Renúncia de Eduardo Cunha: o que explica?



O deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ) renunciou nesta quinta-feira 7 à presidência da Câmara, da qual estava afastado desde maio por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). Em entrevista coletiva concedida no início da tarde, Cunha se emocionou ao ler sua carta de renúncia e chorou ao agradecer o apoio da família.

Resolvi ceder aos apelos generalizados dos meus apoiadores. É público e notório que a Casa está acéfala, fruto de uma interinidade bizarra que não condiz com o que País espera de um novo tempo após o afastamento da presidente da República. Somente minha renúncia poderá por fim a esta instabilidade sem prazo. A Câmara não suportará esperar indefinidamente", disse o deputado.

O discurso de Cunha esconde uma estratégia para salvar a própria pele.

No dia 14 de junho, depois de mais oito meses de manobras, o Conselho de Ética da Câmara finalmente aprovou a cassação do mandato de Cunha por quebra de decoro parlamentar. A cassação definitiva deverá ser votada pelo plenário da Casa e a expectativa de aliados do peemedebista é que ele perca a votação.

Diante da iminente derrota, Cunha conta com o apoio do presidente interino, Michel Temer (PMDB), para emplacar um aliado na presidência da Câmara. A expectativa é que o novo presidente beneficie Cunha de alguma forma na condução do processo.

Em reportagem publicada em 29 de junho, o jornal O Globo revelou que o Palácio do Planalto de fato embarcou no acordo. "Não dá para querer que ele renuncie sem o compromisso de que o sucessor não lhe seja hostil", disse ao jornal um assessor do Planalto.

A renúncia seria uma contrapartida de Cunha a Temer. Para o Planalto, a saída de Cunha é positiva, pois abre espaço para um aliado do governo na presidência da Câmara. Essa posição pode ajudar a gestão interina quando esta deixar tal condição, após a conclusão do processo de impeachment de Dilma Rousseff.

A intenção do governo de fechar o acordo com Cunha é tão evidente que o próprio Temer, também segundo o jornal O Globo, sugeriu a Cunha deixar o cargo. Os dois se encontraram na noite do domingo 3, no Palácio do Jaburu.

Com a renúncia de Cunha, a Câmara tem agora cinco sessões para realizar uma nova eleição – após a decisão do STF, a presidência da Casa foi assumida interinamente pelo deputado Waldir Maranhão (PP-MA), visto como fraco e sem legitimidade. O homem que parece ser capaz de presidir a Câmara de acordo com as necessidades de Temer e Cunha é Rogério Rosso (PSD-DF).

CCJ

A renúncia de Cunha se deu mesmo após ele obter uma pequena vitória em sua última cartada na Câmara. Em um recurso apresentado à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa, Cunha buscou anular a decisão do Conselho de Ética que recomendou sua cassação. O caso deve ser votado na próxima segunda-feira 11, e o relator do processo, deputado Ronaldo Fonseca (PROS-DF), já apresentou parecer favorável a Cunha, defendendo a anulação da sessão que recomendou a cassação.

Antes da divulgação do relatório, Fonseca conseguiu emplacar um aliado na direção-geral do Arquivo Nacional. O deputado nega que o parecer apresentado tenha qualquer relação com a nomeação de José Ricardo Marques para o órgão, mas o caso reforça a suspeita de que o governo Temer estaria empenhado em salvar o mandato de Cunha.

Pressão

Embora tenha dito diversas vezes que “jamais” renunciaria, Cunha sentiu a pressão aumentar também sobre sua família. Cláudia Cruz, mulher do deputado, e Danielle Dytz Doctorovich, filha do casal, são investigadas na 13ª Vara Federal de Curitiba (comandada pelo juiz Sérgio Moro) no âmbito da Operação Lava Jato – Cláudia já é ré no processo. A aliados, o peemedebista teria dito que teme que as duas sejam presas caso ele perca o mandato.

No caso específico de Cunha, a renúncia pode ajudá-lo também na esfera judicial. O regimento interno do STF determina que o presidente da Câmara seja julgado pelo plenário da Casa, mas o mesmo não vale para os deputados comuns. Cunha, agora, deve ser julgado pela Segunda Turma do STF, integrada pelo ministro Teori Zavascki, relator da Lava Jato no Supremo.

Além de Zavascki, compõem a turma Cármen Lúcia, Celso de Mello, Gilmar Mendes e Dias Toffoli. Ao que consta, aliados de conta entendem que essa formação dá alguma chance de sobrevivência ao agora ex-presidente da Câmara.



Imagem capturada do vídeo da renúncia do Dep. Eduardo Cunha (PMDB).

Michel Temer vai aumentar ataques aos índios: Um general para presidir a Funai


Foi confirmado hoje, através da imprensa, que o presidente-golpista Michel Temer recebeu a indicação de um general de reserva do Exército para presidência da FUNAI, a Fundação Nacional do Índio. Seguindo o procedimento adotado pelo PMDB, que é o de nomear apenas caciques partidários para os cargos no governo, o PSC, presidido pelo pastor Everaldo, indicou Roberto Sebastião Peternelli para o cargo de maior relevância sobre os direitos dos povos indígenas.
Publicado por Jean Wyllys em sua página no facebook

Estariam por detrás da nomeação, ainda, o líder do governo ilegítimo, André Moura (PSC), que é réu por assassinato e membro da bancada da bala, e Romero Jucá (PMDB), que teve que se demitir do governo após grampos demonstrarem que ele era um dos principais articuladores do fim da Operação Lava-Jato.

O motivo de se indicar um ex-piloto para cuidar dos interesses indígenas é claro: aumentar os ataques aos direitos da população protegida pela FUNAI, que aliás, já faz tempo, é esvaziada por interesses das bancadas fundamentalista e ruralista. Nas redes sociais, o general da reserva Roberto Paternelli jamais demonstrou simpatia com as questões que terá que lidar na FUNAI. Ao invés disso, demonstrou ser enfático defensor do regime militar e dos ex-generais Castelo Branco, Costa e Silva, Médici, Geisel e Figueredo. Em uma dessas publicações, ele chegou a saudar o assassinato de pessoas consideradas comunistas pelo exército naquela época.

Devemos prestar atenção ao cenário alarmante para questão indígena no Brasil. É um cenário de crise humanitária. Há conflitos em todas as 5 grandes regiões do país, sobretudo com grupos que praticam grilagem de terras e desmatamento ilegal. Em decorrência do avanço desses grupos, que agem muitas vezes com pistoleiros, multiplicaram-se nos últimos anos casos de mortes, estupros e deslocamentos forçados de pessoas indígenas. Nas cidades, onde muitos tiveram que passar a viver, a grande maioria vive em favelas e encontra imensas dificuldades para adaptação.

A opção política de Temer, caso seja confirmado mais esse nome incompetente para função, sinaliza que o compromisso desse governo é o de acabar com garantias para os indígenas. Em meio a um verdadeiro etnocídio dos povos tradicionais, Temer sinaliza que vai aumentar a potência do lado que está contribuindo para o desastre. Se nada for feito para impedir que essa indicação siga adiante, podemos esperar até ações com objetivo de encerrar atividades do órgão de proteção.

É aviltante que um governo que não passou pelo crivo das urnas esteja a frente de ações anti-populares para oferecer privilégios a patrocinadores de campanhas sob suspeita. Outra vez diremos: Fascistas não passarão. Não passarão sobre os povos indígenas no Brasil!

General Roberto Sebastião é indicado para presidir a Funai.

Em menos de dois minutos, historiador Leando Karnal desmonta o “escola sem partido”


O professor da Unicamp e comentarista da TV Cultura, Leandro Karnal, expressou com todas as letras o significado do projeto chamado de ‘escola sem partido’, mas que é patrocinado por partidos políticos, principalmente pelo DEM, PSC e pelo PSDB, que abraçou o projeto.

Imagem capturada do vídeo.
Para Karnal, o projeto é a expressão máxima da ignorância humana.

Publicado no Carta Campinas, Roda Viva e Pragmatismo Político

É uma asneira sem tamanho, uma bobagem conservadora, de gente que não é formada na área e que decide ter uma ideia absurda, que é substituir o que eles imaginam que seja uma ideologia por outra ideologia…É uma crença fantasiosa de uma direita delirante e absurdamente estúpida de que a escola forme a cabeça das pessoas e que esses jovens saem líderes sindicais. Os jovens têm sua própria opinião. Os jovens não são massa de manobra…. Toda a opinião é política, inclusive a ‘escola sem partido’…. A demonização da política é a pior herança da ditadura militar, que além de matar seres humanos, ainda provocou na educação um dano que vai se arrastar por mais algumas décadas”.

Em nível nacional, um dos principais expoentes da ‘escola sem partido’ é o deputado Izalci Lucas (PSDB-DF). Ou seja, a estultice começa com um partido propondo um projeto de uma ‘escola sem partido’.

Outro deputado do PSDB, deputado Rogério Marinho (PSDB-RN) é autor do PL 1411/2015, que tipifica e estabelece punições para o crime de “assédio ideológico”. O deputado João Campos de Araújo (PSDB-GO) compara a discussão política na escola ao ‘assédio sexual’.

Fotógrafo cria projeto que retrata juventude negra sem rótulos



Dos 30 mil jovens entre 15 e 29 anos que foram assassinados em 2012, 77% eram negros, segundo estimativa da Anistia Internacional. Essa dura realidade foi o que inspirou o fotógrafo Luiz Ferreira, 20 anos, a criar um ensaio sobre a juventude negra. “O projeto surgiu da necessidade de tentar desconstruir um estereótipo que os negros têm, que foi estabelecido há muito tempo. Esse padrão negativo tem sido consolidado na história. O negro é visto como marginal”, revela.
Publicado originalmente no Ceert

Juventude negra: sobre afetos, histórias, vivências tem como objetivo mostrar quem são os jovens negros. “Não somos só um número na estatística. Estamos nas universidades, trabalhamos, somos ativistas, somos politizados. Acho que isso tem que ser mostrado para a sociedade”, explica o fotógrafo. Assim que teve a ideia, Luiz Ferreira abriu uma seleção em sua página no Facebook em busca de modelos para o projeto. Foram escolhidos 15 jovens negros, desses, 13 participaram do ensaio. Algumas imagens foram capturadas em espaços que também expressam o objetivo do projeto, como a Feira de Ceilândia e o Mercado Sul, em Taguatinga.

A série de imagens começou a ser publicada nas redes sociais e ganhou repercussão na plataforma. A cada semana, Luiz Ferreira divulga o ensaio de dois ou três personagens do projeto. “Compartilho um álbum com as fotos junto de um texto em que falo de alguma experiência do jovem, conto um pouco sobre a sua história, como o processo de afirmação da negritude”, comenta. O que é uma referência ao projeto famoso das redes sociais Humans of New York, que conta a história de pessoas clicadas nas ruas da Big Apple. “Engraçado. Muitas pessoas têm perguntado sobre isso. Não é igual, mas claro que existe uma referência”, diz o fotógrafo.

Projeto

Antes das publicações começarem, Luiz Ferreira lançou um teaser com imagens de alguns modelos e explicando o projeto. O vídeo, que tem 1 minuto e 37 segundos de duração, foi filmado por Pedro Lemos.

Até esta semana já foram publicados conteúdos de cinco ensaios, ainda faltam oito. O primeiro foi uma série de fotos do jovem Patrick Shakur, de 18 anos, morador do Recanto das Emas, que tem como influência de afirmação e empoderamento negro, o rapper Tupac Shakur. Também já foram publicadas imagens de Fernanda Gomes, 18 anos, que sonha em ser voluntária na África; Michelle Araújo, que trabalha como cabeleireira de cabelos cacheados; Liniker Teixeira, que teve sua vida mudada após entrar em uma universidade; e Andréia Gonçalves, 21 anos, que teve um processo de formação estética ao assumir o seu cabelo natural.

Foto: Luiz Ferreira/Divulgação.
Foto: Luiz Ferreira/Divulgação.
Foto: Luiz Ferreira/Divulgação

De menor a criança: menoridade negra, infância branca e genocídio


Recentemente, ao realizar pesquisa sobre desigualdades raciais na infância e adolescência, deparei-me com a seguinte notícia, publicada em 2011, em um jornal de Minas Gerais: “Menor é apreendido por assalto a adolescente”.

A notícia relatava a ocorrência, descrevendo o autor e a vítima. Entretanto, ao descrevê-los, o texto afastava ainda mais dois universos de infância já segregados, sendo que a um deles é negada, inclusive, a própria existência como infância, já que menor é diferente de criança ou adolescente.
Publicado originalmente no Ceert

Ao longo das últimas décadas, os direitos relativos à infância e adolescência no Brasil passaram por completa mudança de paradigmas. Esta transição integrou a refundação da sociedade brasileira, a partir das aspirações democráticas que levaram ao fim do regime militar. No lugar da doutrina da segurança nacional, o princípio da dignidade humana; no lugar do autoritarismo, o respeito aos direitos fundamentais; ao invés da doutrina da situação irregular, a doutrina da proteção integral. Com isso, a noção de “menoridade” cedia lugar à infância e adolescência.

Não foram necessários muitos anos após a promulgação da Constituição para que os desafios de uma sociedade complexa e desigual demonstrassem, no entanto, que ainda há um longo percurso para a efetivação dos direitos conquistados no plano normativo.

Mas afinal, quem é o “menor” e quem é a criança/adolescente no Brasil?

As desigualdades sociais que marcam o país fazem com que subsistam paradigmas diferentes a um tempo só. Além da criança, ainda existe o “menor”, com os estigmas e estereótipos da ultrapassada doutrina da situação irregular. E esta dicotomia é ainda mais evidente quando analisamos as condições de vida de crianças e adolescentes de acordo com seu pertencimento étnico-racial. Constatamos a coexistência de uma infância branca e uma menoridade negra.

Segundo o estudo “Acesso, permanência, aprendizagem e conclusão da educação básica na idade certa – Direito de todas e de cada uma das crianças e dos adolescentes”, publicado pelo UNICEF, em 2012, um dos principais entraves para a universalização do acesso e permanência na escola no Brasil é a discriminação racial. O mesmo estudo afirma ainda que “todos os indicadores de acesso à escola e conclusão nos estudos mostram que as crianças e os adolescentes negros estão em desvantagem em relação aos mesmos grupos etários da população branca”.

Na seara da exploração e violência sexual o perfil das vítimas também aponta para uma incidência maior entre crianças e adolescentes negros. 

Estudo dos pesquisadores Alexandre de Freitas Barbosa e Claudia Cirino de Oliveira, publicada na revista “Na Mão Certa”, em 2008, demonstrou que, dentre as crianças pesquisadas, 70% das que estão sujeitas a exploração sexual são negras. Além disso, estas possuem taxa de pobreza cerca de duas vezes maior do que as não-negras. 

No mesmo sentido, há décadas, o movimento negro vem denunciando à sociedade brasileira os assassinatos sistemáticos de jovens negros no país, cujos números chegam a superar os de países em conflitos armados ou nos quais minorias étnicas sofreram genocídio.

Ademais, constata-se a segregação racial à brasileira: segundo o Mapa da Violência de 2014, entre anos 2002 e 2012, o número de homicídios de jovens brancos caiu 32,3%. Entre os jovens negros, no mesmo período, o número de homicídios aumentou 32,4%. Percentuais similares, mas em sentidos contrários.

O cenário ajuda a compreender episódios recentes de violência contra crianças e adolescentes publicados por diferentes meios de comunicação e sua banalização. Por outro lado, propicia o aperfeiçoamento de políticas públicas que precisam considerar as dimensões étnico-racial e de gênero para serem mais eficientes e, verdadeiramente, universais. Este é um dos objetivos do projeto nacional Direito da Criança e do Adolescente e a Promoção da Igualdade Racial, realizado pelo Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades, com patrocínio da Petrobras.

Perceber que as crianças e adolescentes negras são as mais vulneráveis à exploração sexual e que os jovens negros, por sua vez, são as vítimas preferenciais dos homicídios (77%, dentre os jovens, segundo o Mapa da Violência) é enxergar e apreender os detalhes do quadro das violações a direitos de crianças, adolescentes e jovens no Brasil, quadro este carregado na cor e nos gêneros.

Imagem capturado da vídeo do Ceert.