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Segundo Paul Singer economia solidária se aproxima das origens do socialismo



O economista e sociólogo Paul Singer, titular da Secretaria Nacional de Economia Solidária (Senaes) desde que esta foi criada, em 2003, no primeiro governo Lula, é um estudioso da economia solidária e se tornou uma das referências internacionais no tema, com vários livros publicados.

Paul Singer, durante entrevista ao primeiro número da Revista
do Brasil, em 2006. Argumentos não perecíveis.
Apesar de o nome ter sido criado no Brasil, economia solidária é um movimento que ocorre no mundo todo e diz respeito a produção, consumo e distribuição de riqueza com foco na valorização do ser humano. A sua base são os empreendimentos coletivos (associação, cooperativa, grupo informal e sociedade mercantil).

Hoje, o Brasil conta com mais de 30 mil empreendimentos solidários, em vários setores da economia, com destaque para a agricultura familiar. Eles geram renda para mais de 2 milhões de pessoas e movimentam anualmente cerca de R$ 12 bilhões.

Nesta entrevista, Singer mostra como o movimento surgiu no Brasil, inicialmente para combater a miséria e o desemprego gerados pela crise do petróleo na década de 1970, e se transformou em um modelo de desenvolvimento que promove não só a inclusão social, como pode se tornar uma alternativa ao individualismo competitivo das sociedades capitalistas.

Quando e como surgiu a economia solidária no Brasil?

Ainda sem esse nome, a economia solidária surgiu no Brasil no bojo da mais terrível crise pela qual o País passou desde Pedro Álvares Cabral. Foi a crise dos anos 70, que atingiu toda a América Latina, resultado do choque do petróleo. Os países não produtores de petróleo ficaram com dívidas enormes. Tiveram que comprar petróleo a preços cinco vezes maiores dos que pagavam antes da crise. E o Brasil foi um dos que mais se endividaram. Não tinha opção. O País já estava no processo de abertura, mas o regime estava sem nenhuma preparação para enfrentar o desemprego, que atingia milhões de brasileiros. Esse era o quadro.

A economia solidária foi uma alternativa para enfrentar o desemprego, a fome e a miséria que atingiram milhões de brasileiros?

Foi isso mesmo. Quem tentou fazer isso de uma forma correta foi a Igreja, através da Cáritas, que começou a organizar os desempregados para que eles voltassem a viver, a ganhar. Isso acabou sendo o impulso inicial para a economia solidária no Brasil. Portanto, a semente da economia solidária foi plantada nos anos 80 por uma ação extremamente adequada, e no momento certo, da Cáritas. Alguns anos depois, o esforço da Cáritas foi secundado pelos sindicatos e pelas universidades. A essa altura eu já estava envolvido.

Qual foi o papel dos sindicatos, nesse início da economia solidária no Brasil?

Os sindicatos viram que os trabalhadores de empresas que iam falir – e muitas faliram nessa época – poderiam arrendar a massa falida, preservar a empresa e, portanto, seus próprios empregos. Os primeiros casos causaram muita sensação: fábricas sem patrões. Logo mais, isso se tornou um modelo. Surgiu a Anteag (Associação de Empresas Recuperadas), que se especializou nisso, a partir do Dieese (Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos). Então, foi o início da economia solidária no Brasil. Os sindicatos apoiaram seus trabalhadores na formação de cooperativas de trabalho.

Os trabalhadores assumiram a direção dessas empresas falidas e as recuperaram?

Sim, assumiram a direção das empresas. Eles passaram a ser trabalhadores sem patrão, ou trabalhadores autoempregados coletivos ou sociais. Sempre associados.

E qual foi o resultado disso?

Centenas de empresas recuperadas no Brasil pelos seus próprios trabalhadores, mais de mil. A maior da América Latina administrada por trabalhadores é a Uniforja (Cooperativa Central de Produção Industrial de Trabalhadores em Metalurgia), que fica em Diadema.

Isso mostrou, na prática, a capacidade de gestão do trabalhador, de administrar com sucesso uma fábrica, coletivamente e sem patrões?

É preciso lembrar que, do ponto de vista capitalista, o trabalhador é alguém que cumpre tarefas. Ele não tem nenhuma participação na gestão, muito menos conhece os problemas do negócio. Os donos da empresa só divulgam o que lhes parece vantajoso. Portanto, os trabalhadores não têm aparentemente nenhuma capacidade de gerir uma empresa. A realidade mostrou o contrário. As empresas recuperadas pelos trabalhadores levam uma média de 2, 3 meses para voltar à plena atividade. Não mais que isso. É surpreendente.

E quando surgiu o conceito e o nome economia solidária?

A história é mais o menos o seguinte: quem não se lembra do Betinho (Herbert José de Sousa)? Sociólogo e ativista social, militante político que liderou o “Natal sem Fome”, mobilizou milhões e milhões de pessoas no Brasil. Isso também está na história da economia solidária.

De que forma?

Começou-se a perceber que era preciso fazer alguma coisa direta contra o desemprego. Como a campanha do Betinho avançou bem, tomamos a decisão de nos reunirmos nos anos 1990 (92 e 93) para lutar diretamente contra o desemprego, fomentando a economia solidária, que ainda não tinha esse nome. Incentivando a autoiniciativa econômica de trabalhadores associados.

Inclusive a campanha do Betinho foi muito apoiada pela Igreja. Ele mesmo era um católico, um cristão socialista. Militante da AP (Ação Popular, organização da esquerda cristã). Bem, esse foi o passo decisivo para a criação das incubadoras e cooperativas populares. Não surgiram imediatamente, mas não demorou muito. A primeira cooperativa foi criada no Rio de Janeiro, creio que em 1994, e agiu especificamente na Maré (Complexo da Maré). As incubadoras tecnológicas e cooperativas populares foram decisivas para o desenvolvimento da economia solidária no Brasil.

A origem dessa primeira incubadora vem da situação trágica dos trabalhadores daquelas favelas, que ficam ao redor do Instituto Oswaldo Cruz (Fiocruz). E junto ao Instituto Oswaldo Cruz existe a Faculdade Nacional de Saúde Pública. Basicamente, as pessoas nas favelas viviam do tráfico e das lutas contra os traficantes… As balas passaram a voar e atingir os prédios da faculdade. Chegaram a cogitar de tirar o Oswaldo do Cruz de lá, mas os próprios professores tomaram a iniciativa maravilhosa: “Vamos pensar um pouco antes de fazer essa transferência”. Eles foram às favelas ver o que estava acontecendo e descobriram que 80% dos favelados, dos chefes de família, não tinham trabalho. Uma situação desesperadora e o tráfico era a única alternativa que lhes restava.

Os professores se reuniram e discutiram então o que fazer. O fato é que eles acharam que cooperativa seria a solução. Então entraram em contato com os vizinhos e sugeriram que formassem uma cooperativa de trabalho na própria instituição. E até hoje, eu acho, é assim. Os homens passaram a ter uma atividade e as mulheres também, em função daquele acordo.

E como o senhor entra nessa história?

Havia professores de Campinas, eu pela USP, mas não éramos muitos. Nós começamos a estudar o assunto. Em 1995, fizemos a primeira reunião brasileira do que viria a ser economia solidária, na PUC de São Paulo. A imprensa não dava nada disso, como até hoje. O MST fazia economia solidária sem dar esse nome. O Gonçalo Guimarães que até hoje dirige a mais antiga incubadora do Brasil, na Universidade Federal do Rio de Janeiro, também. Vieram umas 30 pessoas e fui surpreendente.

O MST já havia conseguido assentar muita gente e em 1983 já havia decidido que em todo assentamento haveria cooperativas. Eles foram a essa reunião na PUC contar essa história. O MST tinha apoio da Cáritas, que o ajudou a desenvolver a agroindústria nos assentamentos.

A Cáritas brasileira faz parte de uma rede de Cáritas no mundo inteiro e ela recolheu muitas contribuições das Cáritas europeias, dos Estados Unidos, porque a crise lá já estava superada, mas aqui não. Eles tinham recursos e os usaram para promover a economia solidária, que não tinha esse nome ainda. O nome surgiu durante a campanha eleitoral de 1996 para a prefeitura de São Paulo. A candidata do PT foi a Luiza Erundina, que acabou perdendo para o candidato do Paulo Maluf, o Celso Pitta. Fui secretário de planejamento do governo dela quando o desemprego atingiu o auge, naquele complicada política do (ex-presidente Fernando) Collor. Havia 1,6 milhão de desempregados em São Paulo. Sem o apoio dos empresários, o que sobrou dos nossos esforços foi uma importante cooperativa de catadores de lixo, que até hoje existe. Vieram as incubadoras, o MST, a CUT, ONGs. Eram movimentos sociais se organizando em torno de um objetivo comum.

Fizemos essa proposta de organizar os desempregados em cooperativas ao comitê do programa da campanha da Luiza Erundina, dirigido pelo Aloizio Mercadante. Ele acatou e perguntou: Singer como é você chama esse treco aí que você está propondo? Respondi: nem pensei nisso. Aí ele me perguntou se não queria chamar de economia solidária. Na hora percebi que era o melhor nome possível.

Até então ninguém havia usado esse nome?

Quem começou a escrever sobre economia solidária, mas com nome semelhante, economia de solidariedade, foi o chileno Luis Razeto, professor de economia aposentado. Mas só o conheci em 2008. Eu soube dele depois que a gente já tinha posto isso aí em marcha. Quem me apresentou a ele foi o Cláudio Nascimento, militante na época da ditadura, que foi exilado na Europa, e teve contato por lá com um movimento como o da economia solidária, mas não com esse nome. Descobrimos mais tarde que a economia solidária era praticada nos Estados Unidos, a partir do microcrédito, e as universidades americanas tiveram um papel importante nisso.

Como a economia solidária foi adotada de forma ampla pelo PT, a ponto de ganhar uma secretaria própria, a Secretaria Nacional de Economia Solidária (Senaes)?

Em 1991, com o desaparecimento da URSS, houve o desaparecimento do chamado socialismo existente – mas que de socialismo não tinha mais nada. Acabou a ideia de comunismo, e isso repercutiu no PT. O partido tinha de mudar e o socialismo era a proposta do PT desde a sua fundação. Isso causou uma reação forte nas bases operárias, camponesas etc. Elas não queriam nem ouvir falar em jogar fora o socialismo. Tinham toda razão, esse socialismo fracassou, mas não quer dizer que outras tentativas não possam ter sucesso.

Em meio à chamada crise mundial do socialismo, o Lula deu mais uma vez prova do seu gênio. Procurou o intelectual mais importante do PT, o professor Antonio Candido de Souza, e pediu que ele organizasse uma discussão em profundidade sobre o socialismo, porque a discussão poderia levar a uma divisão do PT. Isso foi por volta de 93. Vários intelectuais participaram. A economia solidária não era muito conhecida na época, mas organizamos debates inclusive sobre esse tema. Depois, em debates sobre desemprego, o PT entendeu que a economia solidária poderia trazer respostas para a questão e o partido assumiu o tema. Foi depois de todos esses debates que Lula colocou a economia solidária no programa dele.

Por que a Senaes faz parte do Ministério do Trabalho e Emprego?

A Senaes foi criada em 2003, quando o Lula tomou posse pela primeira vez. A Senaes faz parte do Ministério do Trabalho e Emprego porque a economia solidária se reconhecia como parte do movimento operário. O MTE é um ministério de proteção ao trabalhador, portanto parceiro dos sindicatos e de todas as formas de organização da classe trabalhadora. Nós somos uma secretaria dos movimentos sociais. Uma das coisas que me deixam orgulhoso é que os principais movimentos sociais do Brasil hoje estão na economia solidária. Não é que apoiem de fora, fazem economia solidária. E as mulheres são a vanguarda da economia solidária, no Brasil e em outros países.

A criação da Senaes foi fundamental para que o País tivesse uma política pública de economia solidária?

A economia solidária só existe no Brasil todo, acredito, por causa da secretaria. E do Fórum Brasileiro de Economia Solidária, nosso grande parceiro. Sem o Fórum não tínhamos avançado. Ele foi criado junto com a secretaria, somos irmãos gêmeos. Uma grande parte das políticas em economia solidária surgiu por meio do Fórum. O próprio Fórum foi fomentando a criação de fóruns estaduais e hoje há ainda centenas de fóruns municipais. Mais da metade dos estados têm hoje leis de economia solidária, nós temos convênios com eles e com centenas de municípios.

O senhor vê a economia solidária como solução para a miséria e também alternativa real à economia capitalista?

Sim, é uma alternativa. As raízes da economia solidária estão lá atrás, com Robert Owen, considerado o pai do socialismo e um dos fundadores do cooperativismo, que foi administrador de uma grande tecelagem. Ele reduziu as jornadas de trabalho (no século 18), tirou as crianças das fábricas. Foi realmente um humanista e mestre de Marx e Engels. Ele criou toda uma organização para defender o socialismo e foi o primeiro grande líder da CUT da Grã-Bretanha, a primeira grande central sindical do mundo. Os trabalhadores partidários de Owen inventaram a autogestão. O princípio fundamental era a democracia, ninguém mandava em ninguém. Todo mundo, homem, mulher, jovem, velho. Isso vale para as cooperativas até hoje. No mundo, 1 bilhão de pessoas participam de cooperativas, segundo dados da Aliança Cooperativa Internacional. E cooperativa não é só cooperativa de trabalho. As cooperativas que têm mais sócios chamam-se cooperativas de crédito e são bancos cooperativos. Nós temos mais de mil no Brasil hoje.

A economia solidária é uma volta às origens do socialismo? Uma outra economia, sem patrões nem empregados, mas com trabalhadores solidários?

Sim, essa é a minha tese e não é utopia. Está sendo praticada. Em pelo menos 200 países. No Brasil, a característica da economia solidária é a presença de muitas cooperativas. Na prática, nós somos um exemplo de que a economia solidária é aplicação do cooperativismo.


Um dos grandes defensores do socialismo e da reforma agrária morre aos 83 anos


O ex-deputado federal Plínio de Arruda Sampaio morreu nesta terça-feira 8, em São Paulo, aos 83 anos. Membro da direção nacional do PSOL, ele estava internado no Hospital Sírio Libanês desde maio, em função do tratamento de um câncer ósseo, mas não resistiu à doença.

Plínio ficou conhecido nacionalmente depois de se candidatar à Presidência da República pelo PSOL em 2010. O socialista, no entanto, teve um papel mais importante na militância pela reforma agrária. Presidente de honra da Associação Brasileira de Reforma Agrária (ABRA), fundada em 1967, Plínio foi o relator do projeto de reforma agrária do governo João Goulart e, por anos, atuou desenvolvendo trabalhos para a causa na Organização para Agricultura e Alimentação das Nações Unidas (FAO/ONU).

Nascido em São Paulo, em 1930, Plínio fez o colegial no Rio Branco e depois se formou em direito no Largo São Francisco, faculdade da USP (Universidade de São Paulo). O contato com a política veio ainda quando jovem, na época em que atuou na Juventude Estudantil Católica. Mais tarde, a militância o levou a ser presidente da Juventude Universitária Católica.

Depois de trabalhar como promotor público, foi eleito deputado federal pelo antigo Partido Democrata Cristão, em 1962. Tinha orgulho de dizer que relatou o projeto de reforma agrária do Governo João Goulart, o que lhe rendeu a cassação do mandato em 9 de abril de 1964. Nos anos 1970, em função do regime militar, teve de se exilar no Chile, onde trabalhou na Organização para Agricultura e Alimentação das Nações Unidas (FAO/ONU), desenvolvendo projetos de reforma agrária.

De lá, ele foi transferido para os Estados Unidos e, só em 1976, voltou ao Brasil. Ao chegar, participou da fundação do Partido dos Trabalhadores e foi deputado federal em 1985. Na Constituinte, em 1988, foi relator do capítulo do Poder Judiciário. Dois anos depois, Plínio foi indicado pelo PT para ser candidato ao governo do Estado de São Paulo, mas perdeu. Em 2005, após o escândalo do “mensalão”, ele deixou a legenda.

Era impossível reverter o curso de adaptação à ordem. Não foi uma ruptura feliz. O PT foi o primeiro partido de massas criado longe dos tapetes e palácios no Brasil, gestado nas comunidades de base da igreja católica e nos sindicatos. Mas, como costumo dizer, não fui eu que saí do PT. Foi o PT que saiu de mim”, explicou, certa vez, em texto no seu blog pessoal.

No mesmo ano ele ingressou no PSOL, com outros ex-petistas, e passou a integrar a direção nacional do partido socialista. Plínio também foi escolhido candidato ao governo de São Paulo, em 2006, e à Presidência da República, em 2010, quando se destacou em debates televisivos contra Dilma Rousseff, a ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva e o ex-governador de São Paulo José Serra. Nos últimos anos, voltou a se manifestar publicamente depois das manifestações de junho de 2013, que ele apoiou ao participar de passeatas em São Paulo. Sem cargos públicos ou planos de se candidatar, ele se dedicava, ultimamente, ao jornal eletrônico Correio da Cidadania.


Via Carta Capital

Por que o Socialismo?, por Einstein em 1949


É aconselhável que alguém que não é um especialista em assuntos econômicos e sociais expresse suas opiniões acerca do tema do socialismo? Creio, por uma quantidade de razões, que sim.

Consideramos primeiramente a questão desde o ponto de vista do conhecimento científico. Poderia parecer que não há diferenças metodológicas essenciais entre a astronomia e a economia: os cientistas de ambos os campos tentam descobrir leis de aceitabilidade geral para um grupo circunscrito de fenômenos com o objetivo de fazer a interconexão destes fenômenos tão claro quanto for possível. Mas na realidade tais diferenças existem. O descobrimento de leis gerais em economia se complica pela circunstância de que os fenômenos econômicos observados são freqüentemente influenciados por muitos fatores que são muito difíceis de avaliar separadamente. Além disso, a experiência que se acumulou desde o princípio do chamado período civilizado da história humana tem sido — como é sabido — grandemente influenciada e limitada por causas cuja natureza não são de nenhum modo exclusivamente econômicas. Por exemplo, a maior parte dos Estados na história devem sua existência à conquista. Os povos conquistadores se estabeleceram, legal e economicamente, como a classe privilegiada do país conquistado. Atribuíram-se o monopólio da posse da terra e designaram para o sacerdócio alguém de suas fileiras. Os sacerdotes, com o controle da educação, fizeram da divisão de classes da sociedade uma instituição permanente e criaram um sistema de valores mediante o qual dali em diante o povo foi, em grande medida inconscientemente, guiado em sua conduta social.

Mas a tradição histórica é, por assim dizer, de ontem; em nenhuma parte temos realmente superado o que Thorstein Veblen chamou de “a fase depredadora” do desenvolvimento humano. Os feitos econômicos observáveis pertencem a esta fase e suas leis não são aplicáveis a outras fases. [Primeiro] Dado que o propósito real do socialismo é superar e avançar além da fase depredadora do desenvolvimento humano, a ciência econômica em seu estado atual não pode deixar muita luz sobre a sociedade socialista do futuro.
Segundo, o socialismo está dirigido para um fim social-ético. A ciência, sem embargo, não pode criar fins nem, ao menos, induzí-los nos seres humanos. Mas os fins em si mesmos são concebidos por personalidades com elevados ideais éticos — estes propósitos não são rígidos senão vitais e vigorosos — são adotados e levados adiante por aqueles muitos seres humanos que — quase inconscientemente — determinam a lenta evolução da sociedade.

Por estas razões, deveríamos estar atentos a não sobrestimar a ciência e os métodos científicos quando se trata de problemas humanos, e não deveríamos assumir que os especialistas são os únicos que têm direito e expressar-se sobre as questões da organização da sociedade.

Inumeráveis vozes têm afirmado desde já algum tempo que a sociedade humana está passando por uma crise, que sua estabilidade está gravemente prejudicada. É característico desta situação que alguns indivíduos se sintam indiferentes, ou integrados, ou hostis ao grupo que pertencem, seja ele grande ou pequeno. Para ilustrar este ponto, deixem-me registrar aqui uma experiência pessoal. Recentemente discuti com um homem inteligente e bem disposto a ameaça de outra guerra, a que em minha opinião colocaria seriamente em perigo a existência da humanidade, e comentei que somente uma organização supranacional poderia proteger-nos daquele perigo. Depois, o homem, calmamente e friamente, me disse: “Por que você se opõe tão profundamente ao desaparecimento da raça humana?”

Estou seguro que apenas um século atrás ninguém teria afirmado tão levianamente algo semelhante. É a declaração de um homem que se esforçou em vão para alcançar um equilíbrio interior e basicamente perdeu a esperança de alcançá-lo. É a expressão de uma solidão e isolamento de que muita gente sofre hoje em dia. 

Qual é a causa? Tem uma saída?

É fácil fazer estas perguntas, mas é difícil respondê-las com alguma segurança. Devo tratar, contudo, da melhor maneira que se pode, mesmo eu sendo consciente da ação de nossos sentimentos e esforços que podem ser contraditórios e obscuros e que não podem ser expressados em fórmulas fáceis e simples.

O homem é, ao mesmo tempo, um ser solitário e um ser social. Como ser solitário, busca proteger sua própria existência e aqueles que são mais próximos, para satisfazer seus desejos pessoais e desenvolver suas habilidades inatas. Como ser social, busca conquistar o reconhecimento e o afeto de seus semelhantes para compartilhar o seu prazer, confortá-los com sua solidariedade e melhorar suas condições de vida. Só a existência destes esforços, freqüentemente em conflito, podem dar conta do caráter especial do homem, e sua combinação específica determina até que ponto um indivíduo pode alcançar o equilíbrio interior e contribuir para o bem estar da sociedade. É bem possível que a força relativa destes dois impulsos diversos esteja, basicamente, fixada pela herança. Mas a personalidade que finalmente emerge está em grande medida formada pelo entorno em que o homem se encontra durante o seu desenvolvimento, pela estrutura da sociedade em que cresce, pela tradição desta sociedade, e por sua valoração de diversos tipos de condutas. O conceito abstrato “sociedade” significa para o indivíduo a soma de suas relações, diretas e indiretas, desde os seus contemporâneos até as gerações anteriores. O individuo é capaz de pensar, sentir, atuar, e trabalhar por si mesmo, mas sua dependência da sociedade é tanta — em sua existência emocional e intelectual — que é impossível pensar nele, ou compreendê-lo, fora do marco da sociedade. É a “sociedade” quem lhe proporciona comida, roupas, ferramentas de trabalho, linguagem, as formas de pensamento, e a maior parte do conteúdo do pensamento; sua vida se faz possível graças ao trabalho e às conquistas dos muitos milhões, contemporâneos e antepassados, que estão escondidos detrás da pequena palavra “sociedade”.

É evidente então que a dependência do indivíduo pela sociedade é um feito natural que não pode ser abolido — exatamente como no caso das formigas e das abelhas. Sem dúvida, enquanto todas as ações das formigas e das abelhas estão fixadas até o menor detalhe por instintos rígidos e hereditários, os capatazes sociais e as interrelações dos seres humanos são muito variáveis e suscetíveis à mudança. A memória, a capacidade de realizar novas combinações, o dom da comunicação oral têm feito possíveis desenvolvimentos nos seres humanos que não são ditados por necessidades biológicas. Estes desenvolvimentos se manifestam nas tradições, nas instituições e nas organizações; na literatura; nos avanços científicos e nos engenhos; nas obras de arte. Isto explica como ocorre que, em certo sentido, o homem possa influir sobre sua vida através de sua própria conduta e que neste processo o pensamento e os desejos conscientes são muito importantes.

O homem adquire ao nascer, por meio de herança, uma continuação biológica que é fixa e inalterável, que inclui os impulsos naturais que são característicos da espécie humana. Ademais, adquire durante sua vida uma constituição cultural que adota da sociedade por meio da comunicação e através de muitas outras formas. É esta constituição cultural que, com o passar do tempo, está sujeita às mudanças e que determina em grande medida a relação entre o indivíduo e a sociedade. A antropologia moderna nos ensinou, usando o estudo das chamadas culturas primitivas, que o comportamento social dos seres humanos pode apresentar grandes diferenças, dependendo dos padrões culturais prevalecentes e dos tipos de organização que predominam na sociedade. É nisto que podem fundar suas esperanças aqueles que se esforçam em melhorar as condições dos homens: os seres humanos não estão condenados, por sua constituição biológica, a aniquilarem-se uns aos outros, ou à mercê de um destino cruel e de castigos.

Se nos perguntamos como deveriam ser transformadas a estrutura da sociedade e a atitude do homem para fazer a vida tão satisfatória como possível, deveríamos estar conscientes de que somos incapazes de modificar certas condições. Como foi mencionado antes, a natureza biológica do homem não está, a todos efeitos práticos, sujeita à mudanças. Ademais, as condições criadas pelos desenvolvimentos tecnológicos e demográficos dos últimos séculos chegaram para ficar. Nos locais com população relativamente densa, com os produtos que são necessários para sua existência, uma profunda divisão do trabalho e um aparato altamente centralizado são absolutamente necessários. Os tempos – que em perspectivas parecem tão idílicos – em que homens ou grupos pequenos podiam ser completamente auto-suficientes se foram para sempre. É apenas um leve exagero dizer que a humanidade já constitui uma comunidade planetária de produção e consumo.

É alcançado agora o ponto aonde posso indicar brevemente o que para mim constitui a essência da crise de nosso tempo. Está relacionado com o individuo e sua relação com a sociedade. O indivíduo está mais consciente do que nunca de sua dependência da sociedade. Mas não sente esta dependência como um traço positivo, como um laço orgânico, como uma força protetora, mas uma ameaça a seus direitos naturais, ou a sua existência econômica. Por outro lado, sua posição na sociedade é tal que os impulsos egocêntricos de sua constituição são constantemente acentuados, enquanto que seus impulsos sociais, naturalmente mais débeis, se deterioram progressivamente. Todos os seres humanos, em qualquer posição da sociedade, sofrem este deterioramento progressivo. Involuntários prisioneiros de seu próprio egocentrismo se sentem inseguros e privados do mais inocente e simples desfrute da vida. O homem só pode encontrar o sentido da vida, curta e perigosa como é, consagrando a sociedade.

A anarquia econômica da sociedade capitalista de hoje em dia é, em minha opinião, a verdadeira fonte dos males. Vemos diante de nós uma enorme comunidade de produtores cujos membros se esforçam incessantemente em privar o outro dos frutos de seu trabalho coletivo — não pela força mas cumprindo inteiramente as regras legalmente estabelecidas. A este respeito é importante dar-se conta de que os meios de produção — isto é: toda a capacidade produtiva necessária para produzir bens de consumo assim como bens de capital adicionais — podem ser — e em sua maioria o são efetivamente — a propriedade privada de alguns indivíduos.

Para simplificar, na discussão que se segue chamarei “trabalhadores” os que participam na propriedade dos meios de produção, apesar de isto não corresponder ao uso corrente do termo. Usando os meios de produção, o trabalhador produz novos bens que transformam-se em propriedade do capitalista. O ponto essencial deste processo é a relação entre o que o trabalhador produz e o que lhe pagam, ambos medidos em termos de valor real. Em quanto o contrato do trabalho é “livre”, o que o trabalhador recebe está determinado não pelo valor real dos bens que produz mas por suas necessidades mais básicas e pela necessidade de força de trabalho por parte dos capitalistas em relação ao número de trabalhadores competindo por empregos. É importante entender que nem sequer na teoria o salário do trabalhador é determinado pelo valor do que produz.

O capital privado tende a se concentrar em poucas mãos, em parte devido à competência entre os capitalistas, e em parte porque o desenvolvimento tecnológico e a crescente divisão do trabalho alentam a formação de unidades maiores de produção em detrimento das menores. O resultado destes desenvolvimentos é uma oligarquia do capital privado cujo enorme poder não pode ser controlado efetivamente nem sequer por uma sociedade política democraticamente organizada. Isto é assim porque os membros dos corpos legislativos são selecionados pelos partidos políticos, em grande medida financiados ou de alguma maneira influenciados por capitalistas privados que, por todos efeitos práticos, separam o eleitorado da legislatura. A conseqüência é que os representantes do povo não protegem suficientemente os interesses dos grupos não privilegiados da população. Por outra parte, nas condições atuais os capitalistas privados controlam, direta ou indiretamente, as principais fontes de informação (imprensa escrita, rádio, educação). É então extremamente difícil, e por certo impossível na maioria dos casos, que cada cidadão possa chegar às conclusões objetivas e fazer uso inteligente de seus direitos políticos.

A situação prevalecente em uma sociedade baseada na propriedade privada do capital está então caracterizada por dois princípios mestres: primeiro, os meios de produção são propriedade de indivíduos, e estes dispõem deles como melhor lhes parecer; segundo, o contrato de trabalho é livre. Supostamente, não existe sociedade capitalista pura, neste sentido. Em particular, deve-se assinalar que os trabalhadores, por meio de grandes e amargas lutas políticas, tem conseguido uma forma um tanto melhorada do “livre contrato de trabalho” para certas categorias de trabalhadores. Mas, tomada como um todo, a economia atual não difere muito do capitalismo “puro”.

Esta mutilação dos indivíduos é o que considero o pior mal do capitalismo. Nosso sistema educativo como um todo sofre este mal. Uma atitude exageradamente competitiva se inculca no estudante, que é treinado para adorar o êxito da aquisição como uma preparação para sua futura carreira.

Estou convencido de que há somente uma forma de eliminar estes graves malefícios: através do estabelecimento de uma economia socialista, acompanhada por um sistema educacional que seja orientado para fins sociais. Em tal economia, os meios de produção são propriedade da própria sociedade e utilizados de maneira planejada. Uma economia planejada, que ajuste a produção às necessidades da comunidade, distribuiria o trabalho entre todos aptos a trabalhar e garantiria os meios de vida de todos, homem, mulher e criança. A educação do indivíduo, além de promover suas próprias habilidades inatas, intentaria desenvolver em um sentido de responsabilidade por seu próximo, em lugar da glorificação do poder e do êxito em nossa sociedade atual.

Sem embargo, é preciso recordar que uma economia planificada não é todavia o socialismo. Uma economia planificada como tal pode ser acompanhada pela completa escravização do indivíduo. A realização do socialismo requer a solução de alguns problemas sócio-políticos extremamente difíceis: “como é possível, considerando a muito abarcadora centralização do poder, conseguir que a burocracia não seja todo poderosa e arrogante? Como podem proteger os direitos do indivíduo e mediante ele assegurar um contrapeso democrático ao poder da burocracia?”

Ter claras as metas e problemas do socialismo é de grande importância nesta época de transição. Dado que, nas circunstâncias atuais, a discussão livre e sem travas destes problemas são um grande tabú, considero a fundação desta revista [N2] um importante serviço público.


Em entrevista, Pepe Mujica fala sobre Educação e Darcy Ribeiro




Em entrevista ao site Carta Maior, Pepe Mujica, presidente do Uruguai fala sobre Educação e Darcy Ribeiro. Em uma de suas sábias e reflexivas palavras ele discorreu sobre a principal função dos socialistas ante a sociedade embebida pelo capitalismo. "Nós, socialistas, temos que formar nossa gente", falou o uruguaio.  Os universitários e sua formação também mereceu nota. "A formação universitária contemporânea está embebida de capitalismo por toda parte. Nós, socialistas, temos que formar nossa gente", arguiu.

VAMOS À ENTREVISTA

Carta Maior: Como o senhor conheceu Darcy Ribeiro e como se tornaram amigos? Tinham ideias políticas parecidas?

Mujica: Eram tempos já distantes, do golpe militar no Brasil. No Uruguai se refugiaram alguns notórios perseguidos políticos e lutadores sociais brasileiros e nós compúnhamos um grupo de rapazes jovens que, solidariamente, trabalhávamos de correio, para trâmites de imigração, e viajávamos continuamente para Porto Alegre, São Paulo e Rio.

Numa dessas idas, em algum apartamento, conheci Darcy. Eu o observava, na visão de homem jovem que eu era, como uma espécie de maestro, daqueles que nos iluminava o caminho. Havia uma distância intelectual muito marcada entre nós e Darcy. Afinal, não éramos mais que um pequeno punhado de jovens carteiros. De qualquer modo, penso que não foi em vão. Conheci muita gente do pensamento brasileiro e, com o passar do tempo, encontrei alguns por aqui, outros por lá, outros que já não estão.

A América Latina está imersa em um processo de mudanças importantes em muitos de seus países. O que pensaria Darcy Ribeiro da América Latina que temos atualmente?

Eu penso que, por um lado, ele teria uma espécie de grata surpresa e seguramente estaria comprometido, ajudando. Mas seguramente estaria criticando também. Ineludivelmente, pela forma libertária e aberta de sua maneira de pensar, pelo fervoroso idealismo carregava. E eu acho que ele reforçou isso em seus trabalhos de Antropologia, conhecendo os povos primitivos. Mas não tenho dúvida de que estaria apoiando; mas não apoiando incondicionalmente, sim numa atitude crítica.

Você fala de apoio e de crítica. O que teria a América Latina atual que aprender do pensamento, da luta e da obra de Darcy Ribeiro?

Eu acho que existem coisas que são permanentes: sua devoção aos povos primitivos, sua devoção aos costumes, a busca nos povos primitivos das mais profundas chaves da conduta humana. Acho que isso é uma parte moderna, que será incorporada.

Existem muitos antropólogos que estudam a ciência do homem e estão muito atrasados com respeito a outros. E nesta América, acho que Darci nos deixou um capital, deste ponto de vista, que é pelo menos um ponto de partida. Não é o fundamentalismo de defesa dos povos aborígenes como quem defende uma coisa que deve ser conservada, como quem conserva animais raros, mas eu entendo que os esforços de Darcy têm que ver com encontrar as chaves da conduta humana fora da civilização: é o que temos no disco rígido da espécie. Por momentos, pelo menos, me dá essa impressão.

A experiência boliviana, com um presidente indígena à frente e com todas as contradições que está tendo esse processo, teria lhe interessado, sem dúvida, muitíssimo.

Sem dúvida. Ele estaria em uma espécie de oficina permanente, revisando algumas de suas teses, gerando outras. Seguramente ele estaria cultivando um pensamento fermental. E eu diria, procurando iluminar-nos, no caminho da teoria, neste mundo de esquerdas potentes como as que se movem na América do Sul, mas que têm uma dívida muito profunda em matéria de teoria.

Ribeiro estava firmemente convencido das possibilidades emancipadoras da educação. No Brasil, tentou construir uma universidade modelo para uma nova sociedade mais justa e democrática. Você acha que a educação ainda tem esse poder de mudar o mundo, apesar de que ele está cada vez mais regido pelo dinheiro sem pátria?

Acho que Darcy era um prisioneiro de sua própria fé, de seu próprio entusiasmo. Não tenho dúvida de que a educação é um componente imprescindível para uma sociedade melhor, mas com isso não chega. A formação universitária de caráter contemporâneo sofre e, em grande medida, está embebida de capitalismo por todos os lados, e tende a reproduzir quadros intelectuais, acadêmicos, que afinal acabam sendo funcionais para o próprio capitalismo. Não gera necessariamente quadros para uma sociedade diferente ou para que lutem por uma sociedade diferente. Isto acho que não se podia ver na época de Darcy.

Mas vou resumir: nós, socialistas, temos que fundar nossas próprias universidades e formar nossa gente e não mandá-las para que o capitalismo as forme e pretender depois criar socialismo com essa intelectualidade. Sei que é muito forte, mas acho que é um de nossos deveres. Mas isto eu digo depois de ler o jornal de segunda-feira, digo depois de ter vivido, antes não pensava assim.

Porque você considera que a cultura tem um papel relevante nas mudanças sociais…

 Tremendo!

…as mudanças das forças produtivas em nível político não são suficientes se não há uma mudança cultural na sociedade.

Conhecimento e cultura, as duas coisas. Mas embebidos de outros valores. E uma universidade que trata de capacitar profissionais que estão apressados por formar-se para incorporar-se ao grande mercado de trabalho, o que não parece o mais adequado, em termo genérico sempre vai existir... mas bem, em todo caso isto é após o tempo de Darcy. Provavelmente se ele estivesse vivo estaríamos discutindo isto.

Seria muito bom… Como Darcy, que era um antropólogo, você mostra também inquietude pela crise ambiental. Fez referências importantes ao tema na abertura da Assembleia da ONU este ano. Como o tema ambiental muda a concepção de luta socialista no mundo atual em relação com a visão, talvez mais romântica, que se tinha quando você e Darcy eram jovens militantes.

A tese central que sustento é que, no fundo, a crise ambiental é uma consequência, não uma causa. Que, na verdade, os problemas que temos no mundo atual são de caráter político. E isso se manifesta nessa tendência de destroçar a natureza.

E por que político? É político e é sociológico porque remontamos a uma cultura que está baseada na acumulação permanente e em uma civilização que propende ao “usa e descarta”, porque o eixo fundamental dessa civilização é apropriar-se do tempo da vida das pessoas para transformá-lo em uma acumulação.

Então, é um problema político. O problema do meio ambiente é consequência do outro. Quando dizemos que “para viver como um americano médio, são necessários três planetas” é porque partimos de que esse americano médio desperdiça, joga fora e está submetido a um abuso de consumo de coisas da natureza que não são imprescindíveis para viver.

Portanto, quando digo político, me refiro à luta por uma cultura nova. Isso significa cultivar a sobriedade no viver, cultivar a durabilidade das cosas, a utilidade, a conservação, a recuperação, a reciclagem, mas fundamentalmente viver aliviado de bagagens. Não sujeitar a vida a um consumo desenfreado, permanente. 

E não é uma apologia à pobreza, é uma apologia à liberdade, ter tempo para viver e não perder o tempo em acumular coisas inúteis. O problema é que não se pode conceber uma sociedade melhor se ela não se supera culturalmente.

Por último, uma lembrança, a lembrança mais forte que você conserva da relação que teve com Darcy Ribeiro.

O que mais me impressionou é a fé cega que esse bom homem tinha na educação como alavanca principal para ordenar o mundo. Ele era um apaixonado pela educação. Era uma espécie de professor predicador, não apenas do conhecimento, mas da necessidade de semear conhecimento.

Nos faz falta?

Sim, claro que nos faz falta, muitíssima falta. Um apaixonado pela educação!


Via Carta Maior