Identidade.
Dentre tantas palavras que eu poderia escolher pra descrever meu processo de
autoaceitação, essa é a que mais me representa. Como toda menina negra a
rejeição e o racismo sempre foram presentes na minha vida com início na fase
pré-escola, sempre procurei me encaixar.
Mas
nunca passei da menina do cabelo duro. Por anos acreditei nisso, nessa
inferioridade que é imposta na vida de crianças negras, e fazia de tudo pra
“compensar” isso, sendo extremamente legal e disponível pra todos. A maioria
das pessoas agem que como se tudo fosse normal, porque é um problema enraizado
em nossa sociedade, que destrói a autoestima de qualquer menina. Lembro de
entrar em lojas de brinquedos e incansavelmente procurar por bonecas que se
parecessem comigo,o que sempre falhava porque até hoje as prateleiras estão
lotadas de barbies loiras, de olhos claros seguindo o padrão eurocêntrico.
Minha adolescência foi marcada de alisamentos, relaxantes e muito
embranquecimento, sempre fui o cupido da história, aquela que arranjava os
namoros, nunca a protagonista do romance. Com tempo e minha insatisfação com
processos químicos passei a me incomodar com minha imagem no espelho, mas não
sabia como mudar essa realidade, me vi perdida e sozinha. Daí começaram as
buscas na internet por meninas que também estavam passando por essa transição,
demorou um pouco, mas encontrei pessoas maravilhosas que me ajudaram muito
nesse processo. Me entender como negra, e como uma mulher bonita foi doloroso,
e continua sendo, estar na contramão de tudo que lhe dizem, da mídia e das
pessoas que te apontam, é como matar um leão por dia.
Depois
de passar pelo bigchop (grande corte pra remover toda parte com química do
cabelo) tudo mudou, finalmente me deparei comigo, com minha real imagem,
despida de toda máscara, ufa, lágrimas caiam enquanto cortava eu mesma, aquela
parte morta que me fez escrava por tanto anos.
Depois
desse dia minha vida não tornou um mar de rosas, nem passei a ser vista como a
mulher ideal para relacionamentos, empregos, continuo sendo rejeitada e
invisível e a mídia me oferece como referência a globeleza, a mulata tipo
exportação.
Agora
a luta já não é comigo mesma, e sim contra o mundo que não vai deixar de ser
racista e machista, mas nem por isso deixarei de resistir e gritar para que
todos ouçam minha voz. Meu cabelo segue sendo cultivado todos os dias com muito
afeto, cada vez mais armado com certeza, e agora sei quem sou e me orgulho
disso, mulher negra do cabelo crespo.
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