Jornal “O Homem de Côr”, o 1º periódico dedicado a causa negra da imprensa brasileira


O Homem de Côr. (FOTO/Reprodução do jornal digitalizado).

Criado pelo jornalista, poeta, tipógrafo e livreiro Francisco de Paula Brito, o quinzenário O Homem de Côr foi o primeiro jornal brasileiro a lutar contra a discriminação racial, 55 anos antes da abolição da escravatura no Brasil. Lançado a 14 de setembro de 1833 como produto da Typographia Fluminense de Brito & Cia. – loja instalada no Largo do Rocio, atual Praça Tiradentes, onde a presença negra era marcante –, o surgimento desse precursor da imprensa negra esteve contextualizado com a proliferação de pasquins de crítica política entre o fim do Primeiro Reinado e o início do Período Regencial, no início da década de 1830. A partir de sua 3ª edição, de 16 de outubro de 1833, o periódico passou a se chamar O Mulato, ou O Homem de Côr, mas logo em seguida sua publicação foi suspensa: a edição nº 5, de 4 de novembro de 1833, foi a última a ser lançada.

Nelson Werneck Sodré, em “História da imprensa no Brasil”, nos ajuda a caracterizar o período em que O Homem de Côr circulou, no âmbito das lutas sociais:

As inquietações geradas em três séculos de domínio colonial, sob a rígida estrutura do latifúndio, deflagrariam na fase de transformação em que se esboçariam os traços fundamentais de um regime novo, para a nova situação, a da autonomia. No fundo, as contradições repontavam como a ação de forças ainda recentes contra a inércia do mundo rural. Traduziam-se sob formas as mais diversas, tal a de apresentar o comerciante luso como responsável por todas as mazelas, propício a todos os golpes, misturando-se a condição nacional e a condição de classe, como já se começava a misturar, em relação aos africanos e seus descendentes, a condição de cor e a condição de classe. Entre os pasquins da época, aliás, muitos denunciam até pelos títulos – O Crioulo, O Crioulinho, O Mulato, O Cabrito, O Homem de Côr – o problema que surgia. (p. 157)

Disponível em pontos de venda ou por assinatura ao preço de 40 réis o exemplar, O Homem de Côr, como bom pasquim, era editado no anonimato. Não só crítico e reflexivo como também denunciativo – o periódico ressaltou a prisão arbitrária de Maurício José de Lafuente pela Regência em toda a sua 4ª edição, de 12 de junho de 1833 – o jornal, na parte superior esquerda de todas as primeiras páginas de suas edições, trazia a transcrição do parágrafo XIV do artigo 179 da Constituição de 1824, onde se dizia que “Todo o Cidadão pode ser admitido aos cargos públicos civis, políticos e militares, sem outra diferença que não seja a de seus talentos e virtudes”, ao lado de uma citação discriminatória do então presidente da província de Pernambuco, Manoel Zeferino dos Santos. Apresentando-se ao debate quanto às promessas de abolição da escravatura, à época, a luta negra por espaços no serviço público – contra as tentativas das elites de limitar a liberdade e o exercício da cidadania dos negros livres – era um tópico crucial na questão racial brasileira.

Apesar de sua curta existência de apenas cinco edições, a iniciativa de Francisco de Paula Brito e sua Typographia Fluminense – que um ano antes havia lançado A Mulher do Simplício ou A Fluminense Exaltada, órgão de ataques a Evaristo da Veiga, e que mais tarde seria a editora que se notabilizaria pela revelação do escritor Machado de Assis ao público – ganhou a simpatia de outras tipografias, já em 1833: os pasquins Brasileiro Pardo e O Lafuente surgiriam logo em seguida a’O Homem de Côr, pela tipografia Paraguassu, e O Cabrito viria a lume pela Miranda & Carneiro. O Crioulinho passou a ser editado em 30 de setembro, na Typographia do Diário. A própria Typographia Fluminense, ademais, lançaria O Meia Cara em novembro de 1833. Constituía-se, assim, a primeira imprensa negra do Brasil.

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Com informações da Biblioteca Nacional Digital.

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