A
diferença de tratamento entre presidiários ricos e pobres não é o único
problema do sistema carcerário brasileiro.
Os contrastes também se estendem a suas famílias, que herdam deles o tom
com que serão tratadas. Embora tenha sido proibida em alguns estados do país, a
revista íntima, também conhecida como “vexatória”, continua a ser uma prática
comum na maioria dos presídios nacionais – exceto para mulheres e familiares de
poderosos, como os empreiteiros presos pela Operação Lava Jato.
São
inúmeros os relatos de humilhação a que as visitantes são submetidas. Elas têm
que se despir, independentemente de sua idade, além de serem obrigadas a ficar
de cócoras e tossir. Os agentes também inspecionam suas genitálias, alegando
motivos de segurança. Na teoria, o objetivo é prevenir que celulares, drogas e
armas sejam transportados para dentro das cadeias. Na prática, funciona como
mais uma instância de discriminação entre o cidadão comum e aquele com poder
suficiente para burlar o sistema.
Não
há registros, por exemplo, de que mulheres de empresários presos pela Operação
Lava Jato tenham passado pela revista vexatória durante suas visitas. Quando
oito dos empreiteiros envolvidos no esquema foram transferidos para o Complexo
Médico-Penal do Paraná, em julho deste ano, muito se falou sobre o assunto. A
notícia era que, ao contrário do que acontecia na carceragem da Polícia Federal
(PF) em Curitiba, familiares de nomes como Marcelo Odebrecht, presidente da
Odebrecht, e Otávio Marques de Azevedo, presidente da Andrade Gutierrez, seriam
submetidos à prática caso quisessem visitá-los.
Deste
então, nada foi dito a esse respeito, apenas rumores de que as visitas a
Marcelo Odebrecht são reservadas, dando lugar inclusive a abraços de sua
mulher, Isabela, e de sua irmã, Mônica, que é também advogada da construtora.
Presos e seus familiares costumam se encontram em parlatórios ou locais
destinados a esse fim, na sua maioria separados por um vidro.
Em
contrapartida, os registros de cidadãs comuns sobre os desrespeitos e
humilhações sofridos parecem não ter fim. Uma moradora da Rocinha conversou com
o JB sobre o assunto e, por segurança, preferiu não se identificar. Ela relatou
em detalhes sua rotina de visitas ao marido, preso em função de assalto. “Eles
abrem a comida, remexem a comida toda. Eu estava com uma gravidez de alto risco
e tinha que sentar em um banquinho que passa radiação. Mesmo com laudo médico,
eles não queriam saber”, contou.
A
experiência, de acordo com ela, é de pura humilhação. “Além de tirar toda a
roupa na frente de todos, ainda mandam abaixar de perna aberta de frente, de
lado e de costas, sacudir cabelo, abrir a boca. É uma bolsa por pessoa, a comida
é limitada – tem que caber dentro deste saco de mercado a comida, a água, o
refrigerante e as coisas de higiene para ele. Quando conseguia entrar, já
estava quase na hora de vir embora. A visita particular tinha que ser paga. O
banheiro é grudado no chão. Pra ir ao banheiro tinha que fica de ‘coque’
(cócoras)”, lembrou.
A
diferença no tratamento também não se limita às visitas carcerárias. Para citar
um exemplo atual, o envolvimento de Cláudia Cordeiro Cruz nas supostas contas
não declaradas de seu marido – o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo
Cunha (PMDB-RJ) – inundam o noticiário. Extratos bancários mostram um
significativo aumento de saldo nunca declarado à Receita Federal. Mesmo assim,
ela não sofreu qualquer represália por parte da Justiça.
Já
a mulher do ajudante de pedreiro Amarildo de Souza, desaparecido em 2013, não
recebeu o mesmo tratamento. O delegado responsável pelo caso chegou a emitir um
pedido de prisão temporária para Elizabete Gomes da Silva, alegando que ela
estava envolvida com o tráfico. Por falta de provas, o relatório foi
desconsiderado pelo delegado titular da 15ª DP, Orlando Zaccone. Com medo da
polícia, à época Elizabete afirmou que se tratava de uma forma de “sair do
foco” das investigações para tentar envolvê-la.
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