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Historiadora disponibiliza oficina sobre uso de fontes primárias da ditadura militar em sala de aula

 

Prontuário 1545, de Edmur Pericles de Camargo. Fonte: Arquivo Público do Estado de São Paulo.

A historiadora Caroline Silveira Bauer, professora do Departamento de História da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, disponibilizou gratuitamente em seu blog, “Falando da Ditadura”, o material completo da oficina “Trabalhando com fontes primárias sobre a ditadura civil-militar brasileira em sala de aula”. A atividade foi desenvolvida pela professora há alguns anos e desde o último dia 29 de março está disponível para download. Além do roteiro, estão disponíveis também documentos sobre militância, dados sobre desaparecidos, listas bibliográficas, indicações de sites, entre outros arquivos necessários para a reprodução da oficina.

A proposta de Bauer pode ser aplicada nos nonos anos do Ensino Fundamental ou no Ensino Médio. Segundo explica a historiadora, o objetivo da oficina é problematizar conceitos históricos e o manuseio de fontes primárias. Para isso, a atividade foca no caso do desaparecimento de Edmur Péricles Camargo, militante da organização M3-G (Mao, Marx, Marighella, Guevara). Clique aqui para conferir o material.

O “Falando da Ditadura” é Blog de divulgação histórica e disponibilização de recursos didáticos para o ensino da história da ditadura civil-militar brasileira e está vinculada ao Laboratório de Estudos sobre os Usos Políticos do Passado (LUPPA).
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Com informações do Café História.

Bolsonaro, ‘cúmplice da tortura e da morte’, não merece confiança dos brasileiros, afirma Dilma

 

(FOTO/ Roberto Stuckert/PR e Pedro Ladeira/Folhapress).

 O ocupante do Palácio do Planalto se comporta como um fascista. E, no poder, tem agido exatamente como um fascista”, disse a ex-presidenta Dilma Rousseff (PT), para quem Jair Bolsonaro tem “índole de torturador”. O presidente debochou hoje (28) do fato de Dilma ter sido presa e torturada durante a ditadura civil-militar (1964-1985). Bolsonaro tem histórico de defesa do regime totalitário que aplicava sistematicamente tortura contra adversários políticos.

Carlos Bolsonaro defende ditadura para que “a transformação que o Brasil quer” aconteça


Carlos e o pai, Jair Bolsonaro (Reprodução). 

O vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ), em uma sequência de tuítes postados nesta segunda-feira (9), sugeriu uma ruptura democrática para que “a transformação que o Brasil quer” aconteça. Em outras palavras, pregou a ditadura.

Manifestação reivindica a proibição de se manifestar


As aberrações de um grupo de lunáticos reivindicando intervenção militar e defendendo Bolsonaro, na rua e nas redes sociais, não me produzem raiva, mas tristeza. Me comovem negativamente por duas razões básicas:

1- porque o fato dessas pessoas pensarem e expressarem isso é o retrato de como as forças da ditadura permanecem vivas e influentes, mostra o quão todos os crimes de lesa humanidade, como tortura, estupro e assassinados são banalizados por alguns; e pior que isso, são reivindicados como "salvação do país" por muitos destes.

2- porque noto um desconhecimento colossal de parcela das pessoas que lá estão fazendo esse papel ridículo e degradante, sobre a história do país e, principalmente, sobre o que significou a ditadura empresarial-militar. São centenas os filmes, documentários, depoimentos, livros, pesquisas para se estudar, é abundante o material disponível para se libertar da ignorância e conseguir compreender seu entorno um pouco além do umbigo. Nos próximos dias sairá o relatório da Comissão Nacional da Verdade que será outra ferramenta pedagógica importante para estudos.

Se manifestar com liberdade, reivindicando não ter mais liberdade para se manifestar é um ato que só pode ser feito por quem usufruiu individualmente de privilégios na ditadura, por quem tem prazer em saber da existência de violenta repressão ou por quem não consegue viver sem exercer poder tirânico sobre os outros.

Quero deixar claro que não concebo esse tema no campo das divergências políticas e ideológicas, o trato como sintoma claro de problemas de sanidade mental, de saúde mental, de transtorno de personalidade. Isso se expressa tanto no saudosismo da "ordem" e da violência de Estado, como no grau de contradição, irracionalidade e falta de lógica dos argumentos, xingamentos, cântico e cartazes que expressavam tal saudosismo.

Com isso registro que na vida real ou virtual não terei tolerância com a defesa da total intolerância, ou seja, com a defesa da ditadura empresarial-militar e de seus representantes como Bolsonaro e outros. Não há nenhuma chance de uma pessoa que defenda tais dogmas e crimes representar um convívio saudável e agregador, pelo contrário.


Via Augere/O Fato e a História




Senado dá o primeiro passo para revisar a Lei da Anistia


O Senado deu ontem o primeiro passo para aprovar mudanças na Lei de Anistia, aprovada em 1979, que livrou de julgamento os que praticaram crimes políticos no regime militar de 1964 a 1985. A revisão foi aprovada pela Comissão de Direitos Humanos da casa, em Brasília. Para entrar em vigor, ainda precisa passar por outras duas comissões e a Câmara dos Deputados.

Comissão de Direitos Humanos no Senado aprovou
ontem revisão na Lei da Anistia. Mudanças ainda precisam
passar pelo plenário.
O projeto aprovado exclui da anistia concedida pela lei os crimes cometidos por agentes públicos, militares ou civis, contra opositores do Governo, no período por ela abrangido. A proposta também declara extinta, retroativamente, a prescritibilidade desses crimes, o que poderia impedir a punição de crimes da ditadura. Autor do projeto, o senador Randolfe Rodrigues (Psol-AP) afirma ser impossível punir crimes cometidos por agentes do Governo na ditadura militar sem que a Lei de Anistia seja modificada.

O caminho obrigatório é a investigação, a responsabilização e a punição dos culpados”, afirmou. Relator do projeto, o senador João Capiberibe (PSB-AP) disse que a falta de punição a esses crimes é “injusta” porque ferem direitos humanos fundamentais no país. Capiberibe lembrou que diversos países que viveram regimes ditatoriais responsabilizaram aqueles que cometeram crimes em nome do Estado.

A aprovação ocorre em meio aos 50 anos do golpe militar. Ao relembrar a data no final de março, a presidente Dilma Rousseff sinalizou ser contrária a mudanças na Lei de Anistia. Dilma afirmou, ao relembrar os 50 anos do golpe, que “reconhece” e “valoriza os pactos políticos que levaram o país à redemocratização”. Dilma, que foi presa e torturada, acrescentou que muitos foram vítimas da “truculência do Estado” e que o período deixou “cicatrizes visíveis e invisíveis”.

STF versus OAB

Em 2010, o Supremo Tribunal Federal (STF) entendeu que a Lei da Anistia não estava em desacordo com a Constituição, diferentemente do que afirmava a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Na época, a OAB ingressou com ação no STF questionando a Lei da Anistia.

A entidade defende a responsabilização de agentes do Estado e militares acusados de crimes de lesa humanidade, como os de tortura, ocorridos durante a ditadura.

Também em 2010, a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), instituição judicial autônoma cuja convenção é assinada pelo Brasil, condenou o Estado brasileiro por omissão nos casos de desaparecimentos forçados na Guerrilha do Araguaia (1972-1974), quando cerca de 70 militantes foram mortos, e determinou que o País deve apenar criminalmente as violações ocorridas durante a ditadura.

Via Folhapres/O Povo

Meio Século da Ditadura Civil-Militar: Imprensa – “mais do que aceitou, foi uma arma essencial do regime..”*


Notícia sobre a morte de Msrighella.
Desde fins da década de 1990, parte da historiografia brasileira sublinha que o (equivocado) processo de Anistia cunhou a (errônea) visão de que vivemos envoltos em uma tradição de valores democráticos. A partir das lutas pela Anistia, como sublinha Daniel Aarão Reis, “libera-se” a sociedade brasileira de “repudiar a ditadura, reincorporando sua margem esquerda e reconfortando-se na ideia de que suas opções pela democracia tinham fundas e autênticas raízes históricas”. Nesse momento, plasmou-se a imagem de que a sociedade brasileira viveu a ditadura como um hiato, um instante a ser expurgado. Confrontando-nos à tal memória inventada, há no período republicano longos momentos de exceção – como nos referimos aos regimes ditatoriais.

Se tais premissas correspondessem aos fatos, restaria explicar: por que houve apenas restritos episódios de resistência vinculados igualmente a pequenos grupos? Por que se permitiu aprovar uma Anistia recíproca, que mesmo nestes 50 anos após o golpe civil-militar, ainda é tema espinhoso de revisão?
A luta contra o arbítrio, de forma armada ou não, definitivamente não caiu nas graças do povo deste berço esplêndido. E, certamente, os meios de comunicação de massa – a grande imprensa e posteriormente, a TV – têm um papel preponderante nas escolhas sociais implantadas.

São clássicos os editoriais do Correio da Manhã nas vésperas do 1º de Abril de 1964, clamando por “Basta” e “Fora” a Jango. Igualmente, é emblemática a noção de que este jornal, ao realizar um “mea-culpa” e se colocar em oposição ao novo regime, foi punido com perseguições que levaram a sua falência. Esquecem-se, contudo, os amplos problemas de gerenciamento vividos por Niomar Moniz Sodré.

Ícones de resistência são lembrados, afirmados, expostos e sublinhados maciçamente para ratificar a tradição democrática brasileira, como: a meteorologia para o 14/12/1968, no Jornal do Brasil; as receitas de bolo do Jornal da Tarde; os poemas de Camões no Estadão; os inúmeros jornalistas perseguidos, demitidos, torturados e mortos; etc., que definiriam a grande imprensa brasileira como resistente ao golpe e, posteriormente, ao arbítrio. Mesmo com todo este esforço, o processo ditatorial perdurou por mais de duas décadas.

Meio século depois e com inúmeros textos publicados sobre a mais recente ditadura brasileira, poder-se-ia ressaltar que nunca a grande imprensa brasileira estampou na primeira página dos periódicos um aviso claro afirmando: “Este jornal está sob censura”. As estratégias acima apontadas e outras, que frequentemente voltam à tona para reforçar a ação resistente, contavam com a capacidade do público leitor em decifrar pistas.

O jornalista Oliveiros Ferreira, que por décadas trabalhou no Estadão, narrou as ligações recebidas pela redação indagando que a receita de bolo na primeira página do Jornal da Tarde estava errada. O bolo solava. Ou, como definiu Coriolano de Loyola Cabral Fagundes, censor desde 1961 e que atuou no Estadão, os poemas de Camões foram ali uma concessão. Certamente a censura federal apostava que o leitor não entenderia o seu porquê, ou se tranquilizaria na (efêmera) ilusão que mesmo no arbítrio lhe eram permitidos lampejos de resistência, os quais, efetivamente nada alteravam. Algo semelhante, contudo, não foi autorizado à (antiga) Veja, que, durante a “distensão” do governo Geisel, substitui as matérias censuradas por imagens de diabinhos, já que não se podiam publicar espaços em branco. Advertida, teve que parar, pois certamente o leitor de Veja à época entenderia o recado. Certamente como compreendeu a mensagem da revista quando da morte de Vlado, numa nota pequena de desculpas por não poder nada mais expressar.

Os inúmeros jornalistas perseguidos, demitidos, torturados e mortos sofreram estas horríveis barbáries enquanto atuavam como militantes das esquerdas, em ações armadas ou como simpatizantes, como demonstram os processos que arrolam os seus nomes. Da mesma forma, existiram imposições governamentais de expurgos nas redações. Tais limpezas ocorreram logo depois do golpe e perduraram até e inclusive no governo Geisel, que impunha a bandeira do fim da censura. Muitos jornalistas/militantes poderiam ser citados como vítimas destas ações, já que, como pontuava lúcida e ferinamente Cláudio Abramo, “nas redações não há lugar para lideranças. Os donos dos jornais não sabem lidar com jornalistas influentes que, muitas vezes, se chocam com as diretrizes do comando. O jornalista tem ali uma função, mas ‘ficou forte, eles eliminam’.”

Os meios de comunicação são empresas que buscam o lucro, vendendo a visão particular sobre um fato e, como Abramo por vezes demarcou, um “equívoco que a esquerda geralmente comete é o de que, no Brasil, o Estado desempenha papel de controlador maior das informações. Mas não é só o Estado, é uma conjunção de fatores. O Estado não é capaz de exercer o controle, e sim a classe dominante, os donos. O Estado influi pouco, porque é fraco. Até no caso da censura, ela é dos donos e não do Estado. Não é o governo que manda censurar um artigo, e sim o próprio dono do jornal. Como havia censura prévia durante o regime militar, para muitos jornalistas ingênuos ficou a impressão de que eles e o patrão tinham o mesmo interesse em combater a censura”.

Existiram pouco mais de 220 censores federais, muitos deles com o diploma de jornalista – sendo que o primeiro concurso público para o cargo ocorreu em 1974, quando Geisel prometia o fim da censura. Estas duas centenas de pessoas atuavam reprimindo: cinema, TV, rádio, teatro, jornais, revistas, etc., entre 1964 e 1988, em todo o território nacional. Para que as expectativas governamentais dessem certo, os donos das empresas de comunicação tinham de colaborar – e não resistir.

Inúmeros arquétipos podem corroborar tal ideia, até porque a autocensura não é desconhecida das redações, e não se iniciou no pós-1964 no Brasil. No Jornal do Brasil, por exemplo, editou-se, em 29/12/1969, como me cedeu o seu exemplar o secretário de Redação, José Silveira, uma circular interna de cinco páginas, elaborada pelo diretor do jornal, José Sette Câmara, para o editor chefe, Alberto Dines, denominada “Instruções para o controle de qualidade e problemas políticos (Grifo da Redação do Informações em Foco)”, criada com o objetivo de “instituir na equipe um (...) Controle de Qualidade (...) sob o ponto de vista político”.

Estabelecida dias antes do Decreto-Lei 1.077, de 26/01/1970, que legalizou a censura prévia, e um ano após o AI-5, a diretriz de Sette Câmara pontuava que “não se trata de autocensura, de vez que não há normas governamentais que limitem o exercício da liberdade de expressão, ou que tornem proibitiva a publicação de determinados assuntos. Em teoria há plena liberdade de expressão. Mas na prática o exercício dessa liberdade tem que ser pautado pelo bom senso e pela prudência”, já que “a posição do JB ao proferir que este não é a favor nem contra, (...) não é jornal de situação, nem de oposição. O JB luta pela restauração da plenitude do regime democrático no Brasil, pelo retorno do estado de direito. (...) Enquanto estiver em vigor o regime de exceção, temos que usar todos os nossos recursos de inteligência para defender a linha democrática sem correr os riscos inúteis do desafio quixotesco ao Governo. (…) O JB teve uma parte importante na Revolução de 1964 e continua fiel ao ideário que então pregou. Se alguém mudou foram os líderes da Revolução. [Nesse sentido, o JB deverá] sempre optar pela suspensão de qualquer notícia que possa representar um risco para o jornal. Para bem cumprirmos o nosso maior dever, que é retratar a verdade, é preciso, antes de mais nada, sobreviver”. Sette Câmara termina decretando que, “na dúvida, a decisão deve ser pelo lápis vermelho”.

Em meados da década de 1970, foi a vez da Rede Globo – uma concessão pública – formalmente instituir o “Padrão Globo de Qualidade” (Grifo da Redação do Informações em Foco), ao contratar José Leite Ottati – ex-funcionário do Departamento de Polícia Federal – para realizar a censura interna e evitar prejuízos advindos da proibição de telenovelas. Segundo Walter Clark, a primeira interdição da censura na Globo ocorreu em 1976, na novela Despedida de casado. Para blindar a emissora, o “Padrão Globo de Qualidade” receberia o auxílio de pesquisas de opinião feitas por Homero Icaza Sanchez – o “Bruxo” –, encarregado de identificar as motivações da audiência.

Definindo toda essa tática, Clark explicou que, “(...) enquanto a Censura agia para subjugar e controlar a arte e a cultura do país, perseguindo a inteligência, nós continuávamos trabalhando na Globo para fazer uma televisão com a melhor qualidade possível.” Organizada a autocensura, o “Padrão Globo de Qualidade” teve acrescidos outros ingredientes para o seu sucesso. Em sintonia com a imagem, divulgada pelo governo autoritário, de um “Brasil Grande”, formulou-se também uma “assessoria militar” ou uma “assessoria especial” composta por Edgardo Manoel Ericsen e pelo coronel Paiva Chaves. Segundo Clark, “ambos foram contratados com a função de fazer a ponte entre a emissora e o regime. Tinham boas relações e podiam quebrar os galhos, quando surgissem problemas na área de segurança”.

Esquema semelhante a este foi adotado pela Editora Abril, exposto em uma correspondência de Waldemar de Souza – funcionário da Abril e conhecido como “professor” –, a Edgardo de Silvio Faria – advogado do grupo e genro do sócio minoritário Gordino Rossi –, na qual comunicava o contato tanto com o chefe do Serviço de Censura em São Paulo – o censor de carreira e jornalista José Vieira Madeira –, como com o diretor do Departamento de Censura de Diversões Públicas – Rogério Nunes – para facilitar a aprovação das revistas e a chegada às bancas sem cortes.

Estes vínculos do “professor” com membros do governo são anteriores a esse período e justificam seu potencial de negociação. Desde novembro de 1971 o relações-públicas do DPF, João Madeira – irmão de José Vieira Madeira –, expediu uma carta ao diretor-geral da Editora Abril na qual ratificava o convite do general Nilo Caneppa, na época diretor do DPF, a Waldemar de Souza para que fosse a Brasília ministrar um curso especial aos censores. Em maio de 1972, o próprio general Caneppa enviou a Vitor Civita, diretor-geral da Abril, uma correspondência de agradecimento pelas palestras sobre censura de filmes, que Waldemar de Souza proferiu na Academia Nacional de Polícia. Para continuar colaborando, no ano seguinte, Souza formulou uma brochura intitulada “Segurança Nacional: o que os cineastas franceses esquerdistas já realizaram em países da América do Sul e pretendem repetir aqui no Brasil”. E, em 1974, com o general Antonio Bandeira no comando do DPF, Waldemar de Souza, em caráter confidencial, expôs o porquê de censurar Kung Fu e sua mensagem que “infiltra a revolta na juventude”.

Por fim, mas não menos importante, há a atuação do Grupo Folha da Manhã, proprietário da Folha de S. Paulo e da Folha da Tarde, entre outros, no período. Em dezessete anos, entre 19/10/1967 e 7/5/1984, o país foi dos “anos de chumbo” ao processo das Diretas Já, e a Folha da Tarde vivenciou uma redação tanto de esquerda engajada – até o assassinato de Marighella –, como, a partir daí, de partidários e colaboradores do autoritarismo.

Durante uma década e meia sob o comando de policiais, o jornal adquiriu um apelido: o de “maior tiragem”, já que muitos dos jornalistas que ali trabalharam eram igualmente “tiras” e exerciam cargos na Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo. A partir deste perfil de funcionários, a Folha da Tarde carrega a acusação de “legalizar” mortes decorrentes de tortura, se tornando conhecido como o Diário Oficial da Oban.

Isto explica o porquê de os carros do Grupo Folha da Manhã serem incendiados por militantes de esquerda, nos dias 21/9/1971 e 25/10/1971. A ação era uma represália, já que o grupo era acusado de ceder automóveis ao Doi-Codi que, com esse disfarce, montava emboscadas, prendendo ativistas.
Nesse momento de ponderações sobre os 50 anos do golpe, recordo-me que, quando dos 30 anos do AI-5, o jornalista Jânio de Freitas publicou na Folha de S. Paulo uma advertência não cumprida por seus pares, inclusive agora, nas reflexões dos periódicos aos 50 anos do golpe civil-militar de 1964. Corroborando com tudo o que foi exposto aqui, Freitas lembrava em 1998 que “a imprensa, embora uma ou outra discordância eventual, mais do que aceitou o regime: foi uma arma essencial da ditadura. Naqueles tempos, e desde 64, o Jornal do Brasil [...] foi o grande propagandista das políticas do regime, das figuras marcantes do regime, dos êxitos verdadeiros ou falsos do regime. (...) Os arquivos guardam coisas hoje inacreditáveis, pelo teor e pela autoria, já que se tornar herói antiditadura tem dependido só de se passar por tal”.

O jornalista ao finalizar, adverte, e peço-lhe licença para me utilizar aqui, de suas conclusões. Trocarei 30 por 50 anos, AI-5 por golpe civil-militar de 1964, e o que estiver entre colchetes é de minha autoria. Assim: precisamos aproveitar os 50 anos do golpe civil-militar de 1964 para mostrar mais como foi o regime que [se instaurou a partir dali], eis uma boa iniciativa. Mas não precisava [como fizeram muitas narrativas recentes] reproduzir também os hábitos de deformação costumeiros naqueles tempos.

A análise é de Beatriz Kushnir, historiadora, doutora em História pela Unicamp, autora, entre outros de, Cães de guarda: jornalistas e censores, do AI-5 à Constituição de 1988 (Boitempo, 2012) e foi publicado originalmente no Carta Capital