A
aprovação em primeiro turno do texto-base da proposta de reforma da Previdência
na Câmara mal foi concluída e já passou a ser chamada de “tratorada”, diante
das artimanhas usadas pelo governo e sua base para comprar votos. Além do
aumento de emendas no valor total de R$ 2 bilhões para R$ 3 bilhões para os
deputados, hoje (10) o Executivo autorizou refinanciamento de dívidas de
agricultores – a pedido dos ruralistas. E o ministério da Saúde liberou mais R$
100 milhões em verbas para o setor em vários municípios.
Até
a madrugada desta quarta-feira já tinham sido oferecidas verbas extras do
orçamento e desaceleração de empenhos. Tudo disso, diante de avisos pelos
governistas de monitoramento sobre quem votaria e quem não votaria com a
reforma, num recado claro que só seria contemplado quem estivesse favorável ao
texto da proposta.
Os
acertos de hoje foram avaliados, também, como uma tentativa de minimizar
supostos acordos feitos nos bastidores entre os parlamentares para que a
proposta, após aprovada em sua integralidade na Câmara, fique parada no Senado
em “compasso de espera” até que as promessas feitas pelo Executivo aos
deputados sejam cumpridas.
Um “toma lá, dá cá” como poucas vezes se
viu. Mesmo num país cujo Legislativo é acostumado a esses procedimentos. A conta,
que por baixo passa de R$ 3 bilhões, conforme cálculos de partidos da oposição
como PT e Psol, não está totalmente garantida pelo orçamento. Ou seja: pode ser
retirada da verba de outros programas de Saúde e Assistência Social.
Segundo
o líder do PT, Paulo Pimenta (RS), uma das alternativas oferecidas pelo
governo, a promessa de empenho de emendas sem autorização legislativa, é
“irregular e ilegal”. O líder do Psol, Ivan Valente (SP) também criticou a
medida e as duas siglas ficaram de entrar na Justiça.
A
queixa dos dois líderes diz respeito à promessa de pagamento de um valor extra
R$ 1 bilhão, quando na verdade o valor está atrelado a uma emenda no montante
de R$ 93 milhões aprovada pela Comissão de Seguridade Social da Câmara cujo
valor original era de R$ 2 bilhões.
Essa
emenda é destinada ao aumento do custeio de serviços de assistência hospitalar
e ambulatorial, mas o volume de recursos, para chegar a esses R$ 2 bilhões,
ainda precisa ser aprovado pelo Congresso.
‘Cheque em branco’
“Despesas públicas dependem de
autorização expressa do Legislativo. O governo pode executar uma emenda na sua
totalidade, mas não pode ultrapassar o valor autorizado pelo Congresso
Nacional. O que estão fazendo é passando um cheque em branco para os
parlamentares para conseguirem pelo Congresso a liberação destes recursos
posteriormente”, afirmou Paulo Pimenta.
“Isso é uma ilegalidade completa e coloca em
xeque a votação da Previdência. Isso se chama corrupção”, completou Ivan
Valente.
Na
conta dos deputados, o acordo feito pelo Palácio do Planalto com as bancadas
foi de que cada um deles, que têm direito a R$ 15,4 milhões em emendas
individuais pelo Orçamento Geral da União, passaria a receber R$ 4,6 milhões a
mais se votasse favoravelmente à proposta. Tudo isso, em emendas para os
estados e municípios que compõem suas bases eleitorais.
“A proposta é o “alicerce para a reconstrução
do país”, argumentou a líder do governo no Congresso, deputada Joice
Hasselmann (PSL-SP), quando questionada a respeito, sem saber explicar as
contradições de um governo que pregou, durante a campanha eleitoral, que
acabaria com o chamado ‘toma lá, dá cá’”. “Essa
proposta foi construída com a ajuda de muitos dos deputados”, ressaltou.
Conforme
contaram vários colegas, Joice passou a tarde com planilhas para acompanhar
toda a votação dos deputados. Ela foi
rebatida pelo líder da oposição, Alessandro Molon (PSB-RJ), que afirmou em fala
no plenário que a proposta vai criar um país mais desigual. “É justo fazer um trabalhador que ganha em torno
de R$ 2 mil deixar para o seu viúvo ou viúva menos de um salário mínimo”,
perguntou.
O
deputado Henrique Fontana (PT-RS) lembrou que os recursos que o Executivo
pretende conseguir com a reforma poderiam ser arrecadados de outra maneira,
como por meio do aumento de impostos sobre lucros, dividendos e grandes
fortunas e com a revisão de incentivos fiscais concedidos. A seu ver, “é possível buscar financiamento suficiente
daqueles que podem pagar, sem atacar os mais pobres”.
‘Desrespeito’ ao regimento
Dois
momentos tensos da votação da matéria foram observados na madrugada de ontem e
na tarde de hoje. Ontem, suscitou discussão entre os parlamentares o
questionamento feito pela deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) sobre as regras
estabelecidas pelo regimento interno da Casa.
Pouco
tempo depois de o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), ter defendido o
mérito de uma proposta para ser apresentada em outra sessão, a parlamentar
criticou o fato de Maia ter tomado tal iniciativa enquanto presidia os
trabalhos na mesa diretora. Talvez por esse motivo, ele preferiu deixar a mesa
para falar como deputado na tribuna do plenário, ao final da votação.
“Não podemos ser tratorados quanto ao
regimento desta Casa. O presidente não pode fazer defesa de mérito sentado na
sua cadeira. Diante de uma matéria complexa como esta é importante que tenhamos
o direito de levantar questão de ordem e falar com profundidade sobre a
matéria. Até porque a propaganda feita pelo governo com o dinheiro público não
explica bem para a população o quanto é danosa esta proposta”, afirmou
Jandira.
Os
oposicionistas também se queixaram de Maia por ter proibido a manifestação por
parte da oposição, de faixas e placas. O presidente da casa argumentou que isso
é proibido pelas normas regimentais e se defendeu dizendo que está atuando para
que sejam seguidas à risca.
À
tarde, outra tensão foi observada, mas entre manifestantes e policiais
legislativos na entrada do anexo 2 da Câmara. Eles foram impedidos de passar
para as galerias e tiveram de se posicionar por trás das grades de isolamento
colocadas no local pela segurança do Congresso, mas o protesto foi organizado
de forma pacífica.
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Com informações
da RBA.
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