas vagas; e (iv) a ordem classificatória obtida a
partir da aplicação dos critérios de alternância e proporcionalidade na
nomeação dos candidatos aprovados deve produzir efeitos durante toda a carreira
funcional do beneficiário da reserva de vagas. (ADC 41, Tribunal Pleno, julgado
em 08/06/2017).
É um
precedente de suma relevância para entender o porquê não há justificativa legal
para as instituições continuarem lançando editais que preveem o fracionamento
das vagas por áreas de especialidade, de forma a obstacularizar a aplicação do
percentual total das cotas previsto em lei.
A
mobilização refletiu na articulação de reinvindicações também na UECE e UEVA.
Tamanha repercussão certamente foi o que fez o Poder Executivo estadual
publicar o Decreto n° 34.821 de 27 de junho de 2022, que dispõe sobre a reserva
de vagas para candidatos negros e PCD’s em concursos públicos. Em resumo, o
referido decreto autoriza que quando houver menos de 5 vagas (já que a lei
estadual de cotas para negros permite a reserva de 20% de vagas apenas quando
houver 5 ou mais vagas no total) a segunda vaga, quando houver, automaticamente
será do candidato cotista negro, e a terceira da PCD.
Diante
do decreto, a URCA pediu extinção do feito sem resolução do mérito por perda
superveniente do objeto da ação em razão da publicação do decreto.
Ocorre
que na prática, embora tenha aumentado o quadro de vagas reservadas para negros
e PCD, o decreto continuava não contemplando o mínimo previsto em lei. Basta
ver o edital da UECE republicado após o decreto, que passou a reservar 67 vagas
cotistas negros, quando deveriam ser 73 para atingir o mínimo de 20%. Ora,
somos maioria da população cearense, o mínimo de 20% já nos parece tão pouco,
menos que isso a quantidade é irrisória. Jamais aceitaríamos.
Nesse
contexto, em trocas de experiências com profissionais de universidades em que a
política de cotas estão há mais tempo sendo aplicadas de forma positiva,
apresentamos como proposta de acordo extrajudicial uma metodologia semelhante à
adotada pela Universidade Federal da Bahia em seu último concurso público para
que a URCA pudesse sanar a irregularidade. Contudo, a URCA continuou insistindo
que a aplicação conforme o decreto era melhor, pois a instituição acredita,
conforme expôs na sua peça recursal de agravo de instrumento nos autos do
processo, que de outra forma não seria justo, pois a definição de critérios
para distribuir as vagas a partir do novo decreto era mais clara e objetiva.
Nos
parece muito clara mesmo, bem branca para ser mais enfático, essa lógica
utilizada para interpretar como seria “justo” distribuir vagas entre ampla
concorrência e cotistas, sendo que de uma forma ou de outra a maioria das vagas
sempre foi e vai continuar sendo da ampla concorrência. A racionalidade dita
moderna, ao nosso ver, de fato não consegue, ainda, promover o descentramento
cognitivo da colonialidade racializada para compreender que o mínimo previsto
em lei já é o mínimo e que os diversos concursos públicos realizados dessa
forma –com metodologia de fracionamento das vagas por áreas de especialidade-
não atingem sua função social.
Na
audiência de conciliação insistiram na argumentação do tipo “nós temos
autonomia universitária e por isso não aceitaremos sugestões de terceiros com
base em experiências de outras universidades para interferir nas nossas decisões
institucionais”. Ou seja, de nada vale a expertise de diversas/os
pesquisadoras/es doutoras/es pós-doutoras/es que já conseguiram implantar há
anos uma política de cotas eficiente porque instituição tem autonomia... sem
reduzir essa garantia constitucional de extrema relevância para nossas
universidades, mas foi terrível ouvir esse fundamento tão valoroso como
argumento para legitimar sua autonomia para ser eficaz em ser perversa mantendo
a instituição fechada para dialogar com a comunidade acadêmica, movimentos
negros e sociedade em geral. Fechada para o ingresso da pluralidade e diversidade
em seu quadro de docentes.
O
resultado desta ação ao nosso ver é primoroso ao julgar procedente este
processo que envolve interesses e direitos coletivos e difusos. E nos mostra
que, embora historicamente o Direito tenha servido de alicerce ao racismo
institucional/estrutural ao legitimar por meio de leis ou julgamentos injustos
casos que envolvem direta ou indiretamente a temática étnico-racial, é preciso
insistir em mostrar uma face do Direito que o coloque como instrumento da
justiça racial.
Nas
palavras do nobre Ministério Público, por meio do seu membro promotor Dr. David
Moraes da Costa “O que não se pode permitir – e o STF já sobre isso se
manifestou – é que a Instituição formate um concurso que, de princípio, já se
configure fraude à reserva de vagas, o que não será o caso sempre que se
evidenciar no certame que o respectivo edital destinou o percentual de vagas
exigido na lei para negros e pessoas com deficiência.” [...] Ao ressaltar que o
sistema de justiça não pode determinar um método específico para aplicação da
lei de cotas em razão da autonomia universitária enfatiza “Isso, por evidente,
não afasta a Universidade da exigência do dever de legalidade, o que implica em
adequar o edital do Concurso Público, com regras claras e precisas, aos
comandos legais, especialmente os insertos no Decreto n.° 34.821 e na Lei
Estadual17.432/2021.”
Considerando
todos os argumentos, consideramos um precedente judicial histórico vitorioso a
sentença proferida pelo magistrado Dr. José Flávio Bezerra Morais ao apontar
mais de uma forma da universidade efetivar corretamente a política de cotas sem
cair no “erro” de burlar as cotas.
Agora
nos resta acompanhar o cumprimento da sentença, bem como continuar averiguando
se as demais universidades vão tomar este caso como exemplo para adequarem
corretamente seus editais. Senão, lá vamos nós de novo...
Importa
lembrar que a sentença ainda não transitou em julgado, pois é necessário
decorrer o prazo para recursos. Sabemos que recorrer é direito de qualquer
parte do processo, mas achamos que ficou evidente o porquê da interpretação da
lei de cotas para criação de metodologias para aplicá-las nos concursos deve
primar pela maximização de seus efeitos para que não estejamos diante de texto
morto.
GRUNEC lança nota sobre sistema de cotas na URCA. (FOTO/ Reprodução/WhatsApp). |
A redação do Blog Negro Nicolau recebeu na noite desta segunda-feira, 08, nota do Grupo de Valorização Negra do Cariri (GRUNEC) sobre a reserva de cotas para negros e pessoas com deficiências (PCD’S) na Universidade Regional do Cariri (URCA) referente ao seu primeiro edital de concurso para o magistério com previsão de cotas.
Segundo
a nota, o edital lançado pela instituição não atendia o que preceitua a lei de
cotas, inviabilizando, portanto, o seu cumprimento. “As instituições de ensino, utilizando-se maliciosamente do discurso de
autonomia universitária conferida pela Constituição Federal, vêm reproduzindo
uma lógica de “cotas para inglês ver”, pois a metodologia usada para aplicar o
percentual das cotas não consegue alcançar o mínimo previsto na lei. Por
conseguinte, as cotas, que são ações afirmativas que buscam efetivar o direito
humano e constitucional à igualdade material, enquanto medida de reparação
social histórica, não estão surtindo os efeitos esperados. Os espaços de poder
e saber continuam sendo ocupados majoritariamente por homens, brancos e ricos”,
diz trecho do documento.
Desta
feita, o Grunec junto ao SINDURCA
ingressaram com Ação Civil Pública com a finalidade de garantir a
aplicabilidade correta da lei de cotas
na universidade. “O magistrado, Dr. José Flávio Bezerra Morais, proferiu a sentença procedente para obrigar a URCA a corrigir o edital em 72h, visando garantir
a aplicação correta da lei de cotas no certame”, pontua outra parte da nota.
Abaixo íntegra do documento:
TIRA A MÃO DAS NOSSAS COTAS!
Após
mais de três décadas de existência, a Universidade Regional do Cariri lançou
seu primeiro edital para provimento no cargo de magistério superior prevendo a
reserva de vagas para cotistas negros e pessoas com deficiência (PCD’s) pelo
sistema de cotas.
Contudo,
para nossa insatisfação –mas não surpresa- a forma com que o edital fracionava
as vagas por cursos e setores de estudo inviabilizava a correta aplicação da
legislação sobre cotas, já que acabava prevendo apenas 1 vaga na maioria dos
setores para ampla concorrência. Sabemos que não tem como reservar 20% de vagas
para negros e 5% para PCD’s com esse quantitativo. Por isso, das 184 vagas
previstas, apenas 3 eram para cotistas negros e 3 para PCD’s.
A
não surpresa com o ocorrido vem da nossa experiência de resistência de mais de
duas décadas que nos ensinou na luta que as instituições no Brasil ainda
possuem um posicionamento rígido diante das necessidades de mudanças
necessárias para romper com o pacto narcísico da branquitude que fundamenta o
racismo institucional e estrutural.
Segundo
Cida Bento (O pacto da branquitude, 2022, p.12), "(...) as instituições
constroem narrativas sobre si próprias sem considerar a pluralidade da
população com a qual se relacionam, que utiliza seus serviços e consome seus
produtos. Muitas dizem prezar a diversidade e a equidade, inclusive colocando
esses objetivos como parte de seus valores, de sua missão e de seu código de
conduta. Mas como essa diversidade e essa equidade se aplicam se a maioria de
suas lideranças e de seu quadro de funcionários é composta quase que
exclusivamente de pessoas brancas? Assim vem sendo construída a história de
instituições e da sociedade onde a presença e a contribuição negras se tornam
invizibilizadas. (...) Essa transmissão atravessa gerações e altera pouco a
hierarquia das relações de dominação ali incrustada. Esse fenômeno tem um nome,
branquitude, e sua perpetuação no tempo se deve a um pacto de cumplicidade não
verbalizado entre pessoas brancas, que visa manter seus privilégios.
(...)".
Conforme
Silvio Almeida (O que é racismo estrutural?, 2018, p.29) racismo institucional
é “(...) o resultado do funcionamento
das instituições, que passam a atuar em uma dinâmica que confere, ainda que
indiretamente, desvantagens e privilégios a partir da raça”. O autor explica
que racimo deve compreendido como exercício de poder e dominação. “Assim, detêm
o poder os grupos que exercem o domínio sobre a organização política e
econômica da sociedade. Entretanto, a manutenção deste poder adquirido depende
da capacidade do grupo dominante de institucionalizar seus interesses
(...)”. “Assim, o domínio de homens
brancos em instituições públicas –por exemplo (...) reitorias de universidades
públicas etc.- (...) depende, em primeiro lugar, da existência de regras e
padrões que direta ou indiretamente dificultem a ascensão de negros e/ou
mulheres, e, em segundo lugar, da inexistência de espaços em que se discuta a
desigualdade racial e de gênero, naturalizando, assim, o domínio do grupo
formado por homens brancos” (ALMEIDA, 2018, p.31).
Do
edital da URCA, assim como da Universidade Estadual do Ceará (UECE) e Universidade
Estadual Vale do Acaraú (UVA) que publicaram seus editais da mesma forma no que
diz respeito as cotas, o que chega para nós dos movimentos negros é que não se
pode confundir a conquista possibilitada pela legislação sobre cotas com o que
vem ocorrendo na prática.
As
instituições de ensino, utilizando-se maliciosamente do discurso de autonomia
universitária conferida pela Constituição Federal, vêm reproduzindo uma lógica
de “cotas para inglês ver”, pois a metodologia usada para aplicar o percentual
das cotas não consegue alcançar o mínimo previsto na lei. Por conseguinte, as
cotas, que são ações afirmativas que buscam efetivar o direito humano e
constitucional à igualdade material, enquanto medida de reparação social
histórica, não estão surtindo os efeitos esperados. Os espaços de poder e saber
continuam sendo ocupados majoritariamente por homens, brancos e ricos.
Os editais
desses concursos, e de tantos outros, são, antes de tudo, a concretização de um
intrincado sistema de manutenção de privilégios. O branquíssimo novo quadro almejado
de professoras/es da educação superior é, apenas, mais uma evidência da
tentativa de manutenção do pacto narrado acima pela Professora Cida Bento. Porém,
especialmente de universidades públicas, instituições de educação que, em tese,
são plurais, diversas e democráticas, espera-se muito mais.
Nesse
sentido, visando garantir a efetividade da lei de cotas, em 22/05/2022 ajuizamos
em coautoria com o SINDURCA a Ação Civil Pública n° 0201613-44.2022.8.06.0071
que tramita na 2ª Vara Cível da Comarca de Crato. O magistrado, Dr. José Flávio
Bezerra Morais, proferiu a sentença procedente para obrigar a URCA a corrigir o
edital em 72h, visando garantir a aplicação correta da lei de cotas no certame.
O
fundamento principal da referida ação toma como base o entendimento consolidado
do Supremo Tribunal Federal quando julgou a Ação Declaratória de
Constitucionalidade n.º 41, tendo por objeto a Lei n.º 12.990/2014, a fim de
refirmar a sua constitucionalidade e os procedimentos que são feitos em relação
à autodeclaração, entendimento este que tem eficácia vinculante contra todos. No
voto do ministro relator constam alguns pontos que achamos válidos enfatizar:
i) a importância da ação afirmativa para assegurar a igualdade material e
igualdade como reconhecimento, com vistas à superação do racismo estrutural
presente no país; ii) inviolabilidade dos princípios do concurso público e da
eficiência, considerando que a reserva de vagas para negros não os isenta da
aprovação no concurso público à vista de que eles precisam alcançar notas e
serem avaliados da mesma forma que as pessoas que concorrem em ampla
concorrência; iii) observância do princípio da proporcionalidade e constatação
de que a existência de política de cotas para o acesso de negras/os à educação
superior não torna a reserva de vagas nos quadros da administração pública desnecessária.
Ainda
no seu voto, o ministro Luís Roberto Barroso reafirma os temores da nota
técnica do Ipea na medida em que ressalta que a divisão das vagas em áreas de
conhecimento, campus ou editais com uma única vaga, podem contribuir para que a
lei não surta efeito e por isso os pontos que definiram os parâmetros que devem
ser observados pelas instituições públicas para aplicar a lei de cotas merecem
destaque. Quais sejam: (i) os percentuais de reserva de vaga devem valer para
todas as fases dos concursos; (ii) a reserva deve ser aplicada em todas as
vagas oferecidas no concurso público (não apenas no edital de abertura); (iii)
os concursos não podem fracionar as vagas de acordo com a especialização
exigida para burlar a política de ação afirmativa, que só se aplica em
concursos com mais de duas vagas; e (iv) a ordem classificatória obtida a
partir da aplicação dos critérios de alternância e proporcionalidade na
nomeação dos candidatos aprovados deve produzir efeitos durante toda a carreira
funcional do beneficiário da reserva de vagas. (ADC 41, Tribunal Pleno, julgado
em 08/06/2017).
É um
precedente de suma relevância para entender o porquê não há justificativa legal
para as instituições continuarem lançando editais que preveem o fracionamento
das vagas por áreas de especialidade, de forma a obstacularizar a aplicação do
percentual total das cotas previsto em lei.
A
mobilização refletiu na articulação de reinvindicações também na UECE e UEVA.
Tamanha repercussão certamente foi o que fez o Poder Executivo estadual
publicar o Decreto n° 34.821 de 27 de junho de 2022, que dispõe sobre a reserva
de vagas para candidatos negros e PCD’s em concursos públicos. Em resumo, o
referido decreto autoriza que quando houver menos de 5 vagas (já que a lei
estadual de cotas para negros permite a reserva de 20% de vagas apenas quando
houver 5 ou mais vagas no total) a segunda vaga, quando houver, automaticamente
será do candidato cotista negro e a terceira da PCD.
Diante
do decreto, a URCA pediu extinção do feito sem resolução do mérito por perda
superveniente do objeto da ação em razão da publicação da referida norma
regulamentadora.
Ocorre
que na prática, embora tenha aumentado o quadro de vagas reservadas para negros
e PCD’s, o decreto continuava não contemplando o mínimo previsto em lei. Basta
ver o edital da UECE republicado após o decreto, que passou a reservar 67 vagas
cotistas negros, quando deveriam ser 73 para atingir o mínimo de 20%. Ora,
somos maioria da população cearense, o mínimo de 20% já nos parece tão pouco, menos
que isso a quantidade é irrisória. Jamais aceitaríamos.
Nesse
contexto, em trocas de experiências com profissionais de universidades em que a
política de cotas estão há mais tempo sendo aplicadas de forma positiva,
apresentamos como proposta de acordo extrajudicial uma metodologia semelhante à
adotada pela Universidade Federal da Bahia em seu último concurso público para
que a URCA pudesse sanar a irregularidade. Contudo, a URCA continuou insistindo
que a aplicação conforme o decreto era melhor, pois a instituição acredita,
conforme expôs na sua peça recursal de agravo de instrumento nos autos do
processo, que de outra forma não seria justo, pois a definição de critérios
para distribuir as vagas a partir do novo decreto era mais clara e objetiva.
Nos parece
muito clara mesmo, bem branca para ser mais enfático, essa lógica utilizada
para interpretar como seria “justo” distribuir vagas entre ampla concorrência e
cotistas, sendo que de uma forma ou de outra a maioria das vagas sempre foi e
vai continuar sendo da ampla concorrência. A racionalidade dita moderna, ao
nosso ver, de fato não consegue, ainda, promover o descentramento cognitivo da
colonialidade racializada para compreender que o mínimo previsto em lei já é o
mínimo e que os diversos concursos públicos realizados dessa forma –com
metodologia de fracionamento das vagas por áreas de especialidade- não atingem
sua função social.
Na
audiência de conciliação insistiram na argumentação do tipo “nós temos
autonomia universitária e por isso não aceitaremos sugestões de terceiros com
base em experiências de outras universidades para interferir nas nossas
decisões institucionais”. Ou seja, de nada vale a expertise de
diversas/os pesquisadoras/es doutoras/es pós-doutoras/es que já conseguiram
implantar há anos uma política de cotas eficiente porque a instituição tem
autonomia... sem reduzir essa garantia constitucional de extrema relevância
para nossas universidades, mas foi terrível ouvir esse fundamento tão valoroso
como argumento para legitimar sua autonomia para ser eficaz em ser perversa
mantendo a instituição fechada para dialogar com a comunidade acadêmica,
movimentos negros e sociedade em geral. Fechada para o ingresso da pluralidade
e diversidade em seu quadro de docentes.
O
resultado desta ação ao nosso ver é primoroso ao julgar procedente este
processo que envolve interesses e direitos coletivos e difusos. E nos mostra
que, embora historicamente o Direito tenha servido de alicerce ao racismo
institucional/estrutural ao legitimar por meio de leis ou julgamentos injustos
casos que envolvem direta ou indiretamente a temática étnico-racial, é preciso
insistir em mostrar uma face do Direito que o coloque como instrumento da
justiça racial.
Nas
palavras do nobre Ministério Público, por meio do seu membro promotor Dr. David
Moraes da Costa “O que não se pode permitir – e o STF já sobre isso se
manifestou – é que a Instituição formate um concurso que, de princípio, já se
configure fraude à reserva de vagas, o que não será o caso sempre que se
evidenciar no certame que o respectivo edital destinou o percentual de vagas
exigido na lei para negros e pessoas com deficiência.” [...] Ao ressaltar que o
sistema de justiça não pode determinar um método específico para aplicação da
lei de cotas em razão da autonomia universitária enfatiza “Isso, por evidente,
não afasta a Universidade da exigência do dever de legalidade, o que implica em
adequar o edital do Concurso Público, com regras claras e precisas, aos comandos
legais, especialmente os insertos no Decreto n.° 34.821 e na Lei Estadual 17.432/2021.”
Tendo
em vista todos os argumentos, consideramos um precedente judicial histórico vitorioso
a sentença proferida pelo magistrado Dr. José Flávio Bezerra Morais ao apontar
mais de uma forma da universidade efetivar corretamente a política de cotas sem
cair no “erro” de burlar as cotas.
Agora
nos resta acompanhar o cumprimento da sentença, bem como continuar averiguando
se as demais universidades vão tomar este caso como exemplo para adequarem
corretamente seus editais. Senão, lá vamos nós de novo...
Importa
lembrar que a sentença ainda não transitou em julgado, pois é necessário
decorrer o prazo para recursos. Sabemos que recorrer é direito de qualquer
parte do processo, mas achamos que ficou evidente o porquê da interpretação da
lei de cotas para criação de metodologias para aplicá-las nos concursos deve
primar pela maximização de seus efeitos para que não estejamos diante de texto
morto.
Seguiremos lutando por todas as vagas para uma plena reintegração de posse.
Valéria Carvalho (ao centro) ao lado da governadora do Ceará, Izolda Cela. (FOTO/ Reprodução/ Whatsapp). |
Por José Nicolau, editor
No
último mês de abril a Defensoria Pública do Estado do Ceará completou 25 anos
de atuação. A solenidade foi marcada por exibição de documentário, falas de
representantes da entidade e até de deputados e deputadas junto à Assembleia
Legislativa.
O
grupo de Valorização Negra do Cariri (Grunec) que já tem mais de duas décadas
na luta antirracista foi agraciado com a Comenda de Mérito Defensorial José
Euclides Ferreira Gomes Júnior da Defensoria Pública do Estado do Ceará.
Valéria
Carvalho, uma das fundadoras do grupo, fez um discurso no qual destacou que
"o sentimento de orgulho
fundamenta-se na consciência dos esforços dos membros que ao longo dos últimos
22 anos tem pautado perenemente a ancestralidade negra e a luta antirracista
junto ao povo da nossa amada região do Cariri Cearense".
Ela,
entretanto, mencionou a desigualdade histórica que marca a história do país e
especialmente do Ceará. "Se hoje, com certeza, a maioria dos membros
da Defensoria Pública são pessoas brancas e de classe média enquanto a maioria
dos assistidos por esta instituição são negros e pardos tal fato indica um
contraste e desigualdade social que deve ser entendido como fruto de uma
construção histórica que estrutura e amarra nossas diferenças impedindo que
todos nós possamos fruir com todas as possibilidades todo o nosso potencial
humano."
Por
fim, fez um apelo. "O Ceará como
Terra da Luz deve retomar seu protagonismo dos tempos da luta abolicionista e
ser exemplo de medidas corajosas e ousadas para o enfrentamento deste mal que
contamina a alma de nossos compatriotas."
Abaixo o discurso completo:
BOM
DIA A TODAS, TODES E TODOS!
EXCELENTÍSSIMA
SENHORA GOVERNADORA DO ESTADO DO CEARÁ, PROFESSORA IZOLDA CELA
EXCELENTÍSSIMA
SENHORA DEFENSORA-PÚBLICA GERAL DO ESTADO DO CEARÁ, DRA. ELISABETH CHAGAS
EXCELENTÍSSIMO
SENHOR PRESIDENTE DA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO CEARÁ, DEPUTADO
EVANDRO LEITÃO
AUTORIDADES
EM NOME DAS QUAIS SAÚDO TODAS AS DEMAIS PESSOAS PRESENTES FISICAMENTE E
VIRTUALMENTE NESTA SOLENIDADE.
Falo
em nome do Grupo de Valorização Negra do Cariri – GRUNEC que nesta solenidade
recebe a Comenda do Mérito Defensorial José Euclides Ferreira Gomes Júnior da
Defensoria Pública do Estado do Ceará.
Para
nós o recebimento de tão honrosa distinção vem a calhar com um sentimento de
orgulho e resignação.
O
sentimento de orgulho fundamenta-se na consciência dos esforços de nossos
membros que ao longo dos últimos 22 anos tem pautado perenemente a
ancestralidade negra e a luta antirracista junto ao povo da nossa amada região
do Cariri Cearense.
Muitas
foram às lutas, dificuldades, enfrentamentos, desafios, medos.
Mas inesgotáveis foram os motivos que nos impeliram a continuar de pé firmes e fortes para alcançarmos conquistas, superações e continuarmos vigorosos em busca de dias melhores para nossa população afrodescendente.
O
sentimento de resignação tem por base a clareza que se a presente distinção não
vier acompanhada de ações concretas por parte da Instituição Defensoria Pública
do Estado do Ceará e demais instituições que aqui presente que nos ouvem, tal
distinção será mais um totem a empoeirar nas nossas estantes.
Nesta
oportunidade e muito respeitosamente exortamos a todas as autoridades presentes
à um compromisso real e diário para a superação do racismo no Brasil.
O
Ceará como Terra da Luz deve retomar seu protagonismo dos tempos da luta
abolicionista e ser exemplo de medidas corajosas e ousadas para o enfrentamento
deste mal que contamina a alma de nossos compatriotas.
O
racismo dá ensejo às violências de todas as naturezas destruindo o futuro de
nossa juventude negra, destruindo a dignidade de nossos homens, mulheres,
crianças, famílias e comunidades quilombolas.
Se
hoje, com certeza, a maioria dos membros da Defensoria Pública são pessoas
brancas e de classe média enquanto a maioria dos assistidos por esta
instituição são negros e pardos tal fato indica um contraste e desigualdade
social que deve ser entendido como fruto de uma construção histórica que
estrutura e amarra nossas diferenças impedindo que todos nós possamos fruir com
todas as possibilidades todo o nosso potencial humano.
Senhoras,
Senhores vivemos tempos sombrios.
Em
nível federal as conquistas históricas do povo negro têm sido assediadas por
grupo político racista e fascista reiteradamente pondo em risco todas as
políticas públicas que passaram a garantir um mínimo de dignidade e mobilidade
social para nossos grupos mais vulneráveis.
Neste
contexto, a instituição da Defensoria Pública deve ter por missão primordial,
final e real a garantia da dignidade humana dos menos favorecidos não só no
âmbito judicial, mas também no extrajudicial e quiçá no campo político no qual
com urgência precisamos engrossar as fileiras para garantia das conquistas
tanto do povo negro, quanto desta instituição.
Juntos
somos mais fortes e nos legitimamos a cumprirmos com louvor nossas missões.
Para
isso é necessário proximidade presencial, olho no olho, visitem nosso povo,
conheçam seu dia e não se isolem nos seus gabinetes e atendimentos virtuais.
Nesta
oportunidade, registramos o apoio da Dra. Elisabeth Chagas e equipe que em
vários momentos nos deu o apoio urgente, necessário e eficaz nas demandas que
surgiram. Razão pela qual todos os nossos membros são profundamente gratos e
felizes por tê-la de ombreada conosco em nossas lutas.
A
Senhora Defensora Pública Geral, pessoalmente, é referência de grande
relevância para o amparo da população vulnerável e seu exemplo pode guiar os
demais membros que por algum motivo ou outro careçam de norte para estabelecer
vínculo com seus grupos sociais assistidos.
Sem
mais agradecemos do fundo do nosso coração a Comenda concedida e exortamos mais
uma vez a nos aproximar para fortalecer nossa caminhada na construção de uma
pátria que de fato possa vir a ser chamada de mãe gentil.