Ninguém
em sã consciência é contra ampliar crédito habitacional para a classe média
poder adquirir sua casa própria. O problema é quando isso é feito em detrimento
à execução de programas de habitação para os mais pobres, que são os que mais
sofrem com a falta de moradias decentes.
Quando
o Conselho Monetário Nacional decide aumentar, temporariamente até o final do
ano, o teto do imóvel financiado com recursos do Fundo de Garantia por Tempo de
Serviço (FGTS) para R$ 1,5 milhão e quando o Palácio do Planalto divulga que o
financiamento do ''Minha Casa, Minha Vida'' passa a beneficiar quem ganha até
R$ 9 mil mensais, não é apenas a construção civil que eles querem reativar, mas
também conquistar a simpatia da classe média que anda enjoada com a quantidade
de denúncias de corrupção de membros do governo federal. Hoje, o teto é entre
R$ 800 e 950 mil dependendo do Estado.
Ao
mesmo tempo, o governo Temer vai reduzindo o foco na política de moradia que
beneficia os mais pobres. O Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) está
acampado em frente ao prédio que abriga o escritório da Presidência da
República, na avenida Paulista, em São Paulo, exatamente para protestar contra
essa mudança de prioridades.
Afirma
que o governo não contratado novas moradias para a faixa 1 do ''Minha Casa,
Minha Vida'', voltada a quem possui renda até R$ 1800,00 mensais. Essa
categoria conta com um patamar elevado de subsídios e critérios mais simples
para adesão – devido ao alto grau de informalidade entre os mais pobres, muitos
não conseguem comprovar renda, nem dar garantias para ter um crédito bancário
convencional.
Famílias
que ganham até três salários mínimos representam mais de 70% do déficit
habitacional, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
Ou
seja, a política habitacional tem sido substituída pelo crédito imobiliário,
com o Estado abandonando a opção de gastar dinheiro com programas de moradia
aos mais pobres para concentrar esforços em ser um grande banco para a classe
média e um grande amigo das empreiteiras. Lembrando que o Estado não tem que
dar lucro, mas garantir dignidade.
Por
que um acampamento do MTST na avenida Paulista, exigindo recursos para
programas de moradia aos mais pobres, é uma violência à cidade e um acampamento
na mesma avenida, exigindo o impeachment de uma presidente é uma manifestação
da democracia?
A
resposta talvez passe pelo fato de terem conseguido treinar tão bem parte da
classe trabalhadora para ser cão de guarda de quem a oprime que, quando se
discute a necessidade de radicalizar os programas de moradia popular, alguém
grita no fundo de sua ignorância a expressão que demonstra que a incapacidade
de sentir empatia: ''Tá com dó? Leva pra casa''.
Tratam
de forma individual e pessoal algo que deveria ser encarado como função do
poder público. Afinal de contas, para além de créditos, subsídios e
financiamentos, o déficit qualitativo e quantitativo de habitação poderia ser
drasticamente reduzido se imóveis e terrenos vazios em nome da especulação
imobiliária, muitos acumulando gigantescas dívidas em impostos, pudessem ser
desapropriados e destinados a quem precisa – gratuitamente ou a juros abaixo do
mercado, dependendo do nível de pobreza em questão.
Poderia.
Mas não será. Porque a política habitacional no Brasil não é feita para
resolver esses déficits, mas para alguém ganhar dinheiro e alguém manter poder.
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