O ato de votar


Com a aproximação das eleições, marcada para outubro deste ano, não sei se você tem dedicado um tempinho para pensar sobre o funcionamento do mundo político partidário e no seu jogo de expressões aos quais ganham notoriedade - o “governo democrático” e “governo do povo”.

Esse mundo onde nós, muitas vezes, nos afastamos das discussões e não estamos habituados a usar as palavras no seu sentido real e imediato. O que é, diga-se de passagem, uma lástima, pois ao fazermos isso esquecemos da nossa função e do poder que está em nossas mãos – literalmente falando.

Nesse cenário, o que mais chama atenção é o ato de depositar em alguém confiança e respeito através do voto. Só se pode falar em voto em um regime democrático e aqui a escolha é pessoal e intransferível, ao menos deveria ser. O ato de votar representa, em outras palavras, o ato de fazer o governo como já nos alertava a escritora cearense Rachel de Queiroz nos anos 40 do século passado. Pensar assim faz com que nos valorizemos, reconhecendo que somos nós que colocamos alguém para exercer função de vereador (a), prefeito (a), deputado (a), senador (a) e presidente (a) e que só cabe a gente decidir pela sua permanência ou não. Agir assim faz com que enxerguemos que o nosso poder não termina com o resultado das eleições, ao contrário ele aumenta.

Precisamos fazer valer a tão pregada expressão daqueles que estão temporariamente exercendo cargo político, a saber, “governo do povo”. Necessitamos tomar as rédeas da situação. Afinal de contas é a gente que coloca eles lá. Lá na Câmara municipal, lá na prefeitura, lá na assembleia legislativa, lá no palácio da abolição, lá na câmara federal, lá no congresso nacional e lá no palácio do planalto. É necessário que acompanhemos seus passos, suas gestões e, não só acompanhemos, mas devemos cobrar para que exerça com dignidade, com respeito, ética e zelo pelo povo uma administração. Que governe de fato com o povo. Acolhendo sugestões e ideias.

É importante que saibamos que o voto não é para satisfazer um amigo, tão pouco para se aventurar em falsas ilusões de combater inimigos. Não. Definitivamente não é para essa finalidade. Voto, meus caros, não é para louvar um “chefe”. Não é sinônimo - nem de longe de obediência. Não se vota para satisfazer desejos de famílias. Não se vota por simpatia, por carismas.

Vota-se em alguém que tem planos, que tem ideias e projetos sociais que vão de encontro com os menos favorecidos. Por isso é tão importante você acompanhar as ações de quem já exerce ou exerceu algum cargo político. Por isso é muito importante investigar a vida de quem quer entrar nesse ambiente.

Pelo voto nós vamos escolher aqueles e aquelas que vão nos cobrar e determinar quanto devemos dar de impostos, na grande maioria das vezes usados de forma errada. Votamos em quem vai fazer funcionar nosso dinheiro. São eles que vão nomear e demitir funcionários. Votamos em quem vai montar secretariado que pode ser racista, machista e homofóbicos. Fiquemos atentos. Aliás, você já reparou quantos negros e negras tem na câmara municipal? Quantos negros são secretários? Há alguma negra sendo secretária? Tem algum negro ou negra, gay ou lésbica atuando na função de diretor de escola?

Quando eles estão no poder podem nos arrastar para a miséria ou realizar uma boa administração. Vai depender da nossa escolha e da nossa vigilância.

Imagem puramente ilustrativa.

Personalidades Negras que Mudaram o Mundo: Aqualtune



Princesa- guerreira, um dos maiores símbolos de resistência  e luta pela liberdade negra, mãe de um dos maiores líderes pela luta da liberdade negra, e avó  de talvez o maior dos líderes da luta contra a escravidão. Ou se você quiser resumir, simplesmente Aqualtune.

Publicado originalmente no Blogueiras Negras

Não consegui saber de fatos sobre a infância da princesa. Seu rastro histórico começa no ano de 1665, quando, segundo a história, liderou cerca de 10 mil guerreiros congoleses, no que ficou conhecido como “ a Batalha de  Mbwila”, quando a sua tribo foi atacada por outra de nome “Wachagas”- há quem diga que o conflito foi provocado pelos portugueses, interessados em cativos para o comércio de escravos. O fato, é que a tribo de Aqualtune perdeu o combate, e a cabeça o pai dela, o rei de Mani-Kongo, foi cortada e exibida em uma igreja, enquanto a sua filha, foi presa com seus companheiros e vendida como escrava.

Então, teria sido enviada em um navio negreiro para o forte de Elmina, em Gana, onde teria sido “batizada” por um bispo católico e, como prova de seu batismo, foi marcada uma flor com ferro quente em cima do seu seio esquerdo. Daí, completou a travessia no navio negreiro para o Brasil, onde desembarcou em  Recife. Alguns dizem que ela já teria embarcado grávida, e teria sido estuprada diversas vezes por outro escravo, pois, forte e saudável, foi escolhida para ser vendida como escrava reprodutora. Conta que em desespero, ao embarcar em  Recife, teria tentado correr para o mar- provavelmente uma tentativa desesperada de voltar para a sua terra natal.

Porém, nossa guerreira se encontrava em um estado de letargia profundo. Provavelmente, depressão- e quem não compreenderia?  Já em Recife, foi  vendida para uma fazenda especializada em gado e o dono da fazenda, ao saber da sua origem, e que Aqualtune ainda era venerada por alguns escravos devido a sua origem, a entregou para os seus piores homens em sua fazenda.

E a letargia em nossa heroína continuava. Até que,  na altura do sexto mês de gravidez, ela sentiu  seu bebê se mexer e “ seu sangue se mexeu junto”.

Então, ela ouviu falar  em um chamado “ Reino dos Palmares”. Desde o primeiro momento da escravidão no Brasil, que vários negros criaram centros de resistência fugindo para o interior. Mais ou menos em 1606, um grupo de escravos conseguiu se estabelecer nas montanhas de Pernambuco, e ali conseguiram  estabelecer um “mocambo” , na região conhecida como Palmares.

Então, surgiu em Aqualtune  a vontade de fugir e se juntar ao povo de Palmares. Se juntou a um grupo de escravos para se insurgir e destruir a casa grande. Conseguiu e, no meio de sua fuga, mais escravos foram se somando ao grupo ao longo do caminho. Conta-se que chegaram com ela cerca de 200 escravos ao Reino de Palmares. Então, alguns contam que  sua origem real teria sido reconhecida, mas o fato é que ela se tornou o líder do Reino dos Palmares. E dentro do chamado reino dos Palmares, ela teria fundado o chamado “ Quilombo dos Palmares”. Ali, Aqualtune deu a luz a dois filhos, ambos guerreiros que também entraram para a história: Ganga Zumba e Ganga Zona, conhecidos pela sua coragem e liderança. Também teve uma filha, de nome Sabina, que teve mais tarde, um menino chamado Zumbi, que mais tarde ficaria conhecido como “Zumbi dos Palmares”, e seria  reconhecido como um dos maiores líderes negros da história.

O final da vida de Aqualtune é controverso. Alguns dizem que uma das várias expedições enviadas pelo governo português e donos de fazenda, teriam queimado a vila onde ela vivia junto com outros idosos da comunidade. Outros alegam que ela teria conseguido fugir. Outros ainda afirmam que ela simplesmente morreu de doenças da velhice. O fato, é que há uma lenda que os deuses da África teriam tornado nossa guerreira imortal, um espírito ancestral que conduziu seus guerreiros até a queda definitiva do quilombo dos palmares em 1694. Dizem que até hoje ela é lembrada em Pernambuco, e a princesa, cantada na música Zumbi, de Jorge Bem Jor, seria uma referência à Aqualtune.



Aqualtune - um dos maiores símbolos de resistência e luta pela liberdade negra. 

Milton Santos: Como é ser negro no Brasil*



O professor Florestan Fernandes e o professor Otavio Ianni, escreveram ambos que os Brasileiros, de um modo geral, não têm vergonha de ser racista, mas têm vergonha de se dizer que são racistas.
Publicado originalmente no Café Com Sociologia

Eu tive a sorte de ser negro em pelo menos quatro continentes e em cada um desses é diferente ser negro e; é diferente ser negro no Brasil. Evidente que a história de cada um de nós tem uma papel haver com a maneira como cada um de nós agimos como indivíduo, mas a maneira como a sociedade se organiza que dá as condições objetivas para que a situação possa ser tratada analiticamente permitindo o consequente, um posterior tratamento político. Porque a política para ser eficaz depende de uma atividade acadêmica... acadêmica eficaz! A política funciona assim! A questão negra não escapa a essa condição. Ela é complicada porque os negros sempre foram tratados de forma muito ambígua . Essa ambiguidade com que essa questão foi sempre tratada é o fato de que o brasileiro tem enorme dificuldade de exprimir o que ele realmente pensa da questão.

O professor Florestan Fernandes e o professor Otavio Ianni, escreveram ambos que os Brasileiros, de um modo geral, não têm vergonha de ser racista, mas têm vergonha de se dizer que são racistas. E acho que isso é algo permanente das relações inter-étnicas no Brasil e que traz uma dificuldade de aproximação da questão e da análise, inclusive dos próprios negros, que podem se deixar possuir por uma forma de reação puramente emocional diante da questão, dentro do problema, quando é necessário buscar, analisar, a condição do negro dentro da formação social brasileira. Porque a política não se faz no mundo, não é no mundo que dita as regras da política que se faz em cada país. E não é o outro continente. Não é o olhar para a África que vai ajudar na produção de uma política brasileira para o negro, nem um olhar para os Estados Unidos que vai também permitir essa produção de uma política. É o estudo do negro dentro da sociedade brasileira. É evidente que esse estudo passa pela categoria que se chama “formação socioeconômica”, a qual eu modifiquei propondo a categoria de “formação socioespacial”, porque eu creio que o território tem um papel muito grande na compreensão do que é uma nação.

A formação socioeconômica ela tem relações com todo o mundo. É evidente que o porte africano no Brasil ele vai ter um papel na compreensão com o que se passa no Brasil, como o aporte europeu e hoje o aporte estadunidense. Mas isso resulta numa produção que se chama “o Brasil”. É nele que eu quero estar como brasileiro integral! É nele que devemos estar, todos, independente da nossas origens étnicas, como brasileiros integrais, sem servos olhados vesgamente em função de nossa, repito, origem étnica. Por conseguinte esse tipo de aproximação que eu privilegio naquilo que eu faço, e faço pouco porque não sou um especialista da questão negra. Eu sou apenas um negro a mais no Brasil que tem uma experiência de ser negro, mas que não sou especialista da questão negra. O meu trabalho, como todo mundo sabe, é outro, eu me especializei em outra coisa, é a minha história, mas não sou indiferente a essa questão, longe disto. Creio que as contribuições teóricas que por ventura tenha elaborado para o entendimento da sociedade possa ser de alguma valia no tratamento da questão do negro no Brasil; que não será resolvido se os negros forem sozinhos na luta. A luta dos negros só pode ter eficácia se envolver todos os brasileiros, inclusive os negros, mas não só os negros. Não cabe aos negros, aliás, fazer essa luta. Essa luta tem que ser feita sobretudo por todos. Creio que essa etapa seguinte, a de reclamar de todos que participem; e não só em um dia ou uma semana. Eu não tenho simpatia por treze de maio e nem semana do mês de novembro, porque tenho uma enorme dificuldade em aceitar que o país celebre uma semana, celebre um dia e os resto dos 357 dias se descuide da questão. Eu creio que é importante que haja esses dias no sentido de mobilização. Só que a mobilização não é obrigatoriamente aquilo que produz a consciência. Com frequência a mobilização cria um elã emocional e o que permite uma luta continuada é a produção da consciência que não pode ser, digamos, obtida em um dia, treze de maio, uma semana, semana da consciência negra, por que não é questão de consciência negra, é questão de consciência nacional; o negro sabe perfeitamente a sua situação. É por isso que eu me recuso a vir em reuniões como essa, ou quando me convidam na imprensa ou na televisão, a ficar choramingando, “ah nós somos assim, somos acolá, nós estamos em baixo”. Todo mundo sabe disso, então vamos usar o tempo para outro tipo de preocupação.

Inclusive como estava dizendo a um colega da Bahia, da gloriosa universidade da Bahia, onde eu foi aluno de meu filho, que para mim é uma grande satisfação intelectual e moral, que a questão passa por aí, da questão do negro brasileiro, porque assim que me intitulo, eu sou um negro brasileiro, não quero ser outra coisa se não um negro brasileiro, mas quero ser um brasileiro integral. A luta que tem que ser feita passa por criar uma consciência nacional e não, digamos, nos limitarmos a uma produção de uma consciência negra, porque os negros já estão cansados de saber qual é sua condição na sociedade. Para isso é necessário preparar outro discurso.

Eu estou muito mal satisfeitos com maior parte dos discursos dos movimentos negros porque são repetitivos esses discursos, são pobres e não são mobilizadores realmente, exceto para choramingas. De que adianta continuar dizendo que os negros ganham menos no mercado de trabalho? Muito pouco! Todo mundo já sabe disso. Com pequenas variações é a mesma coisa sempre. De que adianta sair dizendo que há um preconceito aberto ou larvar? Todo mundo sabem disse, inclusive aqueles que comentem sabem que estão fazendo preconceito; muitos não sabem. Ai entra o papel de outro discurso, que é o discurso da conscientização a partir de novas palavras de ordem. Por exemplo, peço desculpa por falar de mim mesmo, mas quando nessa entrevista que tive o prazer de dá ao Roberto D’Abila que me perguntou a respeito do ressentimento dos negros em relação a sociedade branca. Eu disse, não, ao contrário, são os brancos que têm o ressentimento com relação os negros que conseguem acender socialmente, que já era um ensaio de produzir um outro discurso. Eu não vou aceitar discutir que os negro tem ressentimento por uma maneira muito simples: porque o nosso ressentimento, se existe, ele não é eficaz, ele não tem poder. O ressentimento que tem eficácia é do que tem poder. Então quando eu falo que é o branco que tem ressentimento, e tem, em relação ao negro que triunfa, não digo o branco em geral, mas um bonito grupo de pessoas brancas . É para exatamente reverter o discurso. É um exemplo de, como creio, que haveria que trabalhar nessa coisa do discurso que acho muito importante, inclusive para a recriação daquilo que repetem com muita frequência, a questão da autoestima. A autoestima ela pode ser parcialmente enfrentada a partir de outro discurso também. É isso, por isso, que não perdoo ao governo federal, e aos governos estaduais, que não põem seu recursos jornalísticos a disposição da produção do discurso da autoestima, o que não custaria muito, mas que tem que ver com as condições de nosso tempo, que tem que ser analisada e se propor outra coisa.


*Palestra proferida pelo professor Milton Santos e transcrita por Cristiano das Neves Bodart a partir de um audio que guardava desde a época que cursava a graduação. Infelizmente não sabemos onde foi proferida essa palestra.


Renúncia de Eduardo Cunha: o que explica?



O deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ) renunciou nesta quinta-feira 7 à presidência da Câmara, da qual estava afastado desde maio por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). Em entrevista coletiva concedida no início da tarde, Cunha se emocionou ao ler sua carta de renúncia e chorou ao agradecer o apoio da família.

Resolvi ceder aos apelos generalizados dos meus apoiadores. É público e notório que a Casa está acéfala, fruto de uma interinidade bizarra que não condiz com o que País espera de um novo tempo após o afastamento da presidente da República. Somente minha renúncia poderá por fim a esta instabilidade sem prazo. A Câmara não suportará esperar indefinidamente", disse o deputado.

O discurso de Cunha esconde uma estratégia para salvar a própria pele.

No dia 14 de junho, depois de mais oito meses de manobras, o Conselho de Ética da Câmara finalmente aprovou a cassação do mandato de Cunha por quebra de decoro parlamentar. A cassação definitiva deverá ser votada pelo plenário da Casa e a expectativa de aliados do peemedebista é que ele perca a votação.

Diante da iminente derrota, Cunha conta com o apoio do presidente interino, Michel Temer (PMDB), para emplacar um aliado na presidência da Câmara. A expectativa é que o novo presidente beneficie Cunha de alguma forma na condução do processo.

Em reportagem publicada em 29 de junho, o jornal O Globo revelou que o Palácio do Planalto de fato embarcou no acordo. "Não dá para querer que ele renuncie sem o compromisso de que o sucessor não lhe seja hostil", disse ao jornal um assessor do Planalto.

A renúncia seria uma contrapartida de Cunha a Temer. Para o Planalto, a saída de Cunha é positiva, pois abre espaço para um aliado do governo na presidência da Câmara. Essa posição pode ajudar a gestão interina quando esta deixar tal condição, após a conclusão do processo de impeachment de Dilma Rousseff.

A intenção do governo de fechar o acordo com Cunha é tão evidente que o próprio Temer, também segundo o jornal O Globo, sugeriu a Cunha deixar o cargo. Os dois se encontraram na noite do domingo 3, no Palácio do Jaburu.

Com a renúncia de Cunha, a Câmara tem agora cinco sessões para realizar uma nova eleição – após a decisão do STF, a presidência da Casa foi assumida interinamente pelo deputado Waldir Maranhão (PP-MA), visto como fraco e sem legitimidade. O homem que parece ser capaz de presidir a Câmara de acordo com as necessidades de Temer e Cunha é Rogério Rosso (PSD-DF).

CCJ

A renúncia de Cunha se deu mesmo após ele obter uma pequena vitória em sua última cartada na Câmara. Em um recurso apresentado à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa, Cunha buscou anular a decisão do Conselho de Ética que recomendou sua cassação. O caso deve ser votado na próxima segunda-feira 11, e o relator do processo, deputado Ronaldo Fonseca (PROS-DF), já apresentou parecer favorável a Cunha, defendendo a anulação da sessão que recomendou a cassação.

Antes da divulgação do relatório, Fonseca conseguiu emplacar um aliado na direção-geral do Arquivo Nacional. O deputado nega que o parecer apresentado tenha qualquer relação com a nomeação de José Ricardo Marques para o órgão, mas o caso reforça a suspeita de que o governo Temer estaria empenhado em salvar o mandato de Cunha.

Pressão

Embora tenha dito diversas vezes que “jamais” renunciaria, Cunha sentiu a pressão aumentar também sobre sua família. Cláudia Cruz, mulher do deputado, e Danielle Dytz Doctorovich, filha do casal, são investigadas na 13ª Vara Federal de Curitiba (comandada pelo juiz Sérgio Moro) no âmbito da Operação Lava Jato – Cláudia já é ré no processo. A aliados, o peemedebista teria dito que teme que as duas sejam presas caso ele perca o mandato.

No caso específico de Cunha, a renúncia pode ajudá-lo também na esfera judicial. O regimento interno do STF determina que o presidente da Câmara seja julgado pelo plenário da Casa, mas o mesmo não vale para os deputados comuns. Cunha, agora, deve ser julgado pela Segunda Turma do STF, integrada pelo ministro Teori Zavascki, relator da Lava Jato no Supremo.

Além de Zavascki, compõem a turma Cármen Lúcia, Celso de Mello, Gilmar Mendes e Dias Toffoli. Ao que consta, aliados de conta entendem que essa formação dá alguma chance de sobrevivência ao agora ex-presidente da Câmara.



Imagem capturada do vídeo da renúncia do Dep. Eduardo Cunha (PMDB).

Michel Temer vai aumentar ataques aos índios: Um general para presidir a Funai


Foi confirmado hoje, através da imprensa, que o presidente-golpista Michel Temer recebeu a indicação de um general de reserva do Exército para presidência da FUNAI, a Fundação Nacional do Índio. Seguindo o procedimento adotado pelo PMDB, que é o de nomear apenas caciques partidários para os cargos no governo, o PSC, presidido pelo pastor Everaldo, indicou Roberto Sebastião Peternelli para o cargo de maior relevância sobre os direitos dos povos indígenas.
Publicado por Jean Wyllys em sua página no facebook

Estariam por detrás da nomeação, ainda, o líder do governo ilegítimo, André Moura (PSC), que é réu por assassinato e membro da bancada da bala, e Romero Jucá (PMDB), que teve que se demitir do governo após grampos demonstrarem que ele era um dos principais articuladores do fim da Operação Lava-Jato.

O motivo de se indicar um ex-piloto para cuidar dos interesses indígenas é claro: aumentar os ataques aos direitos da população protegida pela FUNAI, que aliás, já faz tempo, é esvaziada por interesses das bancadas fundamentalista e ruralista. Nas redes sociais, o general da reserva Roberto Paternelli jamais demonstrou simpatia com as questões que terá que lidar na FUNAI. Ao invés disso, demonstrou ser enfático defensor do regime militar e dos ex-generais Castelo Branco, Costa e Silva, Médici, Geisel e Figueredo. Em uma dessas publicações, ele chegou a saudar o assassinato de pessoas consideradas comunistas pelo exército naquela época.

Devemos prestar atenção ao cenário alarmante para questão indígena no Brasil. É um cenário de crise humanitária. Há conflitos em todas as 5 grandes regiões do país, sobretudo com grupos que praticam grilagem de terras e desmatamento ilegal. Em decorrência do avanço desses grupos, que agem muitas vezes com pistoleiros, multiplicaram-se nos últimos anos casos de mortes, estupros e deslocamentos forçados de pessoas indígenas. Nas cidades, onde muitos tiveram que passar a viver, a grande maioria vive em favelas e encontra imensas dificuldades para adaptação.

A opção política de Temer, caso seja confirmado mais esse nome incompetente para função, sinaliza que o compromisso desse governo é o de acabar com garantias para os indígenas. Em meio a um verdadeiro etnocídio dos povos tradicionais, Temer sinaliza que vai aumentar a potência do lado que está contribuindo para o desastre. Se nada for feito para impedir que essa indicação siga adiante, podemos esperar até ações com objetivo de encerrar atividades do órgão de proteção.

É aviltante que um governo que não passou pelo crivo das urnas esteja a frente de ações anti-populares para oferecer privilégios a patrocinadores de campanhas sob suspeita. Outra vez diremos: Fascistas não passarão. Não passarão sobre os povos indígenas no Brasil!

General Roberto Sebastião é indicado para presidir a Funai.

Em menos de dois minutos, historiador Leando Karnal desmonta o “escola sem partido”


O professor da Unicamp e comentarista da TV Cultura, Leandro Karnal, expressou com todas as letras o significado do projeto chamado de ‘escola sem partido’, mas que é patrocinado por partidos políticos, principalmente pelo DEM, PSC e pelo PSDB, que abraçou o projeto.

Imagem capturada do vídeo.
Para Karnal, o projeto é a expressão máxima da ignorância humana.

Publicado no Carta Campinas, Roda Viva e Pragmatismo Político

É uma asneira sem tamanho, uma bobagem conservadora, de gente que não é formada na área e que decide ter uma ideia absurda, que é substituir o que eles imaginam que seja uma ideologia por outra ideologia…É uma crença fantasiosa de uma direita delirante e absurdamente estúpida de que a escola forme a cabeça das pessoas e que esses jovens saem líderes sindicais. Os jovens têm sua própria opinião. Os jovens não são massa de manobra…. Toda a opinião é política, inclusive a ‘escola sem partido’…. A demonização da política é a pior herança da ditadura militar, que além de matar seres humanos, ainda provocou na educação um dano que vai se arrastar por mais algumas décadas”.

Em nível nacional, um dos principais expoentes da ‘escola sem partido’ é o deputado Izalci Lucas (PSDB-DF). Ou seja, a estultice começa com um partido propondo um projeto de uma ‘escola sem partido’.

Outro deputado do PSDB, deputado Rogério Marinho (PSDB-RN) é autor do PL 1411/2015, que tipifica e estabelece punições para o crime de “assédio ideológico”. O deputado João Campos de Araújo (PSDB-GO) compara a discussão política na escola ao ‘assédio sexual’.

Fotógrafo cria projeto que retrata juventude negra sem rótulos



Dos 30 mil jovens entre 15 e 29 anos que foram assassinados em 2012, 77% eram negros, segundo estimativa da Anistia Internacional. Essa dura realidade foi o que inspirou o fotógrafo Luiz Ferreira, 20 anos, a criar um ensaio sobre a juventude negra. “O projeto surgiu da necessidade de tentar desconstruir um estereótipo que os negros têm, que foi estabelecido há muito tempo. Esse padrão negativo tem sido consolidado na história. O negro é visto como marginal”, revela.
Publicado originalmente no Ceert

Juventude negra: sobre afetos, histórias, vivências tem como objetivo mostrar quem são os jovens negros. “Não somos só um número na estatística. Estamos nas universidades, trabalhamos, somos ativistas, somos politizados. Acho que isso tem que ser mostrado para a sociedade”, explica o fotógrafo. Assim que teve a ideia, Luiz Ferreira abriu uma seleção em sua página no Facebook em busca de modelos para o projeto. Foram escolhidos 15 jovens negros, desses, 13 participaram do ensaio. Algumas imagens foram capturadas em espaços que também expressam o objetivo do projeto, como a Feira de Ceilândia e o Mercado Sul, em Taguatinga.

A série de imagens começou a ser publicada nas redes sociais e ganhou repercussão na plataforma. A cada semana, Luiz Ferreira divulga o ensaio de dois ou três personagens do projeto. “Compartilho um álbum com as fotos junto de um texto em que falo de alguma experiência do jovem, conto um pouco sobre a sua história, como o processo de afirmação da negritude”, comenta. O que é uma referência ao projeto famoso das redes sociais Humans of New York, que conta a história de pessoas clicadas nas ruas da Big Apple. “Engraçado. Muitas pessoas têm perguntado sobre isso. Não é igual, mas claro que existe uma referência”, diz o fotógrafo.

Projeto

Antes das publicações começarem, Luiz Ferreira lançou um teaser com imagens de alguns modelos e explicando o projeto. O vídeo, que tem 1 minuto e 37 segundos de duração, foi filmado por Pedro Lemos.

Até esta semana já foram publicados conteúdos de cinco ensaios, ainda faltam oito. O primeiro foi uma série de fotos do jovem Patrick Shakur, de 18 anos, morador do Recanto das Emas, que tem como influência de afirmação e empoderamento negro, o rapper Tupac Shakur. Também já foram publicadas imagens de Fernanda Gomes, 18 anos, que sonha em ser voluntária na África; Michelle Araújo, que trabalha como cabeleireira de cabelos cacheados; Liniker Teixeira, que teve sua vida mudada após entrar em uma universidade; e Andréia Gonçalves, 21 anos, que teve um processo de formação estética ao assumir o seu cabelo natural.

Foto: Luiz Ferreira/Divulgação.
Foto: Luiz Ferreira/Divulgação.
Foto: Luiz Ferreira/Divulgação

De menor a criança: menoridade negra, infância branca e genocídio


Recentemente, ao realizar pesquisa sobre desigualdades raciais na infância e adolescência, deparei-me com a seguinte notícia, publicada em 2011, em um jornal de Minas Gerais: “Menor é apreendido por assalto a adolescente”.

A notícia relatava a ocorrência, descrevendo o autor e a vítima. Entretanto, ao descrevê-los, o texto afastava ainda mais dois universos de infância já segregados, sendo que a um deles é negada, inclusive, a própria existência como infância, já que menor é diferente de criança ou adolescente.
Publicado originalmente no Ceert

Ao longo das últimas décadas, os direitos relativos à infância e adolescência no Brasil passaram por completa mudança de paradigmas. Esta transição integrou a refundação da sociedade brasileira, a partir das aspirações democráticas que levaram ao fim do regime militar. No lugar da doutrina da segurança nacional, o princípio da dignidade humana; no lugar do autoritarismo, o respeito aos direitos fundamentais; ao invés da doutrina da situação irregular, a doutrina da proteção integral. Com isso, a noção de “menoridade” cedia lugar à infância e adolescência.

Não foram necessários muitos anos após a promulgação da Constituição para que os desafios de uma sociedade complexa e desigual demonstrassem, no entanto, que ainda há um longo percurso para a efetivação dos direitos conquistados no plano normativo.

Mas afinal, quem é o “menor” e quem é a criança/adolescente no Brasil?

As desigualdades sociais que marcam o país fazem com que subsistam paradigmas diferentes a um tempo só. Além da criança, ainda existe o “menor”, com os estigmas e estereótipos da ultrapassada doutrina da situação irregular. E esta dicotomia é ainda mais evidente quando analisamos as condições de vida de crianças e adolescentes de acordo com seu pertencimento étnico-racial. Constatamos a coexistência de uma infância branca e uma menoridade negra.

Segundo o estudo “Acesso, permanência, aprendizagem e conclusão da educação básica na idade certa – Direito de todas e de cada uma das crianças e dos adolescentes”, publicado pelo UNICEF, em 2012, um dos principais entraves para a universalização do acesso e permanência na escola no Brasil é a discriminação racial. O mesmo estudo afirma ainda que “todos os indicadores de acesso à escola e conclusão nos estudos mostram que as crianças e os adolescentes negros estão em desvantagem em relação aos mesmos grupos etários da população branca”.

Na seara da exploração e violência sexual o perfil das vítimas também aponta para uma incidência maior entre crianças e adolescentes negros. 

Estudo dos pesquisadores Alexandre de Freitas Barbosa e Claudia Cirino de Oliveira, publicada na revista “Na Mão Certa”, em 2008, demonstrou que, dentre as crianças pesquisadas, 70% das que estão sujeitas a exploração sexual são negras. Além disso, estas possuem taxa de pobreza cerca de duas vezes maior do que as não-negras. 

No mesmo sentido, há décadas, o movimento negro vem denunciando à sociedade brasileira os assassinatos sistemáticos de jovens negros no país, cujos números chegam a superar os de países em conflitos armados ou nos quais minorias étnicas sofreram genocídio.

Ademais, constata-se a segregação racial à brasileira: segundo o Mapa da Violência de 2014, entre anos 2002 e 2012, o número de homicídios de jovens brancos caiu 32,3%. Entre os jovens negros, no mesmo período, o número de homicídios aumentou 32,4%. Percentuais similares, mas em sentidos contrários.

O cenário ajuda a compreender episódios recentes de violência contra crianças e adolescentes publicados por diferentes meios de comunicação e sua banalização. Por outro lado, propicia o aperfeiçoamento de políticas públicas que precisam considerar as dimensões étnico-racial e de gênero para serem mais eficientes e, verdadeiramente, universais. Este é um dos objetivos do projeto nacional Direito da Criança e do Adolescente e a Promoção da Igualdade Racial, realizado pelo Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades, com patrocínio da Petrobras.

Perceber que as crianças e adolescentes negras são as mais vulneráveis à exploração sexual e que os jovens negros, por sua vez, são as vítimas preferenciais dos homicídios (77%, dentre os jovens, segundo o Mapa da Violência) é enxergar e apreender os detalhes do quadro das violações a direitos de crianças, adolescentes e jovens no Brasil, quadro este carregado na cor e nos gêneros.

Imagem capturado da vídeo do Ceert.