Mídia enfatiza dificuldades de Dilma, mas minimiza crise da direita brasileira


Desde que se modernizou com a adoção do neoliberalismo como ideário e com os tucanos assumindo seu eixo aglutinador, a direita teve, inicialmente, o sucesso do governo Fernando Henrique Cardoso e, depois, com o seu fracasso, nunca mais conseguiu triunfar. Ao contrário, sofre a quarta derrota consecutiva, vive um momento de declínio, prenunciando um futuro em que seguirá perdendo expressão em nível nacional e diminuindo cada vez mais as possibilidades de voltar a triunfar na disputa presidencial. Mas, ao mesmo tempo, tem muitas dificuldades para mudar de fisionomia.

Dilma em campanha em Porto Alegre. À direita sobra apoio
da mídia tradicional, mas falta apoio popular ao seu projeto
de governo.
A votação de Aécio Neves, que finalmente terminou sendo expressiva depois de ter passado pelo pior pesadelo – perder em Minas e viver o risco de nem chegar ao segundo turno –, pode dar a impressão de que a direita saiu fortalecida das eleições. Uma falsa impressão, ainda mais que em dois momentos da campanha ela esteve na frente nas pesquisas e alimentou – aqui e fora daqui – a expectativa de que era favorita para ganhar.

Qual é a situação da oposição depois da campanha? Em primeiro lugar, sofreu a quarta derrota consecutiva, confirmando que a confrontação entre os governos dos tucanos e os do PT é altamente favorável a estes. Foram as políticas sociais dos governos Lula e Dilma os fatores fundamentais da vitória em 2014, ao lado das ameaças a essas políticas por parte de Armínio Fraga, um ex-membro do governo FHC, que tornava totalmente infrutíferas as promessas de Aécio de que manteria os programas sociais do PT. Como, se o diagnóstico do freio ao crescimento era um salário mínimo alto? Como, se um certo nível de desemprego seria saudável? Como manter políticas sociais, se sobraria muito pouco dos bancos públicos?

O mecanismo de confrontação dos dois modelos – o neoliberal e o antineoliberal –, que já havia comandado as campanhas presidenciais anteriores, voltou a se impor e mostra que é caminho de derrota para os tucanos. José Serra – tanto em 2002, como em 2010 – tentou distanciar-se do governo de FHC, mas teve de voltar ao seu lugar de oposição de direita e de continuidade com o neoliberalismo. Aécio tentou resgatar abertamente o governo FHC e deixou um flanco totalmente aberto, que foi bem explorado pelo PT.

Assim, a projeção de candidaturas presidenciais da oposição é difícil. Aécio está enfraquecido, apesar de sua votação, porque perdeu em Minas Gerais, não contará mais com o governo e uma suposta base de apoio no seu estado natal. Sua alta votação se deve, em grande parte, aos tucanos paulistas, enquanto a máquina tucana mineira fracassou.

Alckmin volta assim a ser o nome da vez, nesse revezamento terrível dos tucanos – já foram duas vezes Serra, seriam duas vezes Alckmin, e têm a derrota do que deveria ser a renovação e a superação desses dois nomes, com Aécio. Mesmo com uma votação impressionante em São Paulo – tanto para o governo do Estado, como para a Presidência da República – Alckmin é um candidato fraco, como ficou patente na campanha de 2006, ainda mais se tiver pela frente Lula.

Minas era, junto com São Paulo, o eixo fundamental dos tucanos, que agora dependerão muito mais de São Paulo – onde já perderam a capital – e do Paraná. Um declínio claro ao longo dos governos do PT, que pode se acentuar a partir de 2018.

Por outro lado, antes da morte de Eduardo Campos, tanto o então candidato como Marina, sua vice, encaravam suas candidaturas para um recall em 2018. O que conseguissem em 2014 seria lucro. Com a morte dele, ela se viu projetada como alternativa possível e, como se viu depois, deixou de ser e se queimou com o apoio direto a Aécio. A própria Rede que a Marina estava construindo com grandes dificuldades se rompeu e é duvidoso que ela possa recolocar seu projeto em pé e ser uma candidata com impulso em 2018.

Os dilemas da oposição são difíceis: resta-lhe Alckmin como candidato, um candidato fraco, sem carisma, representando o mesmo projeto já derrotado quatro vezes. Enquanto o PT coloca a agenda nacional – democratização social, com inclusão da massa da população –, os tucanos ficam deslocados.

Apelaram para o denuncismo, que teve seu efeito, mas dificilmente pode se estender ao longo dos próximos quatro anos. No debate econômico, terminaram perdendo, conforme o horário na TV mostrou à grande maioria que o caminho projetado pelo PT é o correto, pois inflação e emprego estão sob controle.

Não são bons os augúrios para a direita brasileira nos próximos anos. Até quando vão contar com o monopólio dos meios de comunicação e com o financiamento privado das campanhas eleitorais? Disso depende, em grande parte, que a direita possa pelo menos manter na agenda política nacional um denuncismo suficiente para alimentar a oposição, mas insuficiente para triunfar.


Via Rede Brasil Atual

Quão “cordial” é o povo brasileiro?, Por Leonardo Boff


Dizer que o brasileiro é um “homem cordial” vem do escritor Ribeiro Couto,  expressão generalizada por Sérgio Buarque de Holanda em seu conhecido livro: “Raízes do Brasil” de 1936 que lhe dedica o inteiro capítulo V. Mas esclarece, contrariando Cassiano Ricardo que entendia a “cordialidade”como bondade e a polidez, que “nossa forma ordinária de convívio social é no fundo, justamente o contrário da polidez”(da 21ª edição de 1989 p. 107). Sergio Buarque assume a cordialidade no sentido estritamente etimológico: vem de coração. O brasileiro se orienta muito mais pelo coração do que pela razão. Do coração podem provir o amor e o ódio. Bem diz o autor: “a inimizade bem pode ser tão cordial como a amizade, visto que uma e outra nascem do coração”(p.107).Escrevo tudo isso para entender os sentimentos “cordiais” que irromperam na campanha presidencial de 2014. Houve por uma parte declarações de entusiasmo e de amor até ao fanatismo para os dois candidatos e por outra, de ódios profundos, expressões chulas por parte de ambas as partes do eleitorado. Verificou-se o que Buarque de Holanda escreveu: a falta de polidez no nosso convívio social.

Talvez em nenhuma campanha anterior se expressaram os gestos “cordiais” dos brasileiros no sentido de amor e ódio contidos nesta palavra.  Quem seguiu as redes sociais, se deu conta dos níveis baixíssimos de polidez, de desrespeito  mútuo e até falta de sentido democrático como convivência com as diferenças. Essa falta de respeito repercutiu também nos debates entre os candidatos, transmitidos pela TV. Por exemplo, que um dos candidatos chame a Presidenta do país de “leviana e mentirosa” se inscreve dentro desta lógica “cordial”, embora revele grande falta de respeito diante da dignidade do mais alto cargo da nação.

Para entender melhor esta nossa “cordialidade” cabe referir duas heranças que oneram nossa cidadania: a colonização e a escravidão. A colonização produziu em nós o sentimento de submissão, tendo que assumir as formas políticas, a língua, a religião e os hábitos do colonizador português. Em consequência criou-se a Casa Grande e a Senzala. Como bem o mostrou Gilberto Freyre não se trata de instituições sociais exteriores. Elas foram internalizadas na forma de um dualismo perverso: de um lado os senhor que tudo possui e manda e do outro o servo que pouco tem e obedece ou também a hierarquização social que se revela pela divisão entre ricos e pobres. Essa estrutura subsiste na cabeça das pessoas e se tornou um código de interpretação da realidade.

Outra tradição muito perversa foi a escravidão. Cabe recordar que houve uma época, entre 1817-1818, em que mais da metade do Brasil era composta de escravos (50,6%). Hoje cerca de 60% possui algo em seu sangue de escravos afro-descendentes. O catecismo que os padres ensinavam aos escravos era “paciência, resignação e obediência”; aos escravocratas se ensinava “moderação e benevolência” coisa que, de fato, pouco se praticava. A escravidão foi internalizada na forma de discriminação e preconceito contra o negro que devia sempre servir. Pagar o salário é entendido por muitos ainda como  uma caridade e não um dever, porque os escravos antes faziam tudo de graça e, imaginam que devem  continuar assim. Pois desta forma se tratam, em muitos casos, os empregados e empregadas domésticas ou os peões de fazendas.

As consequências  destas duas tradições  estão no inconsciente coletivo brasileiro em termos, não tanto de conflito de classe (que também existe) mas  antes de conflitos de status social. Diz-se que o negro é preguiçoso quando sabemos que foi ele  quem construiu quase tudo que temos em nossas cidades. O nordestino é ignorante, porque vive no semi-árido sob pesados constrangimentos ambientais, quando é um povo altamente criativo, desperto e trabalhador. Do nordeste nos vêm grandes escritores, poetas, atores e atrizes. No Brasil de hoje é região que mais cresce economicamente na ordem de  2-3%, portanto, acima da média nacional. Mas os preconceitos os castigam à inferioridade.

Todas essas contradições de nossa “cordialidade” apareceram nos twitters, facebooks e outras redes sociais. Somos seres contraditórios em demasia.

Acrescento ainda um argumento de ordem antropológica para compreender a irrupção dos amores e ódios nesta campanha eleitoral. Trata-se da ambiguidade fontal da condição humana. Cada um possui a sua dimensão de luz e de sombra, de sim-bólica (que une) e de dia-bólica (que divide). Os modernos falam que somos simultaneamente dementes e sapientes (Morin), quer dizer, pessoas de racionalidade e bondade e ao mesmo tempo de irracionalidade e maldade. A tradição cristã fala que somos simultaneamente  santos e pecadores. Na feliz expressão de Santo Agostinho: cada um é Adão, cada um é Cristo, vale dizer, cada um é cheio de limitações e vícios e ao mesmo tempo é portador de virtudes e de uma dimensão divina.  Esta situação não é um defeito mas uma característica da condition humaine. Cada um deve saber equilibrar estas duas forças e na melhor das hipóteses, dar primazia às dimensões de luz sobre as de sombras, as de Cristo sobre as do velho Adão.

Nestes meses de campanha eleitoral se mostrou quem somos por dentro, “cordiais” mas no duplo sentido:  cheios de raiva e de indignação e ao mesmo tempo de exaltação positiva e de militância séria  e auto-controlada.

Não devemos nem rir nem chorar, mas procurar entender. Mas não é suficiente entender; urge buscar formas civilizadas da “cordialidade” na qual predomine a vontade de cooperação em vista do bem comum, se respeite o legítimo espaço de uma oposição inteligente e se acolham as diferentes opções políticas. O Brasil precisa se unir para que todos juntos enfrentemos os graves problemas internos e externos (guerras de grande devastação e a grave crise no sistema-Terra e no sistema-vida), num projeto por todos assumido para que se crie o que se chamou de o Brasil como a “Terra da boa Esperança”(Ignacy Sachs).


Com Jornal do Brasil/Geledes


Se prepare para o ENEM 2014: Simulados Online de História Geral e do Brasil


Alunos da EEEP Wellington Belém de Figueiredo, em Nova Olinda.
Faltando cinco dias para o Exame Nacional do Ensino Médio – ENEM, o site do História Online publicou neste domingo, 02 de novembro, uma lista de exercícios e provas dos principais vestibulares do Brasil que permitirão aos mais de 8,7 milhões de candidatos realizarem uma boa prova de história nos dias 07 e 08, sábado e domingo próximos.

O simulado online conta com 30 (trinta) questões de exames anteriores da disciplina de História, divididas em História Geral e História do Brasil.

A você que está buscando uma vaga em instituições de ensino superior públicas, como universidades e institutos federais, se prepare bem.

Para ter acesso ao simulado clique aqui


Reforma Política: Entenda a Diferença entre Plebiscito e Referendo


Para que a presidente reeleita, Dilma Rousseff, tenha êxito em sua principal proposta para seu segundo mandato, a aprovação de uma reforma política, ela terá de se entender com o Congresso quanto à melhor forma de consultar a sociedade no processo.

A proposta original de Dilma é pela convocação de um plebiscito para tratar do tema. Já os dirigentes da Câmara e do Senado preferem que os eleitores participem da reforma por meio de um referendo. A posição do Congresso nesse tema é crucial, já que cabe ao órgão decidir qual modelo será adotado.

Dilma travará árdua batalha com o Congresso Nacional para
conseguir realizar a Reforma Política. Duas vias são plebiscito
e Referendo. (Divulgação)
Os pontos de vista distintos já provocam atritos entre as autoridades. Na terça-feira, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), disse que “o Congresso pagará caro pela omissão” se autorizar a convocação de um plebiscito, delegando aos eleitores o poder de definir os rumos da reforma.

O presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), reforçou a posição de Renan e culpou o PT pela não aprovação de uma proposta de reforma no ano passado.

Também na terça, Dilma flexibilizou sua posição ao dizer em entrevista que “não interessa muito se é referendo ou plebiscito”. A BBC Brasil formulou perguntas sobre o que muda caso cada processo seja adotado.

Qual a diferença entre referendo e plebiscito?

A principal distinção é que um plebiscito é convocado antes da elaboração de um ato legislativo ou administrativo que trate do assunto em questão. Já um referendo é convocado posteriormente, para que a população aprove ou rejeite a proposta já elaborada.

De que maneira essas diferenças influenciariam na reforma política?

Pela proposta de Dilma, um plebiscito sobre a reforma política permitiria aos brasileiros posicionar-se sobre vários temas. Eles poderiam, por exemplo, decidir se o financiamento das campanhas deve ser público, privado ou misto; se o voto deve ser nos partidos, em listas fechadas, ou em candidatos; se deve ser criada uma cláusula de barreira para impedir que partidos pequenos assumem lugares na Câmara; e se a reeleição deve ser proibida.

Caberia ao Congresso decidir quais perguntas serão feitas e elaborar uma proposta que respeitasse os resultados da consulta. Esse modelo daria aos eleitores maior poder na elaboração da proposta.

No caso de um referendo, o Congresso elaboraria uma proposta de reforma, e os eleitores teriam apenas o poder de chancelar ou vetar o projeto como um todo, sem poder modificá-lo. Esse modelo daria ao Congresso mais poder na elaboração da proposta.

Quais os argumentos favoráveis e contrários aos dois modelos?

Defensores do plebiscito dizem que, se a elaboração da reforma ficar a cargo do Congresso, dificilmente serão aprovadas medidas que descontentem deputados e senadores. A reforma, dizem eles, provavelmente seria tímida.

Eles afirmam que um plebiscito atenderia os anseios dos manifestantes que foram às ruas em junho de 2013 e pediram maior participação da sociedade nas decisões do Estado.

Já os defensores do referendo dizem que um plebiscito teria perguntas muito específicas e que dificilmente os eleitores estarão informados o suficiente para respondê-las. Afirmam, ainda, que as opções dos eleitores poderiam produzir uma proposta “frankenstein”, difícil de pôr em prática.

Eles dizem que o Congresso é o órgão mais capacitado para a tarefa e detém a legitimidade para executá-la, por ser composto por deputados e senadores eleitos pelo povo. Afirmam, ainda, que a realização de um plebiscito reduziria a importância do Legislativo, afetando o equilíbrio entre os Três Poderes.

Quais foram os últimos plebiscitos no Brasil?

O último plebiscito estadual ocorreu em 2011, no Pará, quando os eleitores do Estado decidiram se as regiões de Carajás e Tapajós deveriam se tornar Estados autônomos. A maioria dos paraenses rejeitou a divisão.

O último plebiscito nacional ocorreu em 1993, quando os brasileiros puderam optar qual regime de governo vigoraria no país: se monarquia ou república e se parlamentarismo ou presidencialismo. Venceu a proposta por uma república presidencialista, regime que já vigorava.

Quais foram os últimos referendos?

No último referendo estadual, em 2010, os eleitores do Acre decidiram se o fuso horário no Estado deveria ser voltar a ser de duas horas a menos que Brasília, após ter sido alterado para uma hora a menos. A maioria aprovou a mudança para o horário antigo.

O último referendo nacional ocorreu em 2005, quando a população foi consultada sobre a proibição do comércio de armas de fogo no país.

A proibição estava prevista em artigo do Estatuto do Desarmamento, que havia sido aprovado em 2003. Os brasileiros, porém, rejeitaram a mudança.

Com BBC/Pragmatismo Político

Ao Falar de Reforma Política, Cristovam Cita 08 Pontos que Levam a Política a Está Prisioneira do Financiamento


O Brasil chega a 200 anos de sua emancipação política sem conseguir fazer a emancipação de sua política.

Nossa política está prisioneira do elevadíssimo custo de campanha, que amarra a eleição à disponibilidade de recursos financeiros. Conforme o TSE, em 2014 foram gastos cerca de R$ 74 bilhões por 25 mil candidatos. Para 1.689 eleitos, o custo foi de cerca de R$ 3 milhões por candidato, R$ 43,8 milhões por eleito, mais de R$ 500 por eleitor.

Cristovam Buarque é senador pelo PDT, do DF. 
Por causa deste elevado custo, a política está prisioneira do sistema de financiamento. O candidato precisa ter acesso a fontes que amarram os eleitos, comprometendo-os com os interesses dos financiadores.

A terceira amarra são os institutos de pesquisas e os marqueteiros. Os primeiros dizem o que o candidato deve falar; os outros, como falar, qual a mídia a ser utilizada, a mentira a ser construída. Os institutos também amarram os eleitores ao apresentar resultados que indicam vencedores antes da data.

Esta eleição mostrou que estamos prisioneiros da mitologia de que alguns são de esquerda e outros de direita, quando na realidade as coligações e os partidos são todos igualmente desideologizados.

Uma quinta prisão são os programas assistenciais que amarram os votos de seus beneficiários aos candidatos que conseguem se apropriar da paternidade do programa e dá garantia de que ele será mantido. O assistencialismo amarra os opositores ao risco de que, se eleitos, paralisarão o programa, e aos situacionistas porque se transformam em partidos que dependem da continuação da miséria para conseguirem os votos que precisam. A emancipação dos pobres emanciparia a política, desmoralizando os donos dos programas assistencialistas.

Sexta prisão é o silêncio dos intelectuais, paralisados na reverência ao poder, incapazes de oferecer alternativas que sirvam de base a propostas de reformas sociais que, ao emancipar o povo, emanciparia a política.

Sétima amarra é a cooptação, por compra de agentes políticos, como no caso do mensalão, ou por financiamento e beneficiamento a ONGs, sindicatos e associações.

A oitava prisão é o aparelhamento do Estado pelo partido no poder. Pela tradição de tratar o Estado como propriedade das elites no poder, cada vez que muda o governo costuma-se nomear dezenas de milhares de pessoas para empregos públicos, aprisionando a política à necessidade de sobrevivência dos servidores empregados, dependentes da continuidade.

Se quisermos emancipar a política, antes do segundo centenário da emancipação política, serão necessárias duas ações. A primeira é uma revolução educacional que permita emancipar o povo de dependência de auxílios, para que o eleitor possa votar sem dever favor ao partido no poder. A segunda é uma reforma radical na maneira como a política é feita, derrubando cada uma das amarras. A primeira depende de tempo, a segunda da vontade dos eleitos amarrados. Por isso, dificilmente haverá tempo para emancipar a política antes do bicentenário da emancipação política.

Texto publicado originalmente no O Globo

Personalidades Negras que Mudaram o Mundo: Beatriz Nascimento


Quem mergulha nos pensamentos, nas angústias e na história de vida da guerreira negra Beatriz Nascimento, que deu a vida em defesa do respeito à dignidade feminina, nunca mais se sentirá como era antes. Uma história que se inicia em Aracaju, e prossegue, em 1945, quando Beatriz tinha três anos, assim como na canção de Dorival Caymmi: "peguei o Ita no norte pra vir pro Rio morar...". Foi exatamente nesse famoso navio de retirantes que embarcaram o pedreiro Francisco Xavier Nascimento, a dona de casa Rubina Pereira Nascimento e seus 11 filhos, na década de 50, para desembarcar em meio às imensas dificuldades de uma cidade em ebulição político-social, carente de infraestrutura, que já não comportava sua população negra pobre imigrante.

Nesse universo e realidade foram forjadas tanto a personalidade quanto as reflexões que se constituem no pensamento vivo dessa intelectual que iniciou sua graduação em História, na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), aos 28 anos. A quantidade de horas-aula, em escolas da rede pública de ensino que precisava cumprir, para garantir a própria sobrevivência, jamais foi desculpa para Beatriz Nascimento não prosseguir sua dedicação à pesquisa sobre questões relacionadas com a história e a cultura afro-brasileiras.

Militância, debates, negritude

A opressão da ditadura, marcadamente após 1968, com o Ato Institucional número 5, produziu nos movimentos sociais da época o efeito de uma mola: quanto maior a compressão, maior o impulso da reação. Desta forma, o movimento negro e o estudantil, principalmente nos grandes centros urbanos, reagiram tanto com manifestações e reivindicações quanto com a busca de aprofundamento na busca de conhecimentos sobre as questões de seu interesse. Na Universidade Federal Fluminense (UFF), em 1974, onde posteriormente fez sua pós-graduação, Beatriz liderou a criação do Grupo de Trabalho André Rebouças e, por meio dele, conectava-se com pesquisadores negros e brancos que produziam saberes no país e fora dele. Ao mesmo tempo, compartilhava suas reflexões com os demais por meio de conferências e debates, como os que ocorriam, anualmente, nas Semanas de Estudos sobre a Contribuição do Negro na Formação Social Brasileira. O GT André Rebouças publicou três edições de um caderno que documentam esses eventos.

Só se é capaz de combater com eficácia o que se conhece bem. Era para enfrentar o racismo que Beatriz Nascimento se dedicava tão intensamente aos estudos. Muitos de seus artigos publicados, entrevistas, conferências, explanações e debates, em seminários e entre as militâncias, abordam a correlação entre a corporeidade negra e seus espaços permanentes - como quilombos e outros dedicados à religiosidade de matriz africana - ou transitórios, como os bailes black, os clubes sociais negros e as escolas de samba.

Suas palavras-chave são "transmigração" - sobre os deslocamentos dos africanos e afrodescendentes, ao longo do tempo, por exemplo, da senzala para o quilombo, do campo para a cidade, do Nordeste para o Sudeste - e "transatlanticidade" - decorrente da diáspora africana que recria a cultura negra na relação intercontinental -. Daí a expressão que deu origem ao título da obra do antropólogo Alex Rattz, da Universidade Federal de Goiás, Eu sou Atlântica - sobre a trajetória de vida de Beatriz Nascimento, publicada pela Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, em parceria com o Instituto Kuanza, em 2007.

Beatriz também se valeu da arma chamada palavra com a qual construiu poemas que desnudam sua alma de mulher negra. Ela faz parte de uma história de mulheres que combateram frontalmente o sexismo, o machismo e as violências domésticas. Pagou com a própria vida a solidariedade de abrigar, em sua casa, uma amiga, vítima desse tipo de violência. Era 28 de janeiro de 1995. O criminoso era um presidiário beneficiado pelo indulto de Natal, que não retornou à prisão na data determinada. Comenta-se que pertenceria ao esquadrão da morte, raiz das atuais milícias que promovem o genocídio da juventude negra. Que falta nos faz Beatriz Nascimento para enfrentar, de cabeça erguida, mais essa prática racista!


Pretas Simoa realiza roda de conversa sobre a ativista negra nordestina Beatriz Nascimento


O Grupo de Mulheres Negras no Cariri - Pretas Simoa estará  promovendo no dia  15 de novembro, na praça do Giradouro, em Juazeiro do Norte, uma reunião de formação entre os membros do grupo objetivando discutir sobre a ativista negra e nordestina Beatriz Nascimento.

Segundo Karla Alves, uma das líderes do movimento negro, a roda de conversa terá como eixo norteador a obra do professor Alex Ratts - doutor em Antropologia Social pela Universidade de São Paulo, coordenador do Laboratório de Estudos de Gênero, Étnico-Raciais e Espacialidades do Instituto de Estudos Sócio-Ambientais da Universidade Federal de Goiás (LaGENTE/IESA/UFG). O livrro referenciado será  "Eu sou Atlântica: sobre a trajetória de vida de Beatriz Nascimento".

Os interessados na temática podem adquirir o livro a um preço de R$ 9,25, disponível na Amorim Xérox, em Crato, na pasta de mesmo nome do grupo. O  encontro também será aberto ao púlico e está previsto para ter início as 16h00.