Desmonte da cultura, pandemia e a falta de mobilização cultural


Por Nicolau Neto, editor

Quando alguém (esteja investido em cargos eletivos ou não) deseja suprimir o poder de organização, mobilização e de luta do povo, não pensa duas vezes em destruir duas áreas: Cultura e Educação.

O desmonte da cultura, a bem verdade, não começou com Bolsoanro (sem partido), mas está sendo aprofundada com ele. A extinção da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir) não ocorreu com Bolsonaro. No entanto, as consequências danosas à população negra estão sendo acentuadas no seu governo. Basta ver o que ocorre com a Fundação Palmares, onde o presidente nega constantemente a existência do racismo, o que contraria a História. Ele se posiciona contra todas as políticas públicas/ações afirmativas que visem promover uma reparação histórica, além de buscar construir uma sociedade com equidade.

De Michel Temer que assumiu a presidência a partir de um golpe jurídico-parlamentar-midiático a Jair Bolsonaro, a escalada de perca de direitos, principalmente da população mais vulnerável - negros, mulheres (negras sobretudo), lgbts, indígenas -, só tem crescido. A violência física e psicológica tem aparecido com mais frequência e aqueles/as que as praticam fazem questão de demonstrá-la.

O Brasil dos últimos quatro anos piorou consideravelmente, pois quem mais deveria dar exemplo na criação de políticas públicas para a construção da equidade, faz justamente o contrário. Viram-se representados/as nele. E, portanto, se o representante do executivo federal e seus ministros praticam, eles também podem. Essa é a música que vem sendo tocada no Brasil, principalmente a partir de 2018.

A intenção do governo federal é acabar com a participação social e com o poder de organização e mobilização social e para isso tenta destruir tudo que contribui para a análise crítica da sociedade, para o fortalecimento da identidade e da liberdade. Foi assim com a extinção do Ministério da Cultura (MinC) em 2016 e agora rebaixado a condição de secretaria especial. Mas só rebaixar não é o suficiente, é preciso também proibir filmes e demais formas de manifestações artísticas que promovam discussões sobre homofobia, racismo e machismo, por exemplo.

Eu sempre gosto de afirmar que a cultura é símbolo do processo de redemocratização do país, pois ganhou status de ministério em 1985.

A aversão desse governo a população negra salta aos olhos. Nenhum negro ou negra para os ministérios. Ao contrário, em vez de diversidade, militarizou os cargos. Mas só a falta de representatividade não basta, é preciso de igual modo, alimentar ainda mais o preconceito, a discriminação e o racismo. Quem não se lembra de quando em 2017 durante uma palestra no Clube Hebraica no Rio de Janeiro, Bolsonaro proferiu a frase “fui num quilombo. O afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Nem para procriador ele serve mais”, ou “que seus filhos não ’correm risco’ de namorar negras ou virar gays porque foram ‘muito bem educados’’”, ainda em 2020 e já no cargo de presidente quando disse que um deputado negro por demorar a nascer “deu uma queimadinha”?

O que elenquei aqui é apenas uma parte da política da segregação, mas o pouco citado só vem a reforçar a política elitista, racista, machista e de desmonte cultural desse governo

Portanto, quem destrói a cultura acaba de certa forma, matando os focos de resistências, de luta e de poder de organização popular. O que deveria ser o contrário, porque a cultura é um dos principais laços do fortalecimento da identidade, seja ela individual ou coletiva. Mas certamente não está sendo válida para algumas entidades culturais. É possível perceber a omissão de grande parte delas, que em nenhum momento teceu crítica a essa barbárie que o país passa. Há um silêncio estarrecedor em muitas delas.

Algumas ações individuais e pontuais vêm acontecendo no sentido de se contrapor a essa política de aversão à cultura, mas não são suficientes.

A pandemia não é a culpada pela desmobilização, uma vez que o desmonte da cultura começou em 2016.

Que os movimentos negros, indígenas, LGBT e de mulheres não se deixem contaminar por esse doentio silêncio. Que as demais instituições culturais possam acordar desse sono profundo para que a resistência continue sendo aflorada.

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