Rodrigo França lança ‘O Pequeno Príncipe Preto’ e mostra que todo o menino é um rei


Rodrigo França é autor de 'O Pequeno Príncipe Preto'. (FOTO/ Reprodução/ Hypeness).

Rodrigo França está de livro novo na praça. Depois de fazer sucesso no teatro com os espetáculos ‘Contos Negreiros do Brasil’ – com mais de 60 mil espectadores em três anos – e dirigir ‘Oboró, masculinidades negras’, o ator, roteirista e diretor chega às livrarias com outra adaptação dos palcos: ‘O Pequeno Príncipe Preto’.

A publicação emerge em um momento frutífero para a escrita de pessoas negras, sobretudo de homens que rompem com os ciclos de violências provocados pelo racismo e se abrem para a doçura e sensibilidade dos contos. Em entrevista ao Hypeness, Rodrigo França revela que embora o livro tenha se baseado na peça homônima em cartaz por quase dois anos, existem algumas mudanças.

Escrevi o livro a partir do texto do espetáculo, acrescentando algumas cenas e modificando a estrutura textual. O espetáculo ficou em cartaz ao longo de quase dois anos, com 60 mil espectadores. Então, foi um bom tempo para descobrir o que poderia funcionar no livro”.

O espetáculo é concebido por Rodrigo, que assina o texto e a direção. Em cena, Junior Dantas, da Cia. OmondÉ, dá vida para um príncipe que percorre os planetas para disseminar a mensagem do amor. A peça pretende apresentar a diversidade e riqueza que constituem a cultura negra brasileira.

Existem cenas a mais, para que tenha um frescor para quem irá ler e assistiu o espetáculo. Modifiquei a forma que é contada, mas sem perder a essência. A da virada de página é uma emoção deliciosa de sentir. Preparem o lenço”, conta Rodrigo.

Todo o menino é um rei

O livro é resultado do sucesso no teatro, mas não só isso. Em um momento de reafirmação ou reescrita do que significa ser preto no Brasil, falar para novas gerações, principalmente crianças, se torna fundamental para o cultivo de um futuro melhor. Rodrigo ressalta a realeza de uma criança para determinadas culturas africanas e como esse costume pode ser aplicado no Brasil por meio da literatura.

Precisamos fortalecer a ideia que nós negros e negras somos descendentes de reis e rainhas. Para o Brasil vieram do continente africano alguns dos melhores engenheiros, arquitetos, professores, agricultores, matemáticos, médicos. Existe uma história pré-Brasil e pré-África colonizada. Não fomos escravos e, sim escravizados. Faz uma grande diferença. Essa condição foi imposta, não se realizou de forma natural. Uma criança para cultura Yorubá é uma majestade com tamanha relevância. Não se constrói uma nação sem pensar no futuro”, diz Rodrigo que viveu Martin Luther King na peça ‘O Encontro’, que retrata uma conversa do norte-americano com Malcolm-X.

O trabalho do artista que se diz membro de uma “família aforcentrada” se junta ao de outras personalidades como o rapper Emicida, autor de ‘Amoras’, que passa a mensagem do amor próprio.

São artistas que entendem que precisam fazer algo às próximas gerações. Não foi fácil e não é fácil, então que seja leve para os próximos e próximas que virão. Então, pensamos o que não tivemos na nossa infância e queremos facilitar. Não dá para fugir que Monteiro Lobato era eugenista com contatos com a Ku Klux Klan. É impossível que esses valores não estejam em suas obras e, estão. Muitos de nós negros escrevem, mas não conseguem publicar seus livros. Nós que temos visibilidade temos que abrir caminho. Não estamos inventando a roda, mas ajudando que ela continue a girar. Um livro pode mudar a vida de quem ler, sendo assim, o mundo muda um pouco.  

Minha ideologia, minha religião’

Gilberto Gil, ainda na década de 1980, já cantava que sua ideologia estava em constante mutação. Talvez o artista baiano estivesse imerso em mais um daqueles movimentos de compreensão do futuro, tão característicos de sua obra.

Os tempos são ameaçadores e exemplos não faltam. Sérgio Camargo, homem negro nomeado presidente da Fundação Palmares, retrata perfeitamente como um grupo dito ‘sem ideologia’ se apossa de pensamentos racistas e excludentes para colocar seus planos de domínio em prática.

Portanto, é preciso estar atento e forte, afinal um negro que culpa os próprios negros pelo racismo deve ser considerado uma ameaça. Daí a relevância do trabalho de Rodrigo, que faz questão de se posicionar.

Não existe, de forma alguma, uma arte nula de ideias. Ver a plateia lotada, com 95% de espectadores negros e negras, faz com que eu tenha certeza que estamos no caminho certo. Porque infelizmente não é a regra nos demais espetáculos. A arte que eu faço é um espelho para maioria da população brasileira, fugindo de uma narrativa hegemônica e que nos coloque de maneira subserviente. Ainda se acredita no mito da democracia racial no Brasil. É um país racista, então eu vou denunciar com a minha função artística. Provocar reflexões para que possamos abrir os olhos.”

A arte, mais uma vez, mostra que é muito mais potente do que os movimentos que insistem em retroceder e impedir avanços – principalmente os que buscam a equidade.

Para mim a arte tem essa responsabilidade, mesmo que seja somente para entreter. Estamos vivos, sendo artistas ou não, para fazer história… Construir narrativas que modifiquem o mundo para melhor ou para pior. Então, eu penso naquilo que pode contribuir para os meus, com sentimento de povo. O teatro que faço, o livro que escrevo ou o roteiro que penso são ferramentas de criticidade”.
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Com informações do Hypeness.


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