A imagem de Bolsonaro não sobrevive a 15 minutos de fama


Acostumado a habitar o breu onde vivem os parlamentares do baixo clero, Jair Bolsonaro é o típico político que sempre aproveitou o fato de ser um insignificante desconhecido para praticar suas mutretas longe dos holofotes da mídia. Foi assim que transformou parentes em CCs, iniciou os filhos na política enquanto carreira e enriqueceu muito no exercício dos mandatos.

Agora o jogo está virando. Se antes apenas seu discurso de ódio contra mulheres, negros e a população LGBT eram conhecidas do público, agora começam a vir à tona elementos ainda mais obscuros de sua trajetória. Em segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto para presidência da República – retrato da falência política do país, com o crescimento da direita após o fracasso de uma esquerda que se adaptou ao sistema –, Bolsonaro está no centro das atenções. Sua vida pregressa não resiste ao mínimo escrutínio dos jornalistas. A imagem de Bolsonaro não sobrevive a 15 minutos de fama.

Desde que se lançou pré-candidato, atraindo com a forte presença nas pesquisas o interesse da mídia, Bolsonaro teve que responder a uma sucessão de escândalos praticados quando era um ilustre Zé Ninguém na Câmara. O jornal O Globo revelou que o deputado e seus filhos parlamentares empregaram em seus gabinetes uma ex-mulher, uma ex-cunhada e um ex-sogro de Bolsonaro. Em seguida, a Folha de São Paulo apontou que a atual esposa de Bolsonaro foi funcionária de seu gabinete, chegando a receber um salário equivalente hoje a R$ 14,1 mil. Ela só foi exonerada em novembro de 2008, dois meses após o STF regulamentar em súmula o crime de nepotismo na administração pública.

As falcatruas do deputado vêm de longe, antes mesmo de seu ingresso na política. Quando estava no Exército, admitiu ter cometido atos de indisciplina e deslealdade com seus superiores. Foi, inclusive, acusado de elaborar um obscuro plano para explodir bombas em unidades militares. O então capitão foi considerado culpado por um conselho formado por três coronéis, mas acabou sendo absolvido por oito votos a quatro no Superior Tribunal Militar.

Foram os militares que primeiro identificaram em Bolsonaro uma ganância incompatível com a vida nos quarteis. Em 1983, uma ficha de informações produzida pela Diretoria de Cadastro e Avaliação do Ministério da Defesa atestou que o capitão “deu mostras de imaturidade ao ser atraído por empreendimento de garimpo de ouro” e que “deu demonstrações de excessiva ambição em realizar-se financeira e economicamente”.

Se a aventura no garimpo e a passagem pelo Exército não renderam a Bolsonaro a riqueza que tanto almejava, a carreira na política, sim. Recente reportagem da Folha de São Paulo demonstra que ele e seus filhos parlamentares são donos de 13 imóveis e acumulam um patrimônio de R$ 15 milhões. Um feito invejável para quem ingressou na política em 1988 com apenas um Fiat Panorama, uma moto e dois terrenos pequenos que valeriam pouco mais de R$ 10 mil hoje em dia.

Bolsonaro fez fortuna na política. Seus sete mandatos de deputado, com salário líquido de R$ 24 mil, além de um soldo de capitão da reserva no valor de R$ 5,6 mil, são sua única fonte de renda declarada. Há forte suspeita de que suas transações imobiliárias sejam pretexto para lavagem de dinheiro e sonegação de impostos – uma prática que o deputado se orgulha de admitir e incentivar.

Uma das mansões de Bolsonaro, em zona nobre do Rio de Janeiro, foi avaliada pela prefeitura em R$ 1,06 milhão. Misteriosamente, o imóvel foi vendido ao deputado por R$ 400 mil – sendo que a proprietária o havia comprado anteriormente por R$ 580 mil.

Não existe caridade no mercado imobiliário. Mas na Câmara dos Deputados, aparentemente sim. Mesmo com imóvel próprio em Brasília desde o fim dos anos 1990, Bolsonaro recebe, auxílio moradia do Congresso, no generoso valor de R$ 4,2 mil. Essa regalia da qual não necessita já rendeu a Bolsonaro e seu filho Eduardo a fortuna de R$ 730 mil desde 1995.

Estas não são acusações, são fatos. Elementos concretos trazidos pela imprensa após breves investigações sobre a vida do segundo colocado nas pesquisas presidenciais. A resposta do deputado a todos estes questionamentos é a mesma e tem a profundidade de um pires. Para Bolsonaro, trata-se de uma conspiração da mídia para assassinar sua reputação.

O pior é que muita gente acredita. A torcida de Bolsonaro nas redes sociais insiste em ignorar as reportagens. Qualifica veículos como Folha de São Paulo e O Globo de “mídia esquerdista” e utiliza como resposta as denúncias contra o ex-presidente Lula – curiosamente, muitas delas bastante noticiadas pela mesma “mídia esquerdista” que também se debruça sobre a vida de Bolsonaro.

Outra consequência da crescente visibilidade de Bolsonaro é uma tentativa patética de suavização de seu discurso. Como se fosse possível esconder embaixo do tapete o deputado que, aos 44 anos, disse ser favorável à tortura e defendeu uma guerra civil que mate pelo menos 30 mil brasileiros, incluindo o então presidente Fernando Henrique Cardoso.

O Bolsonaro-candidato também apresenta uma hipócrita faceta liberal. Uma contradição gritante com sua histórica defesa da ditadura militar, cuja política econômica encontrou no Estado forte seu principal esteio. () Aliás, a confusão política parece fazer parte da trajetória de Bolsonaro, um parlamentar de extrema-direita que já foi um apoiador confesso de Hugo Chávez.

O mais recente capítulo desta farsa ganhou ares tragicômicos, com a filiação de Bolsonaro ao Partido Social Liberal (PSL). Comandado pelo cartola Luciano Bivar – um excêntrico ex-candidato à presidência que em 2006 fez 0,06% dos votos –, o PSL foi entregue a Bolsonaro de uma forma que nem o PEN/Patriota, outro balcão de negócios disfarçado de partido político, aceitou. Como consequência, os liberais puro-sangue abrigados no Livres, que foram ingênuos o bastante a ponto de acreditar que conseguiriam renovar uma legenda de aluguel, saíram do PSL envergonhados pela porta dos fundos. Conhecido entre os liberais gaúchos, Fábio Ostermann perdeu seu partido para Bolsonaro.

Nem mesmo o apelo autoritário e armamentista – última bravata que resta a Bolsonaro – resiste a um olhar sobre seu passado. No dia 4 de julho de 1995, o deputado foi assaltado por dois homens no Rio de Janeiro. Levaram sua moto e, pasmem, sua arma! (Por Samir Oliveira, no Sul21).

*Samir Oliveira é jornalista e militante da Setorial LGBT do PSOL/RS.

Em segundo lugar nas pesquisa de intenção de voto para presidente da república, Bolsonaro está no centro das atenções. (Foto: Guilherme Santos/Sul21).



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