Interesses econômicos ameaçam defensores dos direitos humanos




TRIBOS INDÍGENAS PARTICIPAM DE DISCUSSÃO SOBRE
INSTALAÇÃO DE USINA EM BELO MONTE. FOTO: ELZA FIÚZA/ABr

A expansão de interesses econômicos nas Américas tem gerado conflitos com a população local e aumentado as ameaças a defensores de direitos humanos da região, segundo a Anistia Internacional. Essa relação é apresentada no estudo Transformando Dor em Esperança, divulgado ontem, 7, que analisa 300 casos de violência contra defensores (entre eles cinco brasileiros) em 13 países, como Argentina, Brasil, Colômbia, Estados Unidos e México. Do total, apenas cinco episódios tiveram punição da Justiça.

O relatório destaca o importante papel dos defensores para os avanços sociais nas Américas nos últimos anos e os riscos enfrentados por eles. Segundo a ONG, que analisou casos entre 2010 e 2012, as denúncias de ataques contra estes indivíduos aumentaram. Foram registrados o uso de sequestros, ameaças, assassinatos e desaparecimentos forçados como métodos de intimidação.  Além disso, muitas de suas ações têm sido criminalizadas.

O grupo de defensores mais ameaçado, de acordo com o levantamento, é o que trabalha com temas relacionados à terra e recursos naturais, geralmente em áreas afetadas por conflitos armados internos, disputas por territoriais ou megaprojetos. Algo reforçado pela desigualdade entre ricos e pobres nas Américas. “As disparidades na distribuição de terras e de recursos econômicos refletem essa divisão profundamente arraigada. Aqueles que amplificam as demandas por justiça e pelo fim da discriminação, geralmente provenientes dos setores mais marginalizados da sociedade, costumam ser perseguidos e atacados”, destaca o relatório.

E, muitas vezes, a solução destes conflitos acaba sendo a violência. “É impressionante que quase todos os casos documentados pelo relatório estejam relacionados ao quanto os processos de desenvolvimento seguem atravessados pela violência. É chocante que tenhamos chegado a uma situação em que a violência é um instrumento de abertura de território para o desenvolvimento”, afirma Átila Roque, presidente da Anistia Internacional no Brasil, a CartaCapital.

Há também a ausência do Estado nas regiões em que ficam localizadas as terras ricas em recursos naturais ou posicionadas em áreas geograficamente estratégicas. Nestes locais, geralmente, as populações indígenas, comunidades de pequenos agricultores ou de afrodescendentes acabam pressionadas pelos interesses econômicos. “Frequentemente, esse vácuo do Estado é preenchido por redes do crime organizado, por paramilitares ou por indivíduos ou grupos privados econômica e politicamente poderosos”, aponta a ONG.

Entre os interesses econômicos, o relatório destaca a expansão de megaprojetos na América Latina, como os da indústria extravista de grande escala, monoculturas, rodovias, empreendimentos turísticos, usinas hidrelétricas e parques eólicos. O problema, no entanto, seria a falta de comunicação entre governo, comunidades afetadas e empreendedor. “Muitos casos de abusos e de ataques contra defensoras e defensores dos direitos humanos aconteceram em situações em que não houve uma consulta livre, prévia e informada sobre os projetos, em que houve tentativa de provocar divisões sociais, em que houve violência contra as comunidades afetadas e, muitas vezes, quando havia sérias preocupações sobre os efeitos desses projetos sobre a saúde e o meio ambiente.”

Entre os grupos de maior risco também estão os que trabalham os direitos das mulheres, da população LGBTI (lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros e intersexuais), dos migrantes, os que buscam acabar com a impunidade para violações dos direitos humanos, e jornalistas, blogueiros e os sindicalistas . Mas como é provável que eles atuem em mais de uma área, os riscos aumentam.

Responsabilidade do Estado

Segundo o relatório, os Estados têm a responsabilidade de criar as condições necessárias para garantir que todo individuo possa atuar na defesa dos direitos humanos. E o primeiro passo para isso é reconhecer os defensores e suas demandas como legítimas. Ao fazer isso, torna-se possível colocar em prática mecanismos de proteção, além de colaborar para que as ações destes indivíduos sejam levadas a sério pelas autoridades, defende Roque. “É uma falha da estrutura do Estado não garantir proteção. Não é aceitável que essas pessoas estejam repetidamente submetidas a ameaças e violência. Os sistemas de proteção não podem se resumir a apenas uma situação de emergência.”

O relatório cita nominalmente 57 casos de defensores que foram mortos ou vivem sob ameaças. Entre os brasileiros estão a juíza Patrícia Acioli, assassinada por policiais militares investigados por crimes de execução, e Laísa Santos Sampaio, irmã de um dos ativistas mortos em Nova Ipixuna (Pará), em 2011.  “A principal reivindicação do relatório é que não é possível um grau tamanho de impunidade. Isso sinaliza uma autorização para a violência. É preciso autonomia nas investigações nos casos em que a violência ocorra e toda a cadeia de interesses envolvidos no crime”, conclui Roque.




Créditos: Carta Capital

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