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Silvio Almeida freia teatro de senador cearense com feto plástico: 'Exploração inaceitável'

 

(FOTO | Reprodução | Twitter de Carol Dartora).

O ministro dos Direitos Humanos e Cidadania, Silvio Almeida, mostrou ao senador bolsonarista Eduardo Girão (Podemos-CE) como deve ser feito o debate político sério e respeitoso. Em audiência no Senado nesta quinta-feira (27), Almeida criticou Girão após tentativa de constrangimento com a entrega de um boneco plástico simulando um feto.

"Com todo respeito, é uma exploração inaceitável de um problema muito sério que temos no país. Em nome da minha filha que vai nascer, eu me recuso a receber isso aí", disse o ministro, sendo fortemente aplaudido pelas pessoas que compareceram à audiência.

No início deste mês de abril, a esposa de Almeida, a estilista Ednéia Carvalho, anunciou a gestação da primeira filha do casal, que está junto há 17 anos.

No episódio desta quinta, Girão seguiu a cartilha habitual dos parlamentares bolsonaristas no congresso, tentando fazer uma cena teatral de mau gosto para garantir "cortes" para as redes sociais. Ele se levantou da cadeira onde estava sentado e se dirigiu à mesa onde estava o ministro. "Já que a gente entrou na questão da dignidade humana, vou materializar a entrega dessa criança com 11 semanas de gestação", disse o senador, enquanto se aproximava de Almeida.

"Eu não quero receber isso, por um motivo muito simples. Eu vou ser pai, agora. Eu sei muito bem o que significa isso. É uma performance que eu repudio profundamente", respondeu o ministro, com a elegância que lhe é habitual.

"Isso é um escárnio. E falo com muito respeito, respeitando seu cargo. Eu não vou aceitar esse tipo de coisa. Eu sou um homem sério, e acredito que o senhor também seja. Esse tipo de performance aqui não é o que condiz com minha maneira de ver a política", prosseguiu Almeida.

Sem alternativas, Girão abaixou a cabeça e retornou à cadeira onde estava sentado, se limitando a dizer que respeitava a postura do ministro dos Direitos Humanos.

"Se o senhor fizer uma pergunta séria eu vou com maior prazer, mas esse tipo de performance é inaceitável, uma exploração de um problema muito sério que nós temos no Brasil e no Mundo. Isso aí eu não aceito", complementou o ministro.

Repercussão

O caso repercutiu fortemente nas redes sociais. A grande maioria das pessoas ressaltou a postura do ministro, destacando a seriedade com que derrubou a tentativa de constrangimento do senador. Sempre ativos nas redes sociais, os bolsonaristas evitaram dar espaço para o tema.

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Com informações do Brasil de Fato.

Mulheres fazem ato contra PEC 181 e a cultura do estupro


Representantes de movimentos feministas, sociais e sindicais aproveitaram o dia de mobilização contra a reforma da Previdência para protestar contra a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 181, que proíbe qualquer possibilidade de aborto no país. A partir das 14h, elas começaram a se concentrar no vão livre do Masp, na Avenida Paulista. Espalharam faixas roxas e começaram a discursar contra os retrocessos da proposta, que ficou conhecida como Cavalo de Troia.

As mulheres defenderam a soberania sobre  o próprio corpo, sobre o direito de decidir por um aborto e também sobre questões de saúde. Para a integrante da coordenação da Marcha Mundial das Mulheres e do instituto Sempre Viva Sonia Coelho, a PEC tira direitos da mulher, inclusive à vida, e encoraja a cultura do estupro. "A Constituição não define o começo da vida, e esse Congresso conservador quer definir. Uma mulher estuprada não poderá fazer o aborto a que hoje tem direito. E se chegar ao hospital com risco de vida, vai morrer, deixando filhos pequenos, porque o aborto será proibido também nesse caso", afirma.

Para Sonia, o Congresso vai legitimar um crime hediondo como o estupro e torturar a mulher pelo resto da vida. "Conheço mulheres com filhos do estupro e nem sempre o amor que se cria é suficiente para superar o trauma". Ela lembra que apesar do caráter machista e misógino da proposta, e da supremacia desse grupo no congresso, há muita resistência à medida, como a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

"Cria-se ainda um problema de saúde pública, porque as mulheres continuarão recorrendo ao aborto clandestino, repleto de riscos, ao qual recorrem as mais pobres, negras, da periferia, que vão morrer. As ricas vão a clínicas bem equipadas".

Dirigente do Sindicato dos Trabalhadores na Administração Pública e Autarquias no Município de São Paulo (Sindsep) e integrante do Conselho Municipal de Saúde, Ana Rosa Garcia lembra que a comissão que analisa a PEC não leva em conta que 60% da população considera que a mulher não deve levar adiante uma gravidez em caso de estupro, quando sua vida esta em risco ou caso de feto anencéfalo.

"Vamos aumentar a pressão e a mobilização, nas ruas, contra essa medida que põe em risco a vida de mulheres. "Ocupamos a Casa da Mulher (com obra concluída, mas não inaugurada até agora pela gestão Doria) e vamos ocupar outros espaços." (Com informações da RBA).


Problema de saúde pública: mulheres continuarão recorrendo ao aborto clandestino, repleto de riscos.
(Foto: Reprodução).

Casamento gay e aborto podem ser discutido nesta semana no Congresso Nacional



Como não há previsão para a votação da reforma da Previdência, o Congresso Nacional deverá analisar nesta semana propostas que tratam do casamento entre pessoas do mesmo sexo e do aborto. Os senadores podem votar um projeto que altera o Código Civil para assegurar, em lei, o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Se for aprovada, a proposta será enviada à Câmara.

O projeto foi apresentado pela senadora Marta Suplicy (PMDB-SP) e estabelece como entidade familiar a “união estável entre duas pessoas”. Atualmente, o Código Civil considera entidade familiar somente a “união estável entre o homem e a mulher”.

Relator da proposta, Roberto Requião (PMDB-PR) acrescentou ao projeto adequações a serem feitas no Código Civil. Requião quer substituir nos trechos relativos à união estável e casamento palavras como “marido” e “mulher” por “duas pessoas” ou “cônjuges”.

Desde 2011, o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconhecem a união estável entre casais gays. Além disso, em 2013, uma resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) obrigou cartórios a realizarem casamentos entre pessoas do mesmo sexo e a converter união estável entre duas pessoas do mesmo sexo em casamento. Desde então, casamentos entre dois homens ou duas mulheres têm sido realizados, mas Marta Suplicy argumenta que somente uma lei dará “segurança jurídica” a essas uniões e evitará possíveis contestações à celebração dos casamentos. O projeto já foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado e seguiria direto para a Câmara, mas, como a proposta enfrenta resistência por parte de alguns parlamentares, senadores da bancada evangélica recorreram para que o tema fosse analisado pelo plenário do Senado.

Enquanto isso na Câmara, a comissão especial que discute o aborto deve concluir nesta semana a votação da PEC que prevê a garantia do direito à vida “desde a concepção”, o que, na prática, pode proibir qualquer forma de aborto, mesmo aquelas previstas na legislação. Atualmente, o aborto é permitido nos casos em que a mulher for vítima de estupro; a gravidez representar risco à vida da mãe e o feto for anencéfalo. (Com informações da Revista Fórum/ G1).

(Foto: Jefferson Rudy/ Agência Estado).

Ministro da Saúde quer igrejas no debate sobre aborto



O ministro da Saúde, Ricardo Barros, afirmou que quer envolver as igrejas na discussão sobre aborto no Brasil.

O ministro reconheceu que o país enfrenta um problema relacionado ao tema, com grande número de procedimentos realizados de forma inadequada e muitas mortes. "Como é o crack. É uma entre outras mazelas que precisam ser cuidadas pelo poder público", disse.

Publicado no Uol Notícias

Deputado federal licenciado (PP-PR) e ex-relator do orçamento, Barros já tem definido o valor que vai pedir numa reunião programada para a quarta-feira (18), com o ministro do Planejamento, Romero Jucá: R$ 14 bilhões, recursos que já estavam previstos para a pasta, acrescidos de pagamentos a prestadores de serviço e fornecedores que não foram quitados em anos anteriores. A seguir, principais trechos da entrevista.

Como o senhor pretende tratar o tema do aborto?

Ricardo Barros - Esse é um tema delicado. Recebi a informação de que é feito 1,5 milhão de abortos por ano. Desse total, 250 mil mulheres ficam com alguma sequela e 11 mil vão a óbito. Esse é um tema que vou estudar com muito carinho com nossa equipe. Vou ver com o governo qual será nossa diretriz para agir nessa direção. Essa é uma decisão de governo. Não de um ministério, algo que possa ser decidido individualmente.

O senhor considera aborto um problema de saúde pública?

Esse é um problema que existe e precisa ser cuidado. Como é o crack. Como tantas outras mazelas da sociedade que precisam ser cuidadas pelo poder público. Mas a maneira como vamos abordar isso vai depender de discussões. Vamos ter de conversar com a igreja. A decisão do ministério não deve provocar resistência ou discussão. Temos de ajustar. Antes de propor uma política para isso, vamos ter de realizar um diálogo muito amplo.

Não há um risco de se demorar muito tempo para que um consenso seja alcançado? O senhor trabalha com algum prazo?

Se você acompanhar o meu ritmo, vai saber que o longo prazo para mim é muito rápido. Farei essa interlocução muito rapidamente. A primeira ação será ouvir. Isso vale para vários assuntos.

O senhor tem como meta uma gestão de consenso?

Vou ouvir o máximo que eu puder para que toda ação do ministério seja um pacto, não apenas uma proposta. Vou propor algo que quem está lá na ponta vai praticar. Para não ficar uma coisa como o ministro sugere e depois provoca discussão, não é feito. Vou combinar especialmente com prefeitos. Visitarei todos os Estados.

O governo vai regulamentar a lei que libera o uso da fosfoetanolamina, a pílula do câncer?

Há possibilidade de que seja regulamentada por meio de decreto. Mas será decisão do governo.

De todas demandas ouvidas, qual é a prioridade?

Há dificuldade de financiamento. Vou ouvir os prefeitos, temos de fazer uma articulação ampla. E fazer algo que possa alcançar o maior número de pessoas. Vou tratar gestão, governança, prevenção e informação. A prioridade hoje é informação. Quero ter a capacidade de saber como cada real do SUS é gasto, online.

O senhor falou em pôr em prática o Cartão SUS, algo que é proposto há pelo menos 15 anos. Há dinheiro para isso? Por que isso não foi em frente?

Os recursos disponíveis no DataSus deverão ser redirecionados para essa tarefa. Se conseguir informatizar toda estrutura do SUS saberei como cada cidadão é atendido. Resolveremos o problema dos cartões duplicados. Hoje existem cerca de 300 milhões, número muito acima da nossa população. O sistema já foi implementado, mas precisa ser aprimorado para que duplicações desapareçam. É o mesmo problema da Cédula de Identidade, que pode ser feita em 27 Estados.

Qual a verba que o senhor pleiteia para levar adiante seus projetos no ministério?

Na quarta à tarde vou falar com ministro do Planejamento, Romero Jucá. Vou pedir que o que está no orçamento seja cumprido. Nem um centavo a mais. E vou pedir restos a pagar (dívidas adquiridas com prestadores de serviços e fornecedores que não foram pagas até o momento). Eu gostaria de ter recursos para cumprir tudo o que está contratado e cumprir os restos a pagar. Não sei se o ministro vai conseguir. Ele terá de discutir com o Congresso Nacional a meta fiscal deste ano. E essa proposta terá de refletir todas as demandas que ministros estão apresentando para ele. Esse dinheiro vai ter de ser emprestado. Vai ser necessário emitir letras do Tesouro para pagar essa conta.

O Ministro da Saúde, Ricardo Barros, durante entrevista.

Drauzio Varella: 'Aborto já é livre no Brasil. Proibir é punir quem não tem dinheiro'



Médico mais popular do Brasil, conhecido por quadros na televisão, vídeos em redes sociais e best-sellers como Estação Carandiru, Drauzio Varella é categórico quando o assunto é a interrupção de gestações. "O aborto já é livre no Brasil. É só ter dinheiro para fazer em condições até razoáveis. Todo o resto é falsidade. Todo o resto é hipocrisia."

Em entrevista por telefone, Varella critica qualquer enfoque religioso sobre o tema - que voltou ao noticiário junto à epidemia de zika vírus e aos recordes em notificações de microcefalia - e afirma que o cerne da discussão não está na moralidade, mas na desigualdade brasileira.

O médico Drauzio Varella, em imagem capturada do youtube.
"Ninguém pode se considerar dono da palavra de Deus, intermediário entre deuses e seres humanos, para dizer o que todos devem fazer", diz. "Muitos religiosos pregam que o aborto não é certo. Se não está de acordo, não faça, mas não imponha sua vontade aos outros."

Como a BBC Brasil revelou na última quinta-feira, uma ação que pede a descriminalização do aborto em casos comprovados desta má-formação deve chegar ao Supremo Tribunal Federal, nos próximos dois meses. Segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde), uma brasileira morre a cada dois dias por conta de procedimentos mal feitos e um milhão de abortos clandestinos seriam feitos no país todos os anos.

"A mulher rica faz normalmente e nunca acontece nada. Já viu alguma ser presa por isso? Agora, a mulher pobre, a mulher da favela, essa engrossa estatísticas. Essa morre."

"Proibir o aborto é punir quem não tem dinheiro", prossegue Varella, que não acredita que uma eventual descriminalização possa estimular que mulheres busquem o procedimento.

"Não sou defensor do aborto e ninguém é. Qual é a mulher que quer fazer o aborto? É uma experiência absurdamente traumatizante, uma tragédia. A questão não é essa."

Também segundo a OMS, cerca de 25 países já registram casos de zika. Apenas Brasil e Polinésia Francesa, entretanto, têm dados comprovando o aumento de casos de microcefalia em recém-nascidos.

Varella diz não ter opinião formada sobre o aborto neste caso específico. "Na microcefalia, o diagnóstico definitivo é feito em geral próximo ao 3º trimestre. Você pega um feto aos sete meses e ele está quase nascendo", diz. "Mas é lógico que eu respeito (qualquer decisão)."

"O importante é dar liberdade aos que pensam diferente", afirma o médico. "Essa é a questão fundamental do aborto."

Varella então levanta a pergunta: se a doação de órgãos em caso de inatividade cerebral tem aceitação popular, por que a retirada de um feto igualmente sem atividade cerebral é criticada?

Ele dá o exemplo de uma menina que sofre um acidente de moto e tem morte cerebral. "Ela pode, por lei, ter fígado, coração e rins retirados para doação, porque seu sistema nervoso central não está mais funcionando. O sistema nervoso central é o que determina a vida. Mas até o 3º trimestre de gravidez, não há nenhuma possibilidade de arranjo do sistema nervoso que se possa qualificar como atividade cerebral em qualquer nível, a não ser neurônios tentando se conectar."

Drauzio continua: "Muitos consideram que a vida humana começa no instante da fecundação. Mas, por esse raciocínio, a então vida começa antes, porque o espermatozoide é vivo e o óvulo também."

Religiosos e políticos

O médico faz críticas duras a quem argumenta contra o aborto a partir de princípios religiosos.

"O poder das igrejas católicas e evangélicas é absurdo", diz. "Mas não está certo a maioria impor sua vontade. Respeitar opiniões das minorias é parte da democracia. Tem que respeitar os outros, o modo dos outros de ver a vida."

À reportagem, Varella diz que discorda dos que culpam exclusivamente o governo pela epidemia.

"O estado brasileiro falha em muitos níveis. Mas não dá pra colocar a culpa toda no Estado, essa é uma visão muito passiva. Larga-se o pneu com água armazenada, deixa-se a água acumular na calha... Esta culpa é compartilhada, a sociedade tem uma fração importante nessa luta."

Do Outras Palavras - Aborto: o moralismo é impotente; porém, mata


Eis um fato que deveria ser conhecido por todos os que debatem o aborto: não há relação direta entre sua legalidade e sua incidência. Em outras palavras, proibir o aborto não detém sua prática; só o torna mais perigoso.



O debate sobre o aborto é apresentado como um conflito entre direitos dos embriões e direitos das mulheres. Reforce um – ambos os lados parecem às vezes concordar –, e você suprime o outro. Mas, uma vez que você compreenda que legalizar os direitos reprodutivos das mulheres não aumenta a incidência de abortos induzidos, resta apenas uma questão a ser debatida. Estes abortos devem ser legais e seguros ou ilegais e arriscados? Pergunta difícil…
Pode não haver relações causais entre direitos reprodutivos e incidência do aborto; mas há, sim, uma forte correlação: uma correlação inversa. Como afirma pesquisa publicada na revista Lancet, a mais recente sobre tendências e taxas globais, “A taxa de aborto é mais baixa … onde mais mulheres vivem sob leis liberais sobre o aborto”.

Por quê? Porque leis que restringem o aborto tendem a prevalecer em lugares onde é difícil de ter acesso à contracepção e à educação sexual abrangente, e nos quais sexo e gravidez fora do casamento são considerados uma maldição. Acontece que os jovens fazem sexo, não importa o que digam os mais velhos. Sempre fizeram e sempre farão. Quem tem menos informação e menor acesso a métodos contraceptivos muito provavelmente será mais suscetível a gravidez indesejada. E há maior incentivo para interromper gravidez do que uma cultura em que a reprodução fora do casamento é considerada pecado mortal?

Quantos séculos mais de sofrimento, mutilação e mortalidade serão necessários antes de compreendermos que as mulheres – jovens ou de meia idade, dentro ou fora do casamento – que não desejam um filho podem ir até extremos para por fim a uma gravidez indesejada? Quanta evidência precisamos mais de que, na ausência de procedimentos seguros, legais, serão utilizados instrumentos cirúrgicos sofisticados, como cabides de arame, agulhas de tricô, água sanitária e terebintina? Quantos mais ventres perfurados e rompimentos de útero serão necessários para reconhecermos que proibição e persuasão moral não irão derrotar a necessidade das mulheres de possuir suas vidas?

A mais recente meta-análise sobre tendências globais, publicada em 2012, descobriu que a taxa de abortos, após forte declínio entre 1995 e 2003, pouco mudou nos cinco anos seguintes. Mas a proporção dos abortos inseguros (o que, genericamente, significa ilegais), aumentou de 44% para 49%.

A maior parte dessa mudança deveu-se ao forte aumento dos abortos inseguros no oeste da 

Ásia (o que inclui Oriente Médio), onde ressurge o conservadorismo islâmico. Nas regiões em que a doutrina cristã tem maior influência na legislação – oeste e centro da África e América Central e do Sul – não houve aumento. Mas isso somente porque a proporção de abortos ilegais e inseguros já chegou a 100%.

Quanto às taxas globais de aborto induzido, os números contam uma história interessante. A Europa Ocidental tem a taxa mais baixa de interrupção da gravidez: 12 anuais para cada 1000 mulheres em idade reprodutiva. A América do Norte, mais religiosa, aborta 19 embriões para cada 1000 mulheres. Na América do Sul, onde (quando dados eram coletados) a prática era banida em todo lugar, a taxa era de 32. No Leste da África, onde leis ferozes e imposições religiosas poderiam – segundo teoria conservadora – ter exterminado a prática há muito tempo, era de 38.

O estranho valor discrepante está na Europa Oriental, onde se encontram as taxas de aborto mais altas do mundo. Sob o comunismo, o aborto era a única forma acessível de controle da natalidade com ajuda médica. A taxa caiu entre 1990 e 1995, à medida em que a contracepção ficou mais acessível, mas ainda há longo caminho a percorrer.

Mas de que servem os fatos? Nos estados republicanos dos EUA, os legisladores têm aprovado leis que tornam impossível gerir clínicas de aborto, ao mesmo tempo em que negam educação sexual efetiva às crianças. No Texas, graças a novas normas restritivas, mais da metade das clínicas fecharam desde 2013. Mas as mulheres ainda são obrigadas a visitá-las três vezes, antes de receber tratamento: em alguns casos, isso significa viajar mais de 1.500 quilômetros. Não por coincidência, 7% daquelas que buscam ajuda médica já tentaram suas próprias soluções.

A única razão pela qual isso não causou uma epidemia de trauma abdominal é a disponibilidade ampla de drogas abortivas (embora com venda não autorizada) tais como misoprostol [no Brasil, Cytotec] e mifepristone. Elas são inseguras quando usadas sem indicação profissional, mas não tão arriscadas como objetos perfurantes e soluções químicas domésticas.

Em junho, a Suprema Corte dos EUA irá julgar a constitucionalidade do ultimo atentado do Texas contra a interrupção legal da gravidez, a norma conhecida como HB2. Se o estado do Texas vencer, isso significa, de fato, o fim da decisão Roe versus Wade, que julgou o aborto um direito fundamental nos Estados Unidos.

Na Irlanda do Norte, a nova primeira ministra, Arlene Foster, que acaba de assumir, assegurou que a lei sobre aborto, de 1967, que incide sobre o resto do Reino Unido, não se aplicará a seu país. As mulheres, lá, continuarão a comprar drogas (e correr o risco de tê-las confiscadas) ou viajar para a Inglaterra, ao custo de despesa e trauma. Esqueça a sentença de um juiz da Suprema Corte: “não há evidência diante desta corte de que a lei na Irlanda do Norte tenha resultado em qualquer redução do número de abortos”. Aquece o coração ver fundamentalistas protestantes e católicos pondo de lado as diferenças para garantir que os corpos das mulheres permaneçam como propriedade do Estado.

Como eles, considero a vida preciosa. Como eles, quero ver a redução do número de abortos. 
De modo que clamo aos estados para fazer o oposto do que prescrevem. Se você deseja menos abortos induzidos, deve apoiar uma educação que encoraje as crianças a falar sobre sexo sem embaraço ou segredo; contracepção livremente disponível para todos; e acabar com o estigma em torno de sexo e gravidez fora do casamento.

Os religiosos conservadores que se opõem a essas medidas têm sangue nas mãos. São responsáveis pelas altas taxas de aborto. São responsáveis por lesões e morte de mulheres. E suas faces nem coram ao falar da santidade da vida.

O direito ao aborto e o Zika, por Jacqueline Pitanguy


Publicado originalmente no O Globo

Interrupção da gravidez como opção de mulheres atingidas pelo vírus não tem sido colocada, com a devida relevância, na discussão sobre essa calamidade nacional.

É imprescindível reconhecer que mulheres e homens têm o direito de tomar decisões e fazer opções existenciais e que uma das escolhas mais importantes na vida de uma mulher é ter filhos ou não. Em que circunstâncias gestar e parir, ou evitar uma gravidez, e quando interromper uma gestação — não como método de regulação da fecundidade, mas como último recurso frente a impossibilidade de assumir a enorme responsabilidade de ter um filho naquela situação — integram a agenda dos direitos individuais e da saúde pública.

A partir das décadas de 1960 e 70, assiste-se, em todo o mundo, à liberalização da legislação sobre o aborto. Na Europa, nos Estados Unidos, na Ásia, em alguns países africanos e, mais recentemente, da América Latina, legislações relativas ao abortamento vêm sendo modificadas, ampliando as circunstâncias em que é permitida a interrupção voluntária da gestação — com condicionantes que crescem em função do tempo gestacional, especialmente a partir das 12 primeiras semanas, posto que não se trata de um direito incondicionado.

Além do risco de vida da gestante, da interrupção em caso de gravidez resultante de estupro e de anomalia fetal incompatível com a vida — únicas circunstâncias previstas na legislação brasileira, uma das mais restritivas do mundo—, o risco à saúde física ou psíquica da gestante, anomalias fetais graves que comprometem a qualidade de vida e condicionantes sociais, dentre outros, são considerados fatores que permitem o abortamento voluntário, legal e seguro. O denominador comum dessas legislações é o reconhecimento de que a mulher tem direito à proteção e ao respeito à sua dignidade e integridade física e emocional — e que os direitos do nascituro não são absolutos e não se sobrepõem aos direitos fundamentais da mulher. Apesar de que a Constituição de 1988 reconhece os direitos reprodutivos e de que estes foram referendados pelo Brasil na Conferência da ONU sobre População e Desenvolvimento de 1994 e no Consenso de Montevidéu de 2013, o debate sobre o abortamento ocorre no marco da crescente politização do dogmatismo religioso, em que as dimensões de saúde e direitos se veem encobertas por uma estridente condenação moral ou criminal.

Entretanto, o contexto epidemiológico atual demanda, com urgência, um debate público republicano, plural e respeitoso sobre o direito à interrupção da gravidez, ancorado nos parâmetros da opção versus imposição autoritária. O vírus da zika — transmitido pelo mosquito Aedes aegypt, que há décadas sobrevoa as áreas urbanas de nosso país, tornando a dengue uma enfermidade endêmica e com letalidade preocupante — trouxe um novo componente para o debate sobre saúde publica e direitos humanos: a incidência da microcefalia em fetos de mulheres grávidas que tiveram zika.

Entretanto, a discussão sobre a possibilidade de interrupção da gravidez como uma opção dessas mulheres não tem sido colocada, com a devida relevância, no rol dos temas que acompanham o debate público sobre a calamidade nacional. Recomendações veiculadas pela imprensa a partir de autoridades da área da Saúde sugerem que as mulheres evitem engravidar ou mesmo que sejam picadas pelo mosquito e adquiram imunidade antes de engravidar.

Gestantes com medo de sair de casa, corrida a repelentes e o pânico de, após ter zika estar grávida de um feto microcefálico assombram milhares de mulheres pelo Brasil afora. Se a legislação brasileira acompanhasse a de países considerados exemplos de nações civilizadas, as mulheres que hoje enfrentam o pavor de estarem gestando um feto com microcefalia poderiam, em nome de seu direito à autonomia reprodutiva e à integridade emocional sua e de sua família, optar por levar adiante ou interromper essa gestação. Fora dos parâmetros da condenação moral e da criminalização e no marco do respeito à sua dignidade humana.

Código Penal tem pontos progressistas cortados



Presos na cadeia pública no Ceará. Parecer do relator prevê
mais tempo de detenção.
Quando foi elaborado, em 1941, o Código Penal brasileiro encontrava um Brasil muito diferente do atual: as mulheres nem de longe representavam os 45,4% da população economicamente ativa do País, o divórcio estava a 36 anos de ser previsto em lei, o que hoje são organizações criminosas e associações internacionais eram chamadas de bandos (inspirados em Lampião), e o tráfico de drogas não gerava monopólios ou redes de tráfico internacionais.

A sociedade mudou. O debate também. O foco hoje é sobre o casamento gay e a legalização das drogas, pontos inimagináveis há 72 anos. Mas, em vez de promover uma reforma condizente com a realidade atual, o que se vê é um combate a reformas progressistas antes mesmo de o novo código nascer.

Enquanto o vizinho Uruguai busca, a passos largos, um Estado progressista que dê soluções para problemas crônicos, com a descriminalização do aborto até a 12ª semana de gravidez, a legalização da maconha (com o Estado controlando a produção e venda), o Brasil parece caminhar na direção oposta. A proposta da Comissão de Reforma do Código Penal, composta por 16 juristas há dois anos para a elaboração do PLS 236/2012, retrocedeu antes de ser votada nas comissões e plenário do Senado.

Seu relator, o senador Pedro Taques (PDT-MT), limou em seu relatório os pontos mais progressistas (e polêmicos) que o texto proposto pelos juristas continha. Enquanto a comissão propunha que o aborto fosse permitido até a 12ª semana de gestação, o senador manteve a permissão apenas em casos de estupros ou anencefalia. No lugar do cumprimento de um sexto da pena para a progressão de regime, foi pedido pelo parlamentar a necessidade de o réu primário cumprir um quarto para passar do fechado para o semiaberto ou o aberto. Em vez de descriminalizar uma pequena quantidade de drogas que configure uso pessoal, Taques insistiu que, neste caso, o usuário passe por um processo e cumpra penas alternativas. 

Diferentemente da proposta dos juristas, ainda, a eutanásia voltou a ser considerada uma violação da lei pelo relator, que também propôs que a pena mínima de homicídio passe de seis para oito anos, incluiu a corrupção no rol dos crimes hediondos e propôs a tipificação de novos crimes, como o de terrorismo.

“Nosso trabalho sofreu uma cirurgia para enfeiá-lo. Ao contrário de uma operação reparadora foi feita uma destruidora”, observa o advogado criminalista Técio Lins e Silva, que fez parte do corpo responsável pela reforma na legislação. “O projeto foi mutilado. Como um animal que é levado para ser castrado, retiraram dele todo o vigor para domesticá-lo.”

Para o advogado Eduardo Baker, da ONG Justiça Global, o parecer do senador preocupa, uma vez que “em vez de medidas desencarceradoras, investe em mais prisão, mais punição e tempo de pena”.

“É preocupante atender a essa demanda da sociedade por mais punição e não levar em conta as consequências disso para o sistema prisional”, lembra Baker sobre a população carcerária de quase 600 mil presos no Brasil. “Além disso, transformar um crime em hediondo não significa que ele vai ocorrer menos. Ter mais crimes hediondos, que não preveem progressão de regime, é uma forma de inchar ainda mais o cárcere, que é um espaço de produção de violência e tortura e não de socialização.”

Pressão. Apesar de o senador argumentar que seu parecer é norteado pela “proteção da vida como bem jurídico” e dizer que o Código está “adaptado à realidade histórica na qual vivemos”, há quem diga que Taques vem sendo pressionado por entidades da sociedade civil – como a Associação Pró-Vida e a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – e por parlamentares conservadores e religiosos da chamada “bancada da família”.

“Sempre há soldados de plantão contra temas que representam avanços inexoráveis ao progresso”, protesta Lins e Silva. “Temos aí um retrocesso: o Código Penal, que era da década de 1940, parece estar voltando para 1920. Não esperava que começasse assim. Não nos primeiros 15 minutos do primeiro tempo.”
Depois de receber as emendas parlamentares, o projeto de reforma do Código Penal deve ir, no fim de outubro, para votação na Comissão de Cidadania e Justiça no Senado, antes de seguir para plenário.




Via Carta Capital

Vaticano reafirma normas tradicionais sobre aborto e homossexualidade



Vaticano reafirma normas tradicionais da igreja católica
sobre a homossexualidade e o aborto
Em um manual distribuído, no Rio de Janeiro, aos 350 mil jovens que participam da Jornada Mundial da Juventude (JMJ), o Estado do Vaticano reafirma as posições tradicionais da Igreja Católica Romana sobre a homossexualidade, o aborto e o casamento, entre outros temas considerados éticos.

Escrito em vários idiomas, o manual indica que o papa não pretende reformular as normas vigentes na Igreja que proíbem o casamento entre pessoas do mesmo sexo e que também condenam qualquer forma de aborto e a prática de relações homossexuais. Esses itens não estão incluídos na agenda de reforma que Francisco planeja introduzir no Catolicismo Romano durante o seu pontificado.

Distribuído também aos acompanhantes do voo da Alitalia que trouxe o papa ao Brasil, o documento afirma que "o desenvolvimento da criança depende de uma estrutura familiar formada por pai e mãe, e que os católicos devem ser realistas", ou seja, "nascemos meninos ou meninas".

Diz também o manual que "ter um filho não é um direito", e que "o filho não é um bem de consumo, que viria ao mundo em função das necessidades ou dos desejos dos pais; embora o fato de alguém não poder ter filhos seja fonte de sofrimento, essa reedificação dos lobbies homossexuais não e legítima; é preciso um homem e uma mulher para gerar um filho (...) querer ignorar essa exigência biológica é um forte indício de que a reivindicação não é justa”.

Ao condenar as pesquisas sobre células-tronco e embriões, o documento aprovado pelo papa repete a teoria da constituição do ser humano desde o primeiro momento da fecundação do óvulo. No Brasil, essas pesquisas foram aprovadas em 2008 pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

O texto diz também que a condenação à homossexualidade não significa que a Igreja aprove a homofobia. Em um livro recentemente lançado na Argentina ("Papa Francisco, em suas próprias palavras"), o papa adota uma postura não condenatória dos homens e das mulheres que adotam essas práticas: "Se Deus, na criação, correu o risco de nos fazer livres, quem sou eu para me meter?".

Além desses temas polêmicos, outras questões desafiam a agenda de reformas de Francisco: são elas as questões da infalibilidade do Papa, a ordenação sacerdotal de mulheres, o fim do celibato obrigatório para o clero, a liberação do controle da natalidade, o casamento de pessoas divorciadas e a situação de milhares de padres casados.

Via Carta Maior