Desde
janeiro de 2003 foi sancionada no Brasil a lei 10.639/03, que torna obrigatória
a inserção, no currículo escolar nacional, conteúdos sobre a história e a
cultura Afro-Brasileira e da África — antes da colonização pirataria européia.
Uma
importante conquista para a educação de um país formado através da depredação e
do silenciamento de tudo e todos que contrariassem a supremacia europóide. No
entanto, infelizmente, mesmo após 12 anos de sua criação, a lei ainda não
vingou — essa e a 11.645/08, que inclui a temática indígena desde 2008. Não são
poucos os educadores que encontram desculpas para permanecerem na ilegalidade,
e é pensando nestes exemplares profissionais que elaborei esta lista.
SUBALTERNIDADE AFRICANA
Em
biologia ensina-se que o berço da humanidade é a África, porém nas Ciências
Sociais, geralmente, pula-se do paleolítico para Grécia Antiga num piscar de
olhos. Parece até que os filósofos gregos não se educavam no Egito (Kemet) — ou
que as civilizações europeias clássicas não tinham A Terra dos Pretos como um
norte. Em outras palavras: a história e a cultura africanas não começaram
quando europeus decidiram escravizar a população negra e saquear suas terras,
recursos e patrimônios. A história das pessoas negras não começou com a
escravidão e vai além das dinastias faraônicas mencionadas, aqui,
passageiramente.
A CRUELDADE DA COLONIZAÇÃO PORTUGUESA
PERMANECE NA LÍNGUA
Embora
respeitados linguistas brasileiros defendam que o português brasileiro
apresenta forte influência do banto, o caráter crioulo da nossa língua —
chamada inclsuive de Pretoguês — continua sendo invisibilizado em reverência ao
maior vínculo herdado do colonizador. A língua portuguesa tida correta
permanece a mesma imposta aos negros da terra e africanos subjugados no “Novo
Continente”. E, ainda hoje, se você é uma criança negra ou indígena com
pretensão de se tornar uma pessoa adulta respeitável, o mais apropriado a fazer
é aprendê-la branquissimamentebem. Apesar dos perversos métodos para reprimir
as diversas línguas-mãe, João do Rio registrou a existência de falantes de uma
língua yorubanto no Rio de Janeiro do início do século XX, comunidades
indígenas ainda preservam o que ainda é tratado com descaso pelas autoridades e
a estrutura da nossa língua portuguesa é fortemente influenciada por isso.
CULTURA GERAL LIMITADA
Toda
contribuição à cultura brasileira vinda dos colonos europeus e asiáticos são
demarcadas na nossa cultura: tradições portuguesas, anglicismos, arquitetura
espanhola, pratos da nonna, urbanização francesa, pastel chinês, Oktoberfest,
“método japonês” etc. Porém o mesmo não acontece com todas as contribuições
negras. A feijoada, o candomblé, o samba, a capoeira, o maculelê, o acarajé e
tantos outros foram frutos apropriados pelo “patrimônio brasileiro”. Isto é, a
pedra continua portuguesa, mas o afoxé cantando em iorubá tem patente brazuka.
Estes elementos culturais, apesar de terem nascido em comunidades negras, foram
adotadas usurpadas pela nação. Não por mera vilania, mas também porque sem os
africanos e indígenas, a cultura brasileira não passaria de uma xerox vira-lata
da cultura colonizadora, que ainda nos faz perceber tudo o que descende de
africanos não-brasileiros como primitivo ou exótico.
GEOGRAFIA DEPAUPERADA
Para
boa parte dos vestibulandos de hoje é mais fácil traçar uma linha do tempo
remontando todos os fluxos de imigração européia e asiática que chegaram ao
Brasil do que mencionar três das etnias africanas traficadas pra cá e fazer
distinções entre elas tal qual é possível fazer das etnias-nações europeias. Os
conhecimentos gerais sobre a conjectura política-cultura européia também são
muito mais esmiuçados do que a do continente donde descendem metade da
população tupiniquim. Não é incomum pautar a geografia africana somente para
apontar seus vastos recursos naturais sem qualquer associação entre a
exploração caucasiana disso com todos os conflitos e mazelas que os mesmos
cultivam por lá.
REPRESENTATIVIDADE INSIGNIFICANTE
Pessoas
negras louváveis são sempre exceção. Mártires ou massa anônima. Grandes nomes
de um passado já ultrapassado, enquanto que pessoas negras que deram errado
estão em qualquer noticiário ou estatísticas de miséria e violência. Como
esperar que crianças construam uma imagem positiva de si mesmas quando nas
escolas os próprios educadores, que se consideram pessoas cultas, beberam
apenas da fonte hegemônica de conhecimento? Quando a maioria das pessoas com
conhecimento a transmitir são brancas e as pessoas negras servem mais para
guardar os portões, zelar pela segurança e pela limpeza dos alunos e da escola?
Como podemos fortalecer nossas crianças quando a História nos conta que todos
os negros que se revoltaram contra a opressão racista foram exemplarmente
assassinados. Até mesmo aquele que pregava a manifestação pacífica, vestia
terno, fala polidamente e cultuava o mesmo Deus europeu do opressor?
Enfim,
poderia me delongar aqui e explicar mais razões pelas quais é necessário
ampliarmos os nossos referenciais de sucesso, gênero, sexualidade, civilização,
sociedade para além da ótica positivista dos europeus, mas o fato de, talvez,
você não saber a que me refiro exatamente ilustra bem a falta que essas
perspectivas fazem no ilustramento de qualquer pessoa. Traduz perfeitamente o
tipo de deficiência que provoca a folclorização dos africanos e indígenas
brasileiros. Então, caso você tenha alguma criança próxima em idade escolar,
exija a coordenação pedagógica que cumpra com a legislação vigente para que um
dia a nossa educação possa ser tão plural e acolhedora como pretendemos ser
como nação.
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