Capital da cultura, um discurso que não convém


Alexandre Lucas.
(FOTO/ Reprodução/Facebook).
Por Alexandre Lucas*

A segregação da cultura é fruto de uma sociedade dividida em classes sociais distintas, antagônicas e em permanecente luta e ao mesmo tempo é resultado das relações históricas e sociais. A cultura só existe a partir da vida humana, no processo de produção e reprodução da própria existência humana.

A cultura distante de  ser estática, paralisada no tempo e no espaço, é hibrida e dialética, carrega os traços do passado e do presente e ensaia os passos do futuro. Antes que tudo, a cultura tem lados e narrativas diversas, carrega conflitos e divisões. É posta ideologicamente como neutra, saudável, harmoniosa e democrática com o intento de esconder a luta de classes e a separação dos corpos a partir apropriação do capital.

A cultura é reprodutora de interesses ideológicos, hegemonicamente os interesses das elites econômicas que, por conseguinte dominam politicamente o estado e os meios de produção. 

A cultura enquanto produto histórico e social refletirá inegavelmente a distinção das classes sociais na produção, circulação, fruição e apropriação do simbólico, da produção cientifica, dos bens materiais e dos deslocamentos corpóreos, portanto, a reflexão sobre cultura só é possível a partir do seu contexto e dos conflitos da vida humana, num determinado tempo e espaço.  A cultura por si só não se explica.

É impossível falar de uma cultura universal e homogênea, enquanto, a propriedade privada for sustentáculo da desigualdade social e da divisão das relações de poder.   

Neste bojo, o discurso da contemplação da cultura continua sendo construído como forma de fortalecer uma elitização da produção simbólica e esconder as teias, vozes, olhares e a participação das margens sociais.

A contemplação da cultura elege a exclusão como modus operandi. Impera o discurso dos com e sem cultura que serve como vitrine de desigualdade na acessibilidade da produção humana.  

Esse caráter contemplativo e elitizado perpassar os espaços de poder, mas também transita no seio da intelectualidade que insiste na defesa de uma cultura para o prazer de seus pares e a continuidade dos nichos privilegiados. 

Se a cultura é segregada, a partir da lógica do capital, a sua contemplação é um atestado de consentimento das relações de opressão e exploração. O direito à cultura é indissolúvel da luta pela democratização da produção humana. Advogar em defesa de uma cultura universal é se contrapor a contradição entre capitais da cultura visão marcadamente colonizadora, diante das supostas periferias e interiores que abrigam os despossuídos do capital e dos processos de decodificação da sociedade.

A universalização e estratificação da cultura estão em lados opostos e antagonicamente em disputa. Para universalizar é preciso democratizar para além do simbólico, já para estratificar basta continuar contemplando os guetos e desprezando a hegemônica exclusão econômica e social.

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Alexandre Lucas é pedagogo e artista/educador.

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