Do
Brasil 247
Um comentário do jornalista Alexandre Garcia, ex-porta-voz da ditadura militar, num noticiário local da Globo em Brasília provoca imensa revolta entre alunos e professores da rede pública, bem como na comunidade acadêmica.
Garcia
afirmou que os alunos cotistas da Universidade de Brasília entrariam pelas
costas na universidade pública, sem ter, na sua avaliação, mérito para estudar
nas instituições federais de ensino superior. Estariam lá por
"pistolão", segundo disse o jornalista.
No
entanto, diversos estudos do Ministério da Educação já comprovam que os alunos
cotistas vêm tendo desempenho acadêmico superior ao de não-cotistas.
"Temos que pensar na qualidade do ensino.
Aqui no Brasil ele é todo assim por pistolão, empurrãozinho, ajuda. A tradução
disso é cota. Aí põe lá um monte de gente... só 67%, você viu aí, passaram por
mérito. Estão aprendendo como é a vida, a concorrência, sem nenhuma humilhação
de receber empurrãozinho. O mérito é a base", disse o jornalista.
No
passado, Garcia já havia causado polêmica, ao dizer que o Brasil não era
racista até inventarem a Lei de Cotas. Ele seguia o raciocínio de Ali Kamel,
diretor de jornalismo da Globo, que escreveu o livro "Não somos racistas", para tentar evitar que o Brasil adotasse
políticas de ação afirmativa, que existem nos Estados Unidos há mais de 50
anos.
Pela
tese de Garcia, atrizes da própria Globo, como Thais Araújo e Sheron Menezzes,
só sofreram ataques racistas recentemente porque "inventaram" a Lei
de Cotas.
O
comentário de Garcia provocou indignação e revolta na professora Flávia Helen,
que atua na rede pública do Distrito Federal e prepara alunos para o
vestibular.
Leia, ainda, o artigo do estudante João Marcelo, que estuda na UnB:
A abominação ética em Alexandre
Garcia
João Marcelo
Os
comentários de Alexandre Garcia nos telejornais da TV Globo são sempre um
festival de impropérios, invariavelmente de cunho elitista. Porém, sua
declaração recente em que acusa os alunos ingressos à UnB pelo sistema de cotas
de "não possuírem méritos para
ingressar na Universidade" revela em sua personalidade um pendor de
senhor de escravo, um calejamento próprio de uma classe dominante infecunda e
profundamente perversa.
A
Lei de Cotas nas universidades completou três anos no ano passado. Fruto da
mobilização dos movimentos sociais, logrou colaborar no ingresso de mais de 111
mil alunos negros. Ao contrário do propalado pelos intelectuais da Casa Grande,
sua efetivação não precarizou o ensino superior público: segundo dados
científicos apurados na avaliação dos 10 anos da implementação do sistema de
cotas na UnB, o rendimento dos estudantes cotistas é igual ou superior ao
registrado pelos alunos do sistema universal. Outras análises, em dezenas de instituições
como Uerj e UFG, coadunam com o diagnóstico.
Os
argumentos contrários ao sistema de cotas carregam o signo de uma ideologia que
fez com que o País vivesse o colonialismo, a escravidão e a própria ditadura.
Está no DNA da classe dominante brasileira buscar impedir à emancipação dos
oprimidos, por esses constituírem ameaça ao seu domínio. Para esse fim, ocultam
os saqueios e opressões que os povos colonizados foram e são submetidos, ao
mesmo tempo em que procuram domesticar o imaginário dos oprimidos a partir de
mentiras repetidas à exaustão nos meios de comunicação em massa.
Darcy
Ribeiro, fundador da UnB e um dos maiores antrópologos brasileiros, teve
ocasião de asseverar que o maior problema do Brasil é sua elite. Segundo ele,
as elites brasileiras se apropriam unicamente do poder para usurpar à riqueza
nacional, condenando seu povo ao atraso e a penúria (ver O livro dos CIEPS,
1986:98). Por isso, carregamos a inglória posição de terceiro país mais
desigual do mundo.
Alexandre
Garcia é um conhecido bajulador das hostes oficias. Foi aliado de Ernesto
Geisel e porta-voz do ditador João Batista Figueiredo. Foi exonerado após
postar seminu numa revista masculina. Apoiou a candidatura de Maluf no Colégio
Eleitoral. Foi um dos artífices da cobertura global que favoreceu a ascensão de
Fernando Collor de Mello e Fernando Henrique Cardoso. É, pois, co-participe da
tragédia social, política, econômica e ideológica da sociedade brasileira.
A
TV Globo, que abriga essa triste figura, é a principal aliada de todas as
causas abomináveis patrocinadas pela elite contra o povo brasileiro. Sustentou
o golpe de 1964, franqueou amplo apoio ao regime militar, deu sustentação aos
governos conservadores após a redemocratização. Seu jornalismo sempre perseguiu
os movimentos sociais e lideranças populares, cuja expressão mais retumbante
foi o herói da pátria Leonel de Moura Brizola.
Quando
insulta os alunos da rede pública egressos pelo sistema de cotas, o jornalista
vê nisso paternalismo e esmola. É compressível. Quem ascendeu na carreira com
favores e migalhas dos plutocratas só pode enxergar nos outros os vícios que
carrega. Felizmente, o povo brasileiro não permitirá que a direita apátrida
coloque suas mãos sujas de sangue em seus direitos mais caros, para a tristeza
do jornalista e seus correligionários.
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