Do
BBC
O
Brasil ficou atrás de 15 países da América Latina e Caribe, entre eles
Nicarágua, Equador, Cuba, Colômbia e Venezuela, em um ranking sobre bebês que
morrem antes do nascimento, logo depois ou durante o parto.
De
acordo com o estudo, o Brasil subiu duas posições em 15 anos, passando de um
índice de 12,1 natimortos por 1000 nascimentos em 2000 para 8,6 em 2015. Ainda
assim, o índice é quase três vezes pior do que no Chile (3,1), país melhor
qualificado da região.
Na
listagem global, o Brasil ficou em 78º lugar do ranking (de 195 países), parte
de um amplo e detalhado estudo feito periodicamente pelo London School of
Hygiene and Tropical Medicine, da Universidade de Londres, chamado "Ending
Preventable Stillbirths" (colocando um fim em casos de natimortos evitáveis,
em tradução livre) e publicado nesta terça-feira na revista científica Lancet.
Natimortos,
no estudo, é definido como morte do feto com idade gestacional de 28 semanas
(por volta de 7 meses) ou mais.
Mas
o que está por trás desse resultado? Por que o Brasil está tão mal nesse
quesito na comparação com outros países de sua região?
Disparidades
Em
entrevista à BBC Brasil, a médica e pesquisadora Hannah Blencowe, uma das
responsáveis pelo estudo, disse que "em primeiro lugar, é preciso ter em
mente que, no Brasil, a qualidade dos serviços de saúde varia muito dependendo
da região do país ou da classe social", diz.
"O risco de um bebê natimorto se multiplica
entre populações de baixa renda em um mesmo país."
A
pesquisadora também afirma que, no caso brasileiro, apesar de não ser uma das
causas diretas de um índice alto de natimortos, as altas taxas de cesáreas
podem indicar um preocupante desvio de foco no acompanhamento da saúde das
mulheres grávidas.
"Os dois problemas apontam para a mesma
questão: 'A mulher está recebendo o melhor tratamento possível, um tratamento
cujo foco é o bem-estar dela e de seu bebê?' Quando se vê bebês nascendo com
idade gestacional de 37 semanas em cesáreas marcadas, fica claro que não."
Hannah
afirma ainda estar ciente de que a epidemia de cesáreas no Brasil tem inúmeros
fatores, inclusive a pressão dos médicos para se agendar uma cesárea, mesmo
quando não há razões médicas claras para isso, além do fato de parte das
mulheres acreditar que marcar a data do parto é algo normal.
"Esse
alto número de cesáreas pode indicar que, no Brasil, há um foco muito grande na
data do parto, e se deixa de lado questões mais importantes, como monitorar o
crescimento do bebê e acompanhar bem de perto problemas como diabetes, que
podem ser controlados."
Exemplo dos vizinhos
O
estudo cita exemplos de práticas adotadas por outros países - que poderiam
servir de inspiração para melhorar a situação por aqui.
Um
dos casos positivos citados pela pesquisadora é a prática do governo chileno em
registrar em detalhes os casos de natimortos.
"É claro que é uma tragédia. E ninguém quer
falar sobre isso. Mas o governo brasileiro poderia contabilizar melhor e com
mais detalhes o número de natimortos. Não é uma questão de apontar dedos, mas
sim de olhar de perto para os casos e ver o que aconteceu."
Cuba
também entrou no estudo como o país da região que está fazendo mais progressos
na redução do número de bebês que morrem antes de nascer.
Entre
as razões para esse avanço estão um atendimento médico durante a
gravidez de qualidade e acessível a maior parte da população.
E
a pesquisa deixa claro que um país com pré-natal eficiente precisa
diagnosticar, tratar com seriedade ou acompanhar de perto fatores que podem levar
à morte de um bebê.
Diabetes,
pressão alta e obesidade estão no topo da lista, assim como o tabagismo.
Segundo o estudo, ao menos 10% das mortes desses bebês estão ligadas à
hipertensão e outros 10% a diabetes.
Os
pesquisadores também afirmam que países que agem para evitar que adolescentes
fiquem grávidas se saem melhor. Acompanhar com mais atenção grávidas com mais
de 40 anos também é recomendável. Nos dois casos, são gestações que podem trazer
mais riscos à mãe e ao bebê.
Outros
fatores de riscos apontados no levantamento são infecções durante a gravidez -
8% desses bebês morrem por a mãe ter contraído malária e 7,7%, sífilis.
Consequências ocultas
Para
Hannah Blencowe, outro ponto no qual o Brasil pode avançar é "aprender a
lidar melhor com as mulheres e as famílias que tiveram um bebê natimorto, dando
voz a eles e melhorando o tratamento, especialmente psicológico, a essas
pessoas".
O
estudo destaca que o impacto psicológico, social e até econômico nas famílias
que perdem um bebê precisa ter mais atenção dos governos.
Novos
estudos citados pela pesquisa sugerem que 4,2 milhões de mulheres em todo o
mundo estejam vivendo com sintomas de depressão por terem perdido um bebê.
Segundo o levantamento, elas sofrem estresse psicológico, estigma e isolamento,
além de estarem mais vulneráveis a abusos, violência doméstica e a problemas
familiares.
Os
pesquisadores também detalham como o pai de um bebê que morreu também sofre com
o luto. Metade dos pais entrevistados nos países desenvolvidos, por exemplo,
disse sentir que a sociedade queria que eles esquecessem o bebê natimorto e
tentassem ter outro filho.
160 anos
No
geral, o estudo conclui que há uma epidemia global negligenciada: são 2,6
milhões de bebês natimortos por ano em todo o mundo.
E
afirma que o avanço na prevenção dessas mortes prematuras vem sendo
extremamente lento. E a grande maioria dos casos (98%) está em países de renda
média ou baixa. Segundo a pesquisa, no ritmo atual de progresso, vai levar mais
de 160 anos para que uma grávida na África tenha as mesmas chances de seu bebê
nascer vivo do que uma mulher em um país rico.
Um
dos colegas de Hannah, a co-autora do estudo Joy Lawn, faz um apelo em sua
conclusão da pesquisa:
"Precisamos
dar voz a essas mães de 7.200 bebês que nascem mortos diariamente no mundo. É
um erro acreditar que muitas dessas mortes são inevitáveis. Metade dessas 2,6
milhões de mortes anuais poderiam ser evitadas com melhorias no tratamento de
mães e bebês durante o parto e no pré-natal."
MELHORES
1
Islândia 2. Dinamarca 3. e 4. Finlândia e Holanda (empatados) 5 Croácia
PIORES
1. Paquistão 2. Nigéria 3. Chade 4 e 5.Níger e Guiné-Bissau (empatados)