Faxineira que lutou contra pobreza e racismo fará palestra em universidade de Nova York


Aline Parreira fará palestra na Cuny University. (Foto: Divulgação/ Reprodução/ Extra).

Nascida no sertão mineiro, Alline Parreira foi adotada ilegalmente quando ainda estava na barriga da mãe. Negra e pobre, passou pelo seio de duas famílias adotivas e aprendeu cedo a lutar contra o racismo e a driblar as adversidades da vida. Para se sustentar, ela já catou latinhas, vendeu cigarros e fabricou doces. Há dois anos, decidiu ir morar em Nova York, onde trabalha como faxineira. Hoje, aos 27 anos, Alline se prepara para escrever um novo capítulo em sua história de superação. Ela, que nunca cursou uma faculdade, contará sua trajetória no auditório da CUNY University, a Universidade da Cidade de Nova York.

O evento acontecerá na próxima sexta-feira e será transmitido pela internet. O convite partiu do Coletivo Brado NYC, grupo que se define na internet como um "comitê pela defesa da democracia". A jovem mineira hesitou diante da ousada proposta, mas venceu o medo e decidiu aceitar o desafio. De acordo com ela, o objetivo principal da palestra será narrar o caminho percorrido em sua busca pela construção identitária.

— A vida foi a minha universidade. Sem curso superior, sem nada, eu adquiri todas essas informações, aprendo e pesquiso muito. Minha construção identitária é baseada no que aprendi lendo os autores acadêmicos Angela Davis e Frantz Fanon — diz ela, sem esconder o orgulho de chegar onde chegou: — Para nós, mulheres negras, não foi permitido narrar nossas histórias em primeira pessoa. Eu quebro esse paradigma, eu que conto minha história, para mim é muito importante.

Alline é natural de Manga, um município com cerca de 20 mil habitantes localizado próximo à divisa com a Bahia. Ao nascer, foi entregue por sua mãe biológica aos cuidados de uma mulher que a abandonou três meses depois. Foi adotada, então, por uma senhora de 65 anos, cuja família tinha pouca estrutura financeira.

— Quando se fala de uma criança negra adotada por uma família branca, logo se imagina que a família seja rica, mas a minha era muito pobre. Não tínhamos luz elétrica, cozinhávamos em fogão a lenha, por falta de gás — conta ela.

Aos 4 anos, ao ver crianças usando uniforme escolar, Alline pediu à mãe adotiva que a matriculasse numa escola. Como não havia vagas na rede pública, a idosa juntou as economias e pagou a primeira mensalidade em uma instituição privada. A partir do segundo mês, Alline foi contemplada com uma bolsa de estudos integral e seguiu no mesmo colégio por onze anos. Como a escola só oferecia estudos até a 1ª série do ensino médio, Alline cumpriu o resto dos estudos em um colégio estadual.

Após concluir o ensino médio, a jovem decidiu estudar para concurso público. Sua primeira tentativa foi para um concurso de gari da prefeitura de Juvenília, localizada a 70 quilômetros de sua cidade natal. Passou em primeiro lugar, mas no dia em que ia ocupar o posto o resultado concurso foi contestado na Justiça.

— Eu achava que o único lugar que podia ocupar era esse. Ser gari, faxineira. Não via representatividade de outros negros. Quando eu dizia que queria entrar para a universidade, as pessoas diziam que eu não podia. Então consegui passar no concurso, mas no dia em que ia tomar posse começou uma ação na Justiça. Se não fosse isso, eu provavelmente estaria até hoje varrendo o chão de Juvenília — diz ela.

Confiante após a primeira aprovação, Alline viajou para Brasília com o objetivo de prestar novos concursos. Trabalhou por três meses como babá e conseguiu passar em um novo processo seletivo da Polícia Militar do Distrito Federal. A partir daí começou a conciliar o trabalho com viagens e cursos técnicos de diversas áreas, desde hotelaria até sommelier.

Em 2014, enquanto passava uma temporada na cidade de Paraty, Alline desenvolveu um trabalho de confeitaria no qual fazia doces com os nomes de escritores e brincava com as poesias escritas por eles através do paladar. Uma de suas criações foi o doce Drummond, feito com sete especiarias e flambado no conhaque, que foi inspirado no "Poema de sete faces". O trabalho chamou a atenção de um morador de Moçambique que passava pelo local. Ele sugeriu que Alline se inscrevesse em um edital do governo federal para levar o projeto ao país africano. Assim viajou para a África, onde ela diz ter finalmente se conectado com suas raízes.

— Quando relato minha trajetória, as pessoas se surpreendem: Fui adotada de forma ilegal, cresci em uma família branca e extremamente pobre, completamente disfuncional. Vivi muitas opressões tanto da minha família adotiva, quanto na escola. Ninguém nunca esperou nada de bom de mim — diz ela, que espera servir de inspiração para outras histórias de superação como a dela. (Com informações do Extra).

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