Mostrando postagens com marcador OEA. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador OEA. Mostrar todas as postagens

Impeachment: OEA e Corte Interamericana apontam ilegalidades no processo



Em audiência pública, nesta segunda-feira (9), na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), o secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), Luis Almagro, e o presidente da Corte Interamericana de Direitos Humanos, Roberto Caldas, criticaram a falta de base jurídica e a antecipação de votos que permeiam o processo de impeachment da presidente da República, Dilma Rousseff.

Publicado originalmente na Agência Senado

Almagro reafirmou aos senadores a posição da OEA, manifestada em nota em meados de abril: a denúncia contra a presidente não apresenta “qualquer juízo de indício de crimes de responsabilidade, quanto mais de certeza”.

— Desrespeitar os limites determinados no sistema constitucional brasileiro afeta a estrutura de funcionamento desse sistema e distorce a força e a operacionalidade que devem ter a Constituição e as leis — disse.

Como observou o secretário-geral da OEA, os países sul-americanos enfrentaram ditaduras militares e são hoje conscientes da importância das regras democráticas. Os eleitores, frisou, devem ter garantia de liberdade para exercerem sua expressão pelo voto e os políticos, a máxima garantia para serem eleitos e cumprirem seus mandatos.

— Isso é muito importante, pois, no sistema presidencialista, existe um contrato entre as pessoas e o presidente eleito. Isso tem que ser respeitado, com a máxima certeza jurídica que embasa a democracia, para garantir o cumprimento desse mandato — ressaltou Almagro.

Pré-julgamento

Roberto Caldas, da Corte Interamericana de Direitos Humanos, destacou o fato de o impeachment ser constitucional em países presidencialistas, mas frisou que todo o rito deve ser norteado pelos princípios do Estado de Direito.

— Por esse rito, deputados e senadores tornam-se juízes e são imbuídos da missão de realizar o mais importante julgamento de uma nação, que é o impedimento de quem chegou ao posto pelo voto direto — afirmou Caldas.

Nesse papel, completou, os parlamentares têm os mesmos requisitos dos juízes, de imparcialidade e obrigação de ouvir acusação e defesa, até formar opinião.

— A formação de opinião só pode ser realizada após todo o procedimento legal de um julgamento. O fato de se ter visto parlamentares anunciando previamente os votos assustou o mundo jurídico internacional. Não se pode ter quebra da imparcialidade até o momento final. Manifestação de opinião é pré-julgamento, e quem pré-julga está impedido de votar. Quem anuncia voto não pode julgar — disse.

Manipulação

Presente ao debate, o advogado Aldo Arantes, ex-deputado federal e parlamentar constituinte, alertou a sociedade brasileira para que esteja atenta às motivações de revistas semanais e grandes jornais em apoiar o impeachment.

— A grande mídia trabalha para impedir que a sociedade entenda o que está acontecendo. Vivemos uma situação grave, pois se utilizam da corrupção para confundir a sociedade e gerar um sentimento de ódio e o crescimento do nazifascismo.

Arantes disse ser responsabilidade de todos os juristas alertar a população para a gravidade da situação e mostrar que a visão predominante na mídia é uma tentativa de impor a vontade de grandes grupos econômicos, em detrimento do interesse dos trabalhadores.

A advogada Sueli Bellato e o professor de Direito Constitucional da Universidade de Brasília, Alexandre Bernadino Costa, também apontaram a manipulação da opinião pública e o risco de retrocesso nos direitos sociais conquistados nos últimos anos.

Eles cobraram um posicionamento mais firme da classe jurídica em defesa da Constituição e foram apoiados por Patrick Mariano, representante da Rede de Advogados Populares.

No debate, os senadores Lindbergh Farias (PT-RJ), Fátima Bezerra (PT-RN), Donizeti Nogueira (PT-TO) e Paulo Rocha (PT-PA) destacaram a falta de provas na denúncia contra a presidente Dilma Rousseff.

Ao final, Lindbergh leu a decisão do presidente em exercício da Câmara dos Deputados, Waldir Maranhão, de anular a votação pelo impeachment realizada naquela Casa no dia 17 de abril.


— Naquela votação da Câmara não houve imparcialidade e parece que o presidente interino da Câmara estava a escutar os senhores — disse Lindbergh, ressaltando os alertas feitos pelos especialistas quanto a ilegalidades do processo de impeachment em curso.

Foto: Pedro França/Agência Senado.



Pela 1ª primeira vez OEA vai julgar responsabilidade do Brasil em caso de trabalho escravo




Pela primeira vez desde que foi criada, em 1979, a Corte Interamericana de Direitos Humanos vai julgar uma denúncia por trabalho semelhante à escravidão. E o Brasil estará no banco dos réus, acusado de omissão e negligência na apuração e responsabilização de um caso de violação dos direitos humanos. Os supostos crimes foram identificados em uma propriedade particular no Pará, a Fazenda Brasil Verde, desde a década de 1980.

Os supostos crimes foram identificados em uma propriedade
particular no Pará, a Fazenda Brasil Verde.
A audiência pública será nos próximos dias 18 e 19, em San José, na Costa Rica, onde funciona a sede da Corte Interamericana – instituição judiciária responsável por aplicar a Convenção Americana sobre Direitos Humanos entre os estados-membros da Organização dos Estados Americanos (OEA). A sentença final só deverá ser divulgada dentro de alguns meses – provavelmente no segundo semestre deste ano.

A denúncia foi apresentada em 1998 pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) e pelo Centro Pela Justiça e o Direito Internacional (Cejil).

As duas organizações não-governamentais argumentam que o Estado brasileiro não adotou as providências necessárias para evitar e, posteriormente, punir os donos da fazenda e outras pessoas acusadas de submeter um grande número de trabalhadores à condições degradantes de trabalho, parecidas com a escravidão, entre os anos 1980 e 2000.

De acordo com a CPT, nas seis ocasiões em que fiscais estiveram na propriedade para verificar as condições dos trabalhadores, 340 pessoas foram resgatadas. Os nomes de 26 supostas vítimas são citados na resolução da presidência da Corte sobre a audiência deste mês. Além disso, a própria OEA, a partir das informações prestadas pelas denunciantes, fala “em um contexto no qual dezenas de milhares de trabalhadores foram submetidos ao trabalho escravo”. A maioria das vítimas é do sexo masculino, negra, tem entre 15 e 40 anos e morava em cidades pobres, marcadas pela falta de oportunidades de trabalho.

Entre os documentos anexados à denúncia, há testemunhos de trabalhadores que relataram ameaças de morte contra quem fugisse; provas de não pagamento de salários e de cobrança de dívidas contraídas desde o transporte das cidades de origem das vítimas até a compra de produtos de uso pessoal que só podiam ser adquiridos na própria fazenda; informações sobre comida e condições de saúde indignas, entre outros problemas.

Ao submeter o caso à apreciação da Corte, a Comissão Interamericana apontou que o Estado brasileiro é responsável pela situação de trabalho forçado e servidão por dívidas e pela situação de impunidade – fatos que violam a Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A comissão recomendou que o Brasil repare adequadamente as vítimas, investigue adequadamente as denúncias de trabalho escravo e suspeitas de desaparecimentos, apure a suposta omissão de funcionários públicos, entre outras medidas.

A CPT e a Cejil querem que o governo brasileiro proponha uma mudança constitucional que torne a submissão de alguém ao trabalho análogo à escravidão um crime imprescritível, o que permitiria que os responsáveis fossem julgados a qualquer tempo.

Segundo o coordenador da Campanha Nacional da CPT contra o trabalho escravo, frei Xavier Plassat, a expectativa das organizações sociais é que a Corte Interamericana aceite a denúncia de que o Brasil se omitiu na apuração do caso e também na implementação de políticas públicas que impeçam a reincidência e, principalmente, possibilitem que populações mais suscetíveis ao assédio de aliciadores superem o “círculo vicioso” do trabalho escravo.

Só em 1995, sob pressão internacional, o Brasil reconheceu a existência do trabalho escravo no país e criou o Grupo Móvel de Fiscalização (do Ministério do Trabalho) e o Plano Nacional de Erradicação”, lembra Frei Xavier.

De acordo com o coordenador da CPT, entre 1996 e 2002, as autoridades brasileiras intensificaram as autuações (principalmente no meio rural) e aprimoraram os mecanismos de combate ao trabalho análogo à escravidão, o que resultou na libertação de 6 mil pessoas. A partir de 2002, mais 45 mil pessoas foram libertados, revelando a dimensão do problema.

Em parecer pericial, o especialista indicado pela Comissão Interamericana, César Rodríguez Garavito, lembra que, perante o direito internacional, os Estados nacionais têm “obrigações de prevenir e investigar práticas de trabalho forçado por particulares”. Para a comissão, o caso “oferece uma oportunidade para que a Corte Interamericana desenvolva jurisprudência sobre o trabalho forçado e as formas contemporâneas de escravidão”.

Procuradas nessa quinta-feira (4), a Secretaria de Direitos Humanos e a Advocacia-Geral da União (AGU) ainda não se pronunciaram sobre o caso.